Em entrevista à agência Lusa, Francisco Silva explica que o disco segue uma linha de continuidade, porque gosta de lançar um novo registo de estúdio de dois em dois anos, embora o idealizado seja “muito diferente deste”.
As condicionantes da pandemia de COVID-19 levaram-no a regressar, de forma consecutiva, a um registo mais despojado, com um tipo de trabalho diferente, desde logo pela distância na prática com a banda e outras contingências.
“A escrita não tem nada a ver com a pandemia, mas é um disco que também resulta da pandemia. E também pesou a decisão por me manter ativo no contexto de todas as restrições que havia. É um disco que tem o seu quê de higiénico, de alguma higiene criativa. Manter e resistir, digamos. É um disco muito simples, por todas as condicionantes, mas que essencialmente afirma que isto continua. É a sensação com que fico neste álbum”, descreve.
A pandemia de COVID-19, essa, foi-se sempre manifestando “em coisas muito básicas”, em relação ao trabalho criativo, mas mesmo à própria conceção “diferente” da ideia de voltar a dar concertos, por exemplo.
Por outro lado, a folk de Francisco Silva encontra aqui um conjunto de letras, de canções, que não foram “informadas pelo momento atual”, na escrita, mas depois na gravação.
“Há participações de gente que até por essa via está mais distante. Não foi possível ter esse contacto presencial. Nesse contexto, o mais sensato é realmente simplificar. Seja nos arranjos seja nos processos de trabalho e comunicação. O disco acaba por ser o resultado dessa estratégia”, explica.
Como o registo habitual de Old Jerusalem “sempre foi muito focado nas canções”, com outros “discos bastante despojados no passado”, este é um tipo de trabalho “que não se estranha”.
“Neste vaivém de fazer discos mais arranjados seguidos de mais despojados, para manter alguma variedade sonora e estética, este disco veio em contraciclo”, admite.
O título do disco, “Certain Rivers”, vai pedir emprestado parte de um verso do Nobel da Literatura de 1980, Czeslaw Milosz: “Quando sofremos regressamos às margens de certos rios”.
“Embora o disco não seja propriamente conceptual, sem um conceito único a unir todas as canções, [este é] o mote”, conta o músico.
O encontro entre a memória, a melancolia e a introspeção dá-se entre este olhar para o passado e a identificação de momentos de transição na vida, e têm espaço para a esperança, para outras coisas “mais carregadas”, prevalecendo mais “uma sensação boa”.
“As canções falam bastante sobre a sensação, e não é estranha a Old Jerusalem, da passagem do tempo, e do regressarmos mentalmente aos pontos de tempo de conforto. As nossas referências, as memórias fundacionais. As coisas que são âncoras para a nossa existência, que toda a gente tem”, acrescenta.
O single de apresentação é “High high up that hill”, em colaboração com o norte-americano Peter Broderick, que “salvou” a canção, descartada há anos por Francisco Silva.
“Na tal ideia do disco, e na ligação ao verso do Milosz, o conteúdo lírico é muito próximo da ideia que tinha para o conjunto do disco. (...) Foi um orgulho contar com um artista como o Peter a cantar um tema meu. Fez sentido e norteou um pouco o trabalho do resto do álbum”, acrescentou.
O músico espera poder começar a apresentar o disco ao vivo a partir de julho, num contexto marcado pela situação pandémica.
“Chapels”, de 2018 foi nomeado para melhor álbum independente europeu do ano, pela Associação de Empresas de Música Independente.
Old Jerusalem é Francisco Silva, músico do Porto que há mais de uma década edita com regularidade discos de indie folk, entre os quais "Twice the humbling sun" (2005) e "The temple bell" (2007).
A estreia deu-se em 2003 quando Francisco Silva lançou "April".
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