De acordo com declarações à Agência France Press de François Margolin, produtor de
Raúl Ruiz em filmes como
«La Maison Nucingen» e
«Dias de Campo», o cineasta «era uma pessoa vinda de uma outra época, que conhecia tudo sobre tudo, de uma cultura imensa sob todos os pontos de vista, e que vivia ancorado entre dois países, o Chile e a França. Ele adorava a fusão entre as diversas culturas. Ele fez filmes em vários países do mundo. Era sem dúvida um dos grandes espíritos, muito além do cinema, da própria época moderna».
Só em Portugal, país com o qual mantinha uma ligação muito especial, Raúl Ruiz fez nove filmes, produzidos por
Paulo Branco, o último dos quais a sua obra-prima,
«Mistérios de Lisboa», que já foi visto por mais de 100 mil espetadores em França e, após passar por países como Bélgica e Taiwan, acaba de estrear nos EUA, com críticas excecionais em periódicos tão prestigiados como o «New York Times».
De acordo com comunicado enviado pela Clap Filmes, produtora de várias películas do realizador, a cerimonia fúnebre terá lugar na próxima terça-feira, dia 23 de Agosto, às 10h30, na Igreja Saint-Paul (99, Rue Saint-Antoine), em Paris e o seu corpo será sepultado no Chile.
O cineasta estava atualmente a terminar a montagem de um filme sobre a sua infância no Chile e estava a preparar mais um filme para a Clap Filmes, novamente produzido por Paulo Branco, intitulado
«As Linhas de Torres Vedras». Com argumento original de Carlos Saboga (que já adaptara ao cinema «Mistérios de Lisboa», de Camilo Castelo Branco), a película centrar-se-ia no período das invasões francesas em Portugal no século XIX, com as histórias de um conjunto diverso de personagens a convergirem até à batalha final nas linhas fortificadas de Torres Vedras
Apesar do falecimento do realizador, Branco garantiu ao SAPO que o projeto iria continuar, pela mão de um cineasta escolhido pelo próprio Ruiz.
Raúl Ruiz nasceu em Puerto Montt, no Chile, a 25 de Julho de 1941, e filmou a sua primeira curta-metragem aos 22 anos,
«La Maleta». A sua estreia na longas-metragem deu-se com
«Três Tristes Tigres», em 1968, que lhe valeu logo o Leopardo de Ouro no Festival de Locarno.
A partir daí teve um percurso extraordinariamente prolífico, com cerca de uma centena de filmes em 30 anos de carreira, assentando base em França a partir de 1973, para onde se deslocou após a subida ao poder de Augusto Pinochet no seu país natal. Em 1996, o seu nome saltou definitivamente para a ribalta do cinema mundial com
«Três Vidas & Uma Única Morte», já co-produzido por Paulo Branco, com um elenco de estrelas e presença no Festival de Cannes, terminando assim um percurso com trabalhos menos visíveis, alguns deles para a televisão.
Quem tinha dúvidas sobre a dimensão do seu talento, tirou-as logo nos filmes seguintes, também produzidos por Branco:
«Genealogias de Um Crime» (1997) ou o muito ambicioso
«O Tempo Reencontrado» (1999), adaptação do último volume de «Em Busca do Tempo Perdido», de Marcel Proust.
Filmes como
«Combate de Amor em Sonho» (2000),
«As Almas Fortes» (2001) e
«Klimt» (2005), cimentaram o prestígio único de Ruiz, que teve o maior sucesso de público e crítica da sua carreira com a sua derradeira película, «Mistérios de Lisboa», que se revelou a fita portuguesa de maior impacto internacional das últimas duas décadas, conquistando inclusivamente o prestigidíssimo Prémio Louis Delluc, batendo obras como
«O Escritor Fantasma», de
Roman Polanski,
«Dos Homens e dos Deuses», de
Xavier Beauvois, e
«Carlos», de
Olivier Assayas.
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