Trata-se de uma peça em um ato, publicada pela primeira vez em 1920, em Angra do Heroísmo, e que foi levada à cena em março desse ano pela companhia do Teatro S. Luiz, que se encontrava em digressão nos Açores.
“A partir daí entrou no esquecimento e não voltou a ser editada”, escrevem os investigadores Chloé Pereira e Luiz Fagundes Duarte, numa nota editorial.
Um esquecimento compreensível, segundo os investigadores, que citam o escritor e ensaísta David Mourão-Ferreira, que a colocou entre as obras “imaturas” de Nemésio, que se seguiu ao seu primeiro livro de poemas, além de que “o próprio autor nunca se lhe refere, nem tão pouco a incluiu na sua bibliografia”.
“O enredo da peça, que respeita o modelo aristotélico de utilidade do tempo, espaço e ação, é simples: no seu sóbrio gabinete ‘de intelectual’, Jorge confidencia ao amigo Luís a sua história de amor proibido e secreto ‘de uma noite’ com Clarisse, rapariga que não consegue esquecer apesar de estar noivo de Laura, e de ela ser a noiva de Vasconcelos; Luís censura-lhe o comportamento irresponsável, - e estão dos dois nesta conversa quando, inesperadamente, entra Clarisse”, escrevem os dois investigadores.
Os dois amantes encetam uma conversa “plena de artificialismo de meio social”, que não era o dele, e de “subtileza de linguagem”, que “já prefigura o futuro escritor”.
O final da peça, sem surpresas, é a separação de ambos, determinada por Clarisse e cada um regressa à sua relação oficial.
Este segundo volume inclui ainda os livros de contos “Paço do Milhafre” e “O Mistério do Paço do Milhafre”, o primeiro publicado em 1924, e segundo afirmou Nemésio, em 1969, nele conta circunstancialmente a sua infância, pessoas e coisas, esclareceu.
Numa nota editorial, o investigador Urbano Bettencourt explica que “a decisão de publicar integralmente e lado a lado os dois volumes de contos, independentemente das alterações textuais e ou narrativas que ocorreram de um para o outro, representa para o leitor a possibilidade de proceder a esse confronto e de aperceber-se da progressão de alguns procedimentos de escrita nemesiana”.
Numa outra perspetiva – prossegue Urbano Bettencourt -, permite ao leitor “optar diretamente por uma versão ou por outra, sem cuidar de saber do labor oficinal do seu autor”.
A publicação Obra Completa de Vitorino Nemésio foi iniciada no ano passado, com a edição do primeiro dos quatro livros de poesia do autor. O volume que abriu a série reúne a poesia editada desde 1916 a 1940.
Vitorino Nemésio, entre outras atividades e colaborações dispersas em várias revistas literárias e jornais, foi professor na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e, como poeta, “por ele passam muitas das ideias estéticas que enformaram a poesia portuguesa do século XX, no seio da qual soube manter uma voz e uma postura muito próprias”, escreveu Fagundes Duarte, responsável pela edição da obra, doutorado em Línguas e Literaturas Modernas e Linguística, pela Universidade Nova de Lisboa.
Além dos quatro volumes de poesia, o plano da Obra Completa de Vitorino Nemésio prevê editar a ficção três volumes, um deles do seu mais celebrado romance “Mau Tempo no Canal”, e em seis volumes o seu Diário e Crónicas, que inclui os textos de “Se bem me lembro” e quatro volumes de Ensaio, entre os quais “Relações Francesas do Romantismo Português”, originalmente editado em 1936, e a biografia de D. Isabel de Aragão, mulher do rei D. Dinis.
Vitorino Nemésio nasceu a 19 de dezembro de 1901, em Praia da Vitória, Açores, e morreu há 40 anos, em 20 de fevereiro de 1978, em Lisboa, e tornou-se muito popular graças ao programa televisivo "Se Bem me Lembro", apresentado por si na RTP, de 1970 a 1975.
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