Projeto portuense que já conheceu várias fases, os MESA regressam numa altura em que completam 25 anos (sim, é verdade...). Criação do músico, compositor e produtor JP Coimbra cuja origem remonta ao ano 2000, a banda chegou a ter Marta Ren como vocalista nos tempos iniciais e contaria com Rita Reis a dar voz aos dois últimos álbuns ("Pés que sonham ser cabeças", 2013, e "Loner", 2016).

Mas a formação mais lembrada por quem a acompanhou será, sem grandes dúvidas, a que juntou o seu criador (vindo de uma escola de palco partilhada com os Bandemónio, Três Tristes Tigres ou Coldfinger) a Mónica Ferraz (cantora oriunda do universo do jazz) num primeiro álbum homónimo, editado em 2003, que ganharia lugar entre as grandes surpresas da música nacional do seu tempo.

Foi essa a dupla que, ao longo da década, conjugou sensibilidade pop e um óbvio gosto pelo experimentalismo em "Vitamina" (2005) e "Para Todo o Mal" (2008), aos quais se seguiu "Automático" (2011), a derradeira colaboração - a vocalista abandonou o projeto em 2012, optando por um percurso a solo que JP Coimbra também mantém em paralelo. E 13 anos volvidos, é esta a dupla que voltou a encontrar-se: primeiro num novo single, uma versão mais eletrónica de "Deixa Cair o Inverno" (tema originalmente incluído no segundo álbum), e mais recentemente para dois concertos, a 7 de maio na Cada da Música, no Porto, e na passada quinta-feira, dia 15, no Lux, em Lisboa.

MESA
MESA créditos: Clara Tapadas

Depois de terem esgotado o espetáculo na Invicta, os MESA tiveram direito a uma sala bem composta na capital, apresentando-se igualmente no formato de quinteto, com o cúmplice de sempre Jorge Coelho (Zen) na guitarra, Filipe Louro (Memória de Peixe) no baixo e Gil Costa (Salto, X-Wife) na bateria. Os teclados e programações ficaram a cargo de JP Coimbra, cuja postura alternou entre o circunspeto e o delirante. Mas no início do concerto, apenas quatro pessoas estavam em palco: a vocalista começou por cantar entre o público, gesto que trouxe mais uma camada de emoção a uma noite já de si muito aguardada pelos fãs.

Mónica Ferraz não se cansou de agradecer o carinho ao longo da hora e meia que se seguiu, feita de uma sucessão de canções dos quatro primeiros álbuns do grupo com muitas memórias seguramente associadas. Nostalgia? Sim, claro, embora o momento também tenha demonstrado que a música dos MESA, ou pelo menos boa parte dela, envelheceu muito bem. E nem precisou de tentar disfarçar os ecos do trip-hop ouvidos no medley inicial (com "Filamento", "Celofane" e "Sequela"), até porque o género nascido em Bristol dos anos 1990 tem sido recuperado e repensado por uma nova geração.

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MESA créditos: Clara Tapadas

Essa atmosfera crepuscular e introspetiva foi apenas o ponto de partida para um cardápio tão variado como os discos fariam esperar. O rock também mora aqui, como provaram os acessos musculado de "Não Vai Ser Bom" ou "Meio Bicho". E também moram senhoras baladas de claro apelo radiofónico (e que foram merecidamente abraçadas pelas rádios) como "Vício de Ti" e "Cedo o Meu Lugar" (continua a ser notável que Mónica Ferraz entoe "É que eu gosto mesmo de ti" sem um pingo de pieguice, uma lição para tantas vozes que atafulham playlists).

A disputar os acalorados aplausos destas, "Luz Vaga", outro êxito incontornável, foi dos clássicos cantados por toda a sala. Faltou Rui Reininho, cuja voz a tornou ainda mais especial na sua segunda e mais popular versão, é verdade... Por outro lado, o tema foi o único repetido no alinhamento, já no final do encore, com os espectadores a celebrarem-no cantando ainda mais alto.

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MESA créditos: Clara Tapadas

Para as sequências de antologia fica ainda "Esquecimento", o primeiro single dos MESA, como lembrou Mónica Ferraz. E talvez ainda seja o melhor, acrescentaríamos nós, sem desprimor para os seguintes: apenas sinal de uma banda que entrou logo pela porta grande, com garra lírica, instrumental e interpretativa, a moldar uma pop ainda fresca.

No entanto, o tema que revelou o grupo foi outro, recordou também a vocalista: o desafiante e imprevisível "Divagadora", incluído na compilação "Pop Up Songs" em 2003, pouco antes do primeiro disco. O acolhimento entusiasta da imprensa musical a esse aperitivo e às atuações iniciais foi, aliás, um importante voto de confiança para que a dupla acreditasse num álbum, acrescentou JP Coimbra, louvando um tempo em que "os jornais ainda iam a concertos de novas bandas, mesmo daquelas que não tinham gravado discos".

Da colheita original brilhou ainda "Mímica Sísmica", festim de new wave sintética e garrida ao qual nem faltam "fios de ovos e framboesa". As delícias eletrónicas também moram aqui (ou em "Munição", tema incluído em "Para Todo o Mal" que infelizmente não ajudou a adocicar a noite). Para algo completamente diferente, mas não menos brilhante, a turva e cinematográfica "Quando as Palavras" provocou arrepios coletivos já perto da despedida. "Passava uma tarde a ouvir isto", dizia alguém à saída. Mas se um concerto não dura assim tanto, não é má ideia ir (re)descobrir os discos - até porque há, muito provavelmente, mais capítulos a caminho desta história retomada...

Alinhamento do concerto:

Filamento / Celofane / Sequela
Deus Grego
Luz Vaga
Não Vai Ser Bom
Deixa Cair o Inverno (2025)
Fado Lunar
Divagadora
Vício de Ti
Cedo o Meu Lugar
Esquecimento
Tele-Chuva
Meio-Bicho
Mímica Sísmica

Encore:
Tinta Invisível
Quando as Palavras
Luz Vaga