"Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos" ganhou esta sexta-feira, o Prémio Especial do Júri, o segundo mais importante da mostra "Un Certain Regard" do Festival de Cannes.

Trata-se da secção mais importante da seleção oficial do festival a seguir à da competição pela Palma de Ouro, destinando-se a reconhecer jovens talentos e a encorajar trabalhos inovadores e audazes.

João Salaviza já tinha vencido a Palma de Ouro em 2009 com a curta-metragem "Arena".

O documentário luso-brasileiro co-realizado por João Salaviza e Renée Nader Messora aborda a comunidade indígena Krahô no estado de Tocantins, no norte Brasil, cujo dia-a-dia eles acompanharam ao longo de nove meses.

Entre os críticos era considerado o favorito para o prémio principal, mas o júri presidido por Benicio del Toro escolheu o sueco "Border", do iraniano Ali Abbasi, enquanto o melhor argumento foi para “Sofia”, da franco-marroquina Meryem Benm’Barek.

A melhor interpretação foi atribuída a Victor Polster, por “Girl”, de Lukas Dhont, e o melhor realizador foi Sergei Loznitsa, por “Donbass”.

"É um filme feito por duas pessoas no meio do mato, sem qualquer coprodução francesa, com 80 mil euros de apoio do ICA [Instituto do Cinema e do Audiovisual], e estar a ombrear com outros filmes da competição é fantástico", disse à Lusa quando o seu filme foi escolhido para Cannes a 19 de abril.

Descrito pelo Hollywood Reporter como “um dos menos ortodoxos títulos” a apresentar-se na secção Un Certain Regard, trata-se de uma “mistura ligeiramente dramatizada de facto, ficção e estudo de campo antropológico”.

O filme foi rodado durante nove meses, em 16mm, sem equipa, na aldeia Pedra Branca, no estado de Tocantins, no Brasil.

“Não há espíritos ou cobras esta noite e a floresta em redor da aldeia está sossegada. Ihjãc, de 15 anos, tem pesadelos desde que perdeu o pai. É um Krahô indígena do norte do Brasil. Ihjãc caminha pela escuridão, o seu corpo suado move-se com receio. Um cântico distante atravessa as palmeiras. A voz de seu pai chama por ele através da cascata: é hora de organizar o festim funerário para que o espírito possa partir para a aldeia dos mortos. O luto deve cessar”, pode ler-se na sinopse disponibilizada pelo festival.

O texto acrescenta: “Negando o seu dever e para poder escapar o processo crucial de se tornar um xamã, Ihjãc foge para a cidade. Longe do seu povo e da sua cultura, enfrenta a realidade de ser um indígena no Brasil contemporâneo”.

"Chuva é cantoria na aldeia dos mortos" foi produzido por Ricardo Alves Jr. e Thiago Macêdo Correia, da produtora Entre Filmes, sediada em Minas Gerais, em coprodução com a portuguesa Karõ Filmes e com a Material Bruto, de São Paulo.

O filme foi exibido em sessão de gala na quarta-feira à noite, oportunidade que a equipa do filme usou para denunciar na passadeira vermelha de Cannes o "genocídio indígena" e pela "demarcação das terras dos povos autóctones" no Brasil, com cartazes em vários idiomas.

O protesto respondia à mobilização de líderes indígenas, que acusam o governo do presidente Michel Temer de negar-se a demarcar as terras indígenas e favorecer os empresários rurais.

No final da sessão de estreia, a equipa foi aplaudida e houve ainda um momento de cânticos “Fora Temer”.

Numa entrevista à AFP, Renée Nader Messora e João Salaviza criticaram o "perigoso discurso" político atual que "nega" aos índios a sua condição simplesmente porque adotam costumes ocidentais, como usar roupas ou ter um telemóvel.

"Ser indígena é um modo de ser e não de aparentar", declarou Salaviza.

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