Não não se mostrava tão convincente desde "O Artista", filme pelo qual foi coroado Melhor Ator no Festival de Cannes em 2011: o francês Jean Dujardin expande ainda mais a sua palete tragicómica em "Le Daim", de Quentin Dupieux, cujo humor excêntrico cai nele como uma luva.
No filme, apresentado esta quarta-feira na abertura da Quinzena dos Realizadores, Dujardin interpreta Georges. Um que tem peso na sua filmografia, uma vez que, em "O Artista", ele se chamava George Valentin, e esta interpretação valeu-lhe também o Óscar de Melhor Ator.
Desta vez, o personagem interpretado pelo ator de 47 anos resolve do nada deixar a sua cidade, localizada numa montanha, para comprar uma blusão de camurça com franjas por um preço exorbitante. Assim que o faz, vê-se possuído pelo espírito da indumentária, que o leva a cruzar os limites de uma loucura assassina.
"Para este papel, desliguei-me de tudo. Não me questionei se eu era mais forte que a proposta [do filme], se exagerei no lado psiquiátrico. Pelo contrário: quanto mais voltava ao normal, mais as coisas se tornavam anormais", explicou Dujardin à AFP.
Entre um George e outro, passaram-se oito anos e cerca de 15 filmes, mas nenhuma obra ofereceu a Dujardin um papel tão singular.
No filme de Quentin Dupieux, cujo cinema é levemente surrealista e com uma boa dose de absurdo, Dujardin ainda exibe o seu charme, mesmo sem fazer uso do seu sorriso largo e ainda escondido por uma barba grisalha.
Um tipo de doença
Com o novo Georges, Dujardin tem a oportunidade de trabalhar com um registro cómico diferente, distante do humor de "Agente 117", "Brice de Nice" e "Descaradamente Infiéis", através de uma interioridade que provoca o riso fazendo o mínimo possível, ante a estranheza perturbadora e a violência contida da sua personagem.
"Dá para sentir a dualidade da minha personagem porque estamos num filme do Quentin. Tenho a sensação de que essa patologia, esse circuito fechado, essa solidão, trouxe de 'Brice de Nice', por exemplo", comentou.
"Jean conhece bem so seu ofício. Ele procura emoção e tem medo da zona de conforto", afirmou por sua vez o realizador.
Já a atriz Adèle Haenel explicou que o colega a ajudou a ver que a sua personagem secundária, que, em princípio, ela não achava muito profunda, poderia ter importância nos acontecimentos do filme.
"A sua proposta como ator é completa, ele é extremamente sincero, e há algo de infantil na seriedade com que aborda o papel, ao ponto que ainda hoje usa camurça", destaca.
"É um tipo de doença", responde Dujardin, a mais séria do mundo, reproduzindo a frase que ele fala várias vezes no filme.
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