"O Ministério Público da área cível da comarca de Lisboa Oeste, em representação de crianças e jovens participantes no mesmo, interpôs uma ação especial de tutela da personalidade", refere a nota.

Nessa ação, explica a PGR, é pedido ao Tribunal que decrete, a título provisório e de imediato "que o programa a emitir no próximo domingo não seja exibido ou, caso o tribunal julgue mais adequado, que essa exibição fique condicionada à utilização de filtros de imagem e voz que evite a identificação das crianças".

Ainda de acordo com a nota, na ação é pedido que o tribunal decrete também que seja “retirado ou bloqueado o acesso a qualquer conteúdo dos programas já exibidos”.

“Trata-se de uma decisão provisória e urgente. Sendo que o Ministério Público pede que, no final do processo, a mesma seja convertida em definitiva e que todos os eventuais futuros programas apenas possam ser exibidos nos moldes que o tribunal venha a determinar”, explica a PGR na mesma nota.

Em comunicado é ainda explicado que esta ação não é uma providência cautelar, mas sim uma ação especial de tutela da personalidade, prevista nos artigos 878.º e seguintes do Código de Processo Civil, a qual se reveste de natureza urgente.

A PGR adianta que foram instaurados processos de promoção e proteção a favor das crianças participantes no programa, cuja identidade já se conhece.

No que respeita ao primeiro programa emitido, o Ministério Público, na sequência de certidão enviada pela Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Loures, instaurou um inquérito para investigar factos suscetíveis de integrarem o crime de desobediência.

Este inquérito corre termos no DIAP da comarca de Lisboa Oeste.

Na terça-feira, a presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, Rosário Farmhouse, disse, em declarações à Lusa, que todas as famílias que participam no programa ‘Supernanny’ serão convocadas pelas comissões de proteção de crianças da sua área.

O objetivo, explicou, é avaliar as situações em causa e sensibilizar para a exposição pública a que estão a sujeitar os seus filhos.

Os pais, adiantou, são obrigados a reunir com a comissão após receção de convocatória, mas qualquer iniciativa por parte da comissão para avaliação do caso ou eventual aplicação de uma medida de proteção só é possível com o consentimento dos pais das crianças.

Se os pais não concordarem o caso será imediatamente remetido para o Ministério Público.

Presente num total de 15 países, o programa retrata casos de crianças indisciplinadas, para as quais uma ama - no formato português é a psicóloga Teresa Paula Marques - propõe soluções para pais e educadores.

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No programa "Supernanny", uma psicóloga clínica desloca-se a casa de uma família para ajudar os pais a controlar a rebeldia dos filhos. "À sua espera terá pais à beira de um ataque de nervos, que já tentaram quase tudo para controlar a alteração de comportamento dos filhos - esse será o seu maior desafio: dar-lhes ferramentas a para que estes possam recuperar a calma e a alegria familiar! 'Supernanny' é um formato onde a emoção e a surpresa não vão faltar e nada ficará por dizer, tudo com um único propósito: orientar pais, educadores e filhos para um objetivo comum, a harmonia da vida em família e … missão cumprida", acrescenta a produção do programa em comunicado.

Este programa ficou envolto em polémica logo após a transmissão do primeiro episódio.

O Instituto de Apoio à Criança (IAC) e a UNICEF Portugal também se manifestaram contra o programa e a Ordem dos Psicólogos Portugueses informou que já tinha dado um parecer negativo sobre o programa em março de 2016.

O Ministério Público tinha anunciado na terça-feira que abriu um inquérito para investigar factos suscetíveis de integrarem o crime de desobediência, relativos ao programa ‘Supernanny’ emitido a 14 de janeiro.

“No que respeita ao primeiro programa emitido, o Ministério Público, na sequência de certidão enviada pela CPCJ (Comissão de Proteção de Crianças e Jovens) de Loures, instaurou um inquérito para investigar factos suscetíveis de integrarem o crime de desobediência”, referiu na altura a PGR.

Caso da segunda família do "SuperNanny" foi remetido para o Ministério Público

A situação das duas crianças que apareceram no segundo programa ‘SuperNanny’ foi remetida para o Ministério Público, depois de os pais recusarem acompanhamento da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Sintra, disse à Lusa fonte oficial.

