"Eurodance" é uma coreografia de Rogério Nuno Costa, teve a sua estreia em 2014, também no referido concelho do distrito de Aveiro, e, após itinerância pelo país, sobe agora ao palco do Cineteatro António Lamoso no âmbito do 43.º FIMUV - Festival Internacional de Música de Paços de Brandão.

"É o nosso espetáculo mais alegre, mais explosivo e mais divertido de sempre, e faz todo o sentido apresentá-lo agora porque é precisamente sobre o fim do mundo", declara à Lusa a diretora artística do BCN, Susana Otero.

Essa referência deve-se ao facto de a obra ter sido inspirada pelo alarmismo que se viveu na viragem do ano 1999 para o de 2000, quando se esperava uma catástrofe informática global gerada pelo chamado "bug do milénio", e também se mostrar ajustada à presente conjuntura de instabilidade mundial, motivada pela pandemia de COVID-19.

Descrito como "uma hecatombe geopolítica e tecno-emocional" aplicável a ambos os cenários, o espetáculo "Eurodance" junta assim cinco bailarinos em palco para um "'countdown' a 190 beats por minuto em direção ao fim do mundo" e para uma "festa meteórica em homenagem a todos os que (ainda) não morreram".

Susana Otero diz que o momento é ainda uma oportunidade para celebrar com o público 25 anos de uma atividade que, mesmo em períodos críticos como a paragem cultural motivada pelo vírus SARS-CoV-2, no caso específico do BCN "tem sido possível graças ao apoio da Direção-Geral das Artes e da Câmara Municipal da Feira", que asseguram à companhia "as condições físicas para ela trabalhar e meios financeiros para os respetivos elementos viverem do seu trabalho".

No caso da autarquia, por exemplo, a diretora artística realça: "Não fizemos os espetáculos que tínhamos previstos desde março, mas eles foram pagos na mesma e a realidade é que metade dos problemas que a comunidade artística atravessa nesta altura não existiriam se as entidades responsáveis tivessem tido a mesma atitude, cumprindo a sua obrigação para com as obras que encomendaram - como fazem, aliás, com qualquer outro produto encomendado a outro fornecedor".

"É que os artistas trabalharam na mesma, ainda que não tenham subido ao palco. A apresentação em palco é só o último momento de todo o processo artístico", acrescenta a bailarina e coreógrafa.

Os referidos apoios permitiram ao BCN lançar uma ‘open call’ para criadores de todas as áreas, envolver 16 artistas num novo espetáculo e fazer a devida apresentação online, numa "adaptação à realidade do novo contexto pandémico". Possibilitaram também que a companhia mantivesse via internet o seu habitual programa de formação para profissionais e amadores das artes performativas e que editasse o livro "Sistema Infinitamente Imaterial", que é comemorativo do seu percurso, reúne ensaios de diferentes criadores e será lançado no próximo dia 25 de novembro.

É por essas concretizações que, mais do que recordar o passado da companhia, Susana Otero prefere encarar as oportunidades que se colocam ao seu futuro e aponta a cocriação artística como estratégia de sucesso comprovado. "O que estes anos provaram é que tem toda a lógica continuarmos a trabalhar juntos com outros criadores. Foi isso que nos ajudou a levar o projeto do BCN por diante e a maior lição que retiramos de tudo isto é que criar com outras pessoas, em colaboração, é sempre especial e potencia mais qualidade", afirma.

Ainda assim, Susana Otero defende que a consciência política e social quanto ao setor das artes "tem que mudar", como diz ter ficado claro "pelo montante ridículo das verbas que o Governo disponibilizou para apoio ao meio cultural em geral", no contexto socioeconómico que se vem vivendo desde março.

"A culpa da pandemia não pode ser só de quem está no fim da linha e sem contrato de trabalho, porque uma família não consegue sobreviver com 400 euros por mês. Se diversas manifestações de arte e cultura ajudaram as pessoas a lidar com o confinamento, é porque alguém criou esses conteúdos. Portanto, esse trabalho tem que ser valorizado - a criação é um exercício permanente e tem que ser respeitada como tal", conclui.