"Eu nasci assim, eu cresci assim e sou mesmo assim. Vou ser sempre assim: Gabriela, sempre Gabriela". Era desta forma que arrancavam os episódios de “Gabriela, Cravo e Canela”, a primeira telenovela brasileira a ser emitida em Portugal. A estreia da produção baseada no romance de Jorge Amado aconteceu a 16 de maio de 1977, na RTP1.
Gabriela, uma rapariga que fugiu para os Ilhéus para fugir da vida calma do nordeste, apaixonou-se por um estrangeiro que não aceitava da melhor forma o seu comportamento. Esta era a base da história que se tornou um êxito num Portugal que ainda se estava a adaptar aos tempos de liberdade e que começou a parar à hora de jantar para seguir o enredo.
O sucesso refletiu-se em novas formas de comportamento e de relacionamento social por mostrar aquilo que normalmente não era visto em televisão e acabou por ditar modas, desde os penteados à escolha dos nomes e da linguagem usada.
"Na época da primeira versão eu era menino e lembro que todo mundo comentava a cena do telhado [quando Gabriela sobe a um telhado de vestido]. Se por um lado há o exagero no apelo, com pernas e rabos, por outro aspeto, temos um menino como eu, que ao ouvir os comentários, interessou-se em ler o livro", recordou, em 2012, à Lusa o professor da Universidade Estadual da Baía, especialista em Jorge Amado, Gildeci Leite.
A cena em questão - que causou rebuliço no mundo masculino há 40 anos - mostra, de um ângulo generoso, o momento em que Gabriela sobe ao telhado e deixa entrever, por descuido, muito mais do que a sociedade brasileira da época - governada por uma ditadura militar - estava acostumada a ver em horário nobre na televisão.
Um sucesso de audiências
O impacto da novela em Portugal foi semelhante ao do Brasil: Por diversas vezes, a Assembleia Nacional adiou ou suspendeu sessões para que os deputados pudessem assistir a “Gabriela, Cravo e Canela”. Em 1977, o romance de Jorge Amado foi também a obra mais vendida na Feira do Livro de Lisboa, recorda a RTP1.
A primeira novela da Globo a chegar à TV portuguesa esteve no ar seis meses e chegou a um pico de quatro milhões de espectadores, apesar da escassez de televisores - havia uma média de 150 por cada mil habitates, o que ajudou vários estabelecimentos e associações populares.
Frases como "moço bonito", "sapato não, seu Nacib", "já lhe dei meu cartão?" ou "cuidar das viúvas e das órfãs" entraram de rompante nas conversas dos portugueses. Em algumas regiões, os mais poderosos começaram ainda a ser conhecido por "os coronéis", tal como na novela.
A novela apresentou ainda aos portugueses uma estrela: Sônia Braga. A atriz vestia a pele da protagonista, a Gabriela, e tornou-se um sex symbol. Em breve, a brasileira vai dar corpo a Irmã Lúcia num sobre Fátima, produzido pela norte-americana Natasha Howes.
Em 2012, chegou a Portugal o remake da história, assinado por Walcyr Carrasco e protagonizado por Juliana Paes, em vez de Sônia Braga, e Humberto Martins, na pele de Armando Bógus. A trama desenrola-se em 1925, no nordeste brasileiro, mais precisamente em Ilhéus, uma terra dominada pelos poderosos fazendeiros de cacau.
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