Em resposta à agência Lusa, a presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens explicou hoje que os pais das crianças do segundo programa foram chamados à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Sintra (CPCJ), mas, como não deram consentimento para atuação, o processo seguiu para o Ministério Público

A criança que aparece no primeiro episódio do programa tem já uma medida de proteção acionada com o consentimento dos pais.

As medidas de promoção e proteção estão previstas na Lei de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens em Perigo e são de aplicação exclusiva pela Comissão de Proteção ou pelo Tribunal.

Estas repartem-se em dois tipos: as medidas em meio natural de vida - apoio junto dos pais, apoio junto de outro familiar, confiança a pessoa idónea, apoio para autonomia de vida, e, as medidas de colocação - acolhimento familiar e acolhimento em instituição.

Na sequência da exibição do primeiro episódio do programa “Supernanny”, a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Loures enviou a 17 de janeiro um oficio à estação de televisão SIC, a solicitar que em 48 horas bloqueasse o acesso a qualquer conteúdo do referido programa, bem como quaisquer outras retransmissões do mesmo.

Caso não fosse cumprida a exigência, a comissão referia que os factos seriam participados ao Ministério Público para averiguação da eventual prática do crime de desobediência.

A divulgação de imagens de crianças em perigo pode implicar uma pena de prisão até um ano ou 120 dias de multa, segundo a Lei de Proteção de Crianças invocada no caso do programa “Supernanny” de 14 de janeiro.

Debate polémico na SIC

Num programa conduzido esta semana por Conceição Lino, Júlia Pinheiro, diretora de programas da SIC, sublinhou que o formato abriu um "um debate que nunca foi feito" em Portugal. "Há aqui uma intenção puramente social e pedagógica", sublinhou a apresentadora durante o debate, explicando que os pais das crianças "foram devidamente alertados" e que "visionaram os programas internacionais".

"Estávamos preparados para uma reação. Acho que ela foi muito amplificada por aquilo que é consensualmente dito como o politicamente correto.  Aquilo que nos desafia, aquilo que nos mostra uma realidade que não queremos ver mas que sabemos que está lá... abalamos. E reagimos com medo. Acho que neste momento, esse medo já passou, acho que as pessoas já perceberam o que está aqui, que há aqui uma intenção puramente social e pedagógica", defendeu a diretora de programas da SIC.

"O que estamos a mostrar é um documentário e os documentários têm às vezes a crueza da verdade. E a verdade é muito difícil de encarar e dói (...) Nós estamos convictos que este programa é benéfico", acrescentou a apresentadora, defendendo ainda que a SIC está "tranquila".

Júlia Pinheiro frisou ainda que os episódios são preparados com "uma edição muito cuidadosa". "É impossível encenar aquilo que nós vimos e, quero deixar aqui bem claro, que este programa sobre uma edição muito cuidadosa das imagens. Portanto, nem por sombras foram mostradas as imagens que podiam ser consideradas mais difíceis de assistir", explicou.

A presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Protecção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), Rosário Farmhouse, Dulce Rocha, do Instituto de Apoio à Criança e , a psicóloga Cristina Valente também marcaram presença no debate.

Rosário Farmhouse, da CNPDPCJ, confirmou no debate que recebeu várias queixas, nomeadamente de familiares próximos das crianças que protagonizam o programa da SIC. "Recebemos 21 queixas na comissão logo no dia a seguir e veio também uma queixa dos familiares que achávamos que seriam do segundo programa", revelou.

Já Dulce Rocha defendeu que são expostas no programa as "partes mais negativas, que são comuns a todas as crianças". "Há direitos que são indisponíveis pelos pais. Há direitos que são dados aos pais pela lei mas sempre com um fim: defender a criança, proteger a criança (...) O problema é se esta exposição não afeta a dignidade da criança", frisou.

O primeiro programa "Supernanny" na SIC foi emitido a 14 de janeiro. No dia seguinte, a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens tomou uma posição contra o programa por considerar que existe um "elevado risco" de este "violar os direitos das crianças, designadamente o direito à sua imagem, à reserva da sua vida privada e à sua intimidade".

Para a comissão, o conteúdo do programa é "manifestamente contrário ao superior interesse da criança, podendo produzir efeitos nefastos na sua personalidade, imediatos e a prazo".