Morreu Sacheen Littlefeather, a atriz e ativista que foi vaiada por recusar um Óscar em nome de Marlon Brando, em protesto contra o tratamento de Hollywood aos nativos americanos.
A notícia do falecimento aos 75 anos foi dada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, que a homenageara há apenas duas semanas. Em março de 2018, ela anunciara que tinha sido diagnosticada com cancro de mama.
A organização recordou uma frase sua: "Quando partir, lembrem-se sempre que cada vez que defende a sua verdade, manterá a minha voz e as vozes das nossas nações e povos".
Littlefeather, que era apache e yaqui, foi vaiada na cerimónia da Academia em 1973, na primeira transmissão ao vivo para todo o mundo, quando explicou que Brando, a quem ela representava, recusava o Óscar de Melhor Ator por "O Padrinho" devido ao "tratamento reservado aos nativos americanos pela indústria cinematográfica".
Brando havia pedido a Sacheen que recusasse o prémio em seu nome, num ato de repúdio à atitude da indústria em relação aos povos nativos. O ator disse-lhe para não tocar no prémio e deu-lhe oito páginas dactilografadas para ler, mas o produtor da cerimónia informou-a que só tinha 60 segundos. Três dias mais tarde, o jornal
The New York Times publicou o discurso na íntegra.
Mais tarde, contou que seguranças tinham impedido que o ator veterano John Wayne a agredisse fisicamente e a expulsasse do palco, mas uma investigação recente disputa esta versão que tem sido contada de várias formas há quase 50 anos.
Mas o momento na cerimónia foi recebido com aplausos e vaias do público e os apresentadores Raquel Welch e Clint Eastwood fizeram piadas a troçar do que tinha acontecido.
Já Sacheen Littlefeather foi condenada ao ostracismo por profissionais do cinema e mesmo como membro do Screen Actors' Guild, o sindicato dos profissionais de cinema, teve dificuldade para encontrar trabalho em Hollywood, já que os diretores de elenco foram pressionados a deixá-la de fora das produções.
Em agosto deste ano, a Academia enviou uma carta assinada pelo presidente David Rubin a pedir desculpa, dizendo que "os maus-tratos que sofreu por causa dessa declaração foram gratuitos e injustificados. A carga emocional que viveu e o custo para a sua própria carreira na nossa indústria são irreparáveis".
"Durante demasiado tempo, a coragem que mostrou não foi reconhecida. Por isso, oferecemos as nossas mais profundas desculpas e sincera admiração", acrescentava o texto.
"Em relação ao pedido de desculpas da Academia, nós, índios, somos pessoas muito pacientes, passaram-se apenas 50 anos!", reagiu Sacheen Littlefeather em comunicado na altura.
"Precisamos manter sempre o nosso sentido de humor em relação a isso. É o nosso método de sobrevivência", declarou, considerando o próximo evento "um sonho que se tornou realidade".
"É profundamente encorajador ver quanta coisa mudou desde que não aceitei o Óscar, 50 anos atrás", destacou a ativista indígena.
A 17 de setembro, Littlefeather foi homenageada pela Academia durante uma comovente cerimónia em Los Angeles, repleta de danças e canções nativas americanas, recordando que subiu ao palco em 1973 "como uma mulher indígena orgulhosa, com dignidade, com coragem, com elegância e com humildade".
"Sabia que tinha que dizer a verdade. Algumas pessoas podiam aceitar. E outras não", acrescentou.
Marie Louise Cruz na Califórnia, filha de pai apache e yaqui e de mãe descente de europeus. O seu ativismo relacionado com a comunidade nativa dos EUA começou durante a ocupação de 19 meses da ilha de Alcatraz em 1969, altura em que adotou o nome de Sacheen Littlefeather.
Enquanto tentava tornar-se atriz, conseguiu trabalhos em anúncios publicitários para a rádio e televisão, o que lhe deu acesso ao Screen Actors Guild. Mais tarde, foi trabalhar numa rádio em São Francisco e como jornalista freelancer num canal de TV.
Após a aparição nos Óscares e as reações negativas, tornou-se porta-voz da National American Indian Council e participou em protestos contra os cortes ao financiamento de programas de nativos promovidos pelo presidente Richard Nixon, continuando ativista o resto da vida.
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