![Delta Tejo, dia 1: Mãos ao ar no Alto da Ajuda](/assets/img/blank.png)
"Não vim aqui pelo tempo. Não vim aqui pelo futebol. Vim aqui pelas mulheres", confessou Shaggy quando o seu concerto, o último do Palco Delta, ainda estava longe de terminar e já tinha decididamente conquistado grande parte do público.
Elas acharam graça, eles também, e com a ajuda deste e de outros comentários espirituosos quase todos responderam prontamente aos desafios do cantor jamaicano. Afável e acompanhado por uma banda disposta a entrar no jogo, Shaggy distribuiu o seu dancehall radiofriendly e polidinho (mesmo quando se armava em agressivo) através de singles que, gostem ou não, todos conhecem. "In the Summertime", "Oh Carolina" ou "Angel" foram alguns dos mais celebrados. Ou ainda "Fly High", com milhares de braços a imitar os movimentos de asas, ou "Bam Bam", que fechou o encore e, como diria a também festiva Ivete Sangalo, "levantou poeira".
A condimentar ou intercalar as suas canções surgiram excertos de temas de terceiros. "I Gotta Feeling", dos Black Eyes Peas, "Empire State of Mind", de Alicia Keys, ou "Seven Nation Army", dos White Stripes, contribuiram para o alargar da euforia. Uma actuação bombástica, então? Nem tanto, musicalmente foi até bastante inofensiva. Mas lá que "Mr. Boombastic" cumpriu a sua função, disso não há grandes dúvidas.
Também com uma atenção especial pelo público feminino - a ponto de terem convidado cerca de uma dezena de espectadoras para dançar em palco -, os Buraka Som Sistema não ficaram nada atrás no seu papel de agitadores de multidões.
Já não é novidade, desde há muito, que o colectivo lisboeta é um dos mais eficazes abana-ancas nacionais, e ontem voltou a confirmar os seus créditos - mesmo que o alinhamento não tenha ido muito além do que se conhece do seu EP e álbum.
Um dos escassos temas novos, apresentado logo ao início, revisitou um single clássico de Neneh Cherry. A versão de "Buffalo Stance", feita a pedido da Dr. Martens para celebrar os seus 50 anos, fica aquém da frescura que o original ainda mantém mas não deixa de funcionar numa pista ou a partir de um palco (e se servir para alguns espectadores descobrirem um álbum como "Raw Like Sushi", que em finais dos anos 80 abanou o hip-hop e abriu portas ao trip-hop, tanto melhor).
Nos seus melhores momentos, as canções dos Buraka Som Sistema conseguem fazer a ponte entre elementos primitivos e futuristas com uma energia e criatividade atípicas. Já nas piores não chegam a sair dos primeiros e pecam pela redundância rítmica. O concerto de ontem oscilou entre estes extremos, mas em contrapartida a atitude efusiva da banda (e do público) manteve-se do princípio ao fim.
"Aqui Para Vocês", onde o grupo convidou os espectadores a mostrar "o gesto português", foi um dos primeiros momentos de adrenalina em alta, ainda que "Kalemba (Wegue Wegue)", com Pongo Love, tenha feito subir ainda mais a temperatura (embora se dispensasse a sua repetição no encore).
Já "Restless", o novo single, favoreceu mais o electro do que explosões tribais e abriu o apetite para as próximas edições dos Buraka. E tal como no concerto de Shaggy, o alinhamento aceitou contaminações de excertos de canções de outras bandas - Daft Punk ou Chemical Brothers, por exemplo, dois nomes habitualmente citados nos concertos do grupo.
"Isto vai ser a loucura", gritou Kalaf a meio do concerto - o último dos próximos tempos em palcos nacionais. E no final, depois de uma ávida movimentação de ancas e braços, muitos terão certamente concordado (sobretudo os que nunca tinham visto o quarteto ao vivo).
Neste primeiro dia do festival, os brasileiros Natiruts e Carlinhos Brown actuaram também no Palco Delta. Pelo Palco Jogos Santa Casa/Beck'Stage passou a Ronda do Choro de Lisboa, Emmy Curl e Nação Zumbi, ao fim da tarde, e coube aos Expensive Soul e Nu Soul Family fechar a noite, já a caminho da madrugada.
Texto @Gonçalo Sá
Fotos @Eliana Silva
Shaggy - "Oh Carolina":
Buraka Som Sistema - "Buffalo Stance":
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