A caminho dos
Óscares 2021
Colectiv - Um Caso de Corrupção
A HISTÓRIA: O realizador Alexander Nanau acompanha uma dedicada equipa de investigadores do jornal romeno "Gazeta Sporturilor" enquanto tentam desvendar um vasto esquema de fraude no sistema de saúde que enriqueceu alguns políticos e magnatas e levou à morte de cidadãos inocentes.
Nos cinemas a partir de 24 de junho.
Crítica: Hugo Gomes
Antes de entrar no universo corrupto que é desvendado e sublinhado neste “Colectiv - Um Caso de Corrupção”, um documentário de investigação de Alexander Nanau, devemos destacar que se trata de uma ode ao jornalismo, que como bem sabemos, tem vindo a ser descredibilizado e fragilizado nesta época "pós-verdade".
O que vamos aqui encontrar é a afirmação do estatuto de “Quarto Poder”, aquele que supervisiona os poderes acima, mesmo que, dentro do contexto do filme, surja nessa posição um modesto jornal desportivo que começou a descortinar, em modo "spotlight" (o termo jornalístico dado à grande investigação), uma entranhada rede de corrupção.
Tudo começa com um incêndio em 2015 no bar noturno Colectiv, em Bucareste, que vitimou 27 pessoas e levou centenas para os cuidados intensivos com queimaduras graves. Mas a tragédia não ficou por aqui: seguiu-se uma misteriosa vaga de mortes que um jornalista dedicado e em jeito "ativista" começou a investigar, descobrindo e denunciando a indignidade da fraude e negligência hospitalares que têm vindo a subjugar a Roménia.
Quem conheça alguns filmes do recente cinema daquele país sabe como é quase intrínseca a relação com o tema da corrupção, seja em retratos corrosivos da sua sociedade ou na forma natural com que os cidadãos encaram o seu dia-a-dia. Por exemplo, Cristian Mungiu, um dos cabecilhas da nova vaga romena, abordava em “O Exame” (2016) a história de um pai que fazia tudo para que a sua filha fizesse um importante exame escolar que tinha falhado por causa de um incidente.
Por sua vez, “Colectiv” é uma peça de declarado jornalismo puro e duro que não se foca em teses sobre onde e quando surge o ato de corrupção. É natural que se encare este trabalho de Alexander Nanau como um “autêntico filme de terror” que deixará os espectadores inquietos e entristecidos. O tom é pessimista e trágico e o facto de ter sido um jornal desportivo a liderar a investigação mostra que o “Quarto Poder” na Roménia está descredibilizado e limita-se a lançar “socos no ar”. E “quando a imprensa se verga às autoridades, as autoridades maltratam os cidadãos.” E também é isso que é desvendado nesta investigação.
Só que mesma descredibilização se encontra, como seria de esperar, na classe política, que é “suja” ou impotente em relação aos interesses instalados: o documentário também revela o círculo vicioso da luta de um provisório tecnocrata no Ministério da Saúde, esmagado pela indiferença geral dos romenos em relação a às eleições que contribuíram para manter no poder quem permitiu a fraude e a negligência hospitalares que causaram tantas mortes.
Lado a lado com estes combates, cada um à sua maneira, está uma tentativa de aproximação ao registo documental e objetivo para com o fator humano e sentimental suscitado pelas histórias de sobrevivência e mazelas, assim como o luto de quem perdeu o seu ente querido por causa de uma “inexplicável falha de comunicação”, dignificados num réquiem inconformado ao som de “Nothing More” dos The Alternate Route. “Colectiv Colectiv - Um Caso de Corrupção” reuniu mais de 400 horas de imagem para, no final, nos deixar em silêncio com um quadro implacável em que todos os ingredientes estavam preparados para um eventual caos. Que aconteceu na Roménia, mas que temos de reconhecer que poderia ter lugar em qualquer lado.
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