O canal História estreou, no passado domingo, "A Raia", série documental de produção própria que revela as diferenças e semelhanças entre Portugal e Espanha. A série é composta por seis episódios, onde acompanhamos as aventuras do ator português Pedro Pernas e do apresentador espanhol Miguel Ángel Tobías, que viajaram juntos por toda a fronteira ao longo de um mês, percorrendo mais de 3 mil quilómetros. A tvPRIME entrevistou os protagonistas sobre este projeto.

Pedro Pernas, o ator português:

tvPRIME - Quais foram os principais desafios no desenvolvimento deste projeto?
Pedro Pernas -
O facto de, pela primeira vez, assumir um trabalho em televisão em nome próprio, já que até agora sempre trabalhei em ficção, assumindo uma personagem; também o facto de me fazer à estrada ao lado de um desconhecido, já que eu e o Miguel Ángel só comunicámos uns vinte minutos por Skype, antes do primeiro dia de rodagem, o primeiro encontro pessoal; o ser o único português na equipa de trabalho; enfim, todas aquelas pequenas dúvidas com que nos deparamos numa coisa nova, mas nada que não tenha sido muito facilmente ultrapassado logo nos primeiros dias, pela convivência mas, sobretudo, pelos fantásticos seres humanos com quem embarquei nesta aventura.
Também o facto de ser um projeto que, apesar de despretensioso, ser de muita
responsabilidade, por ser para o Canal História, que prima por ser rigoroso com o conteúdo histórico.

tvPRIME - A escolha deste projeto deveu-se a alguma razão em particular?
Pedro Pernas -
Na perspetiva do Canal História, creio que a principal razão foi tentar perceber o porquê de se sentir que Portugal e Espanha, apesar de serem países vizinhos, gémeos mesmo, serem desconhecidos, desligados entre si. Mostrar que não são assim tão desconhecidos, pelo contrário, têm mais coisas a uni-los que a separá-los, e a raia, a fronteira, é apenas uma separação administrativa, não humana, não de comunidade.
Na minha perspetiva, a escolha deve-se ao facto de, logo que recebi o convite, sentir que seria um desafio fantástico que eu não podia deixar de abraçar, que seria, como foi, enriquecedor para mim, tanto como ator mas também, e principalmente, como pessoa.

tvPRIME - Das diversas localidades por onde passaram, em Portugal ou Espanha, houve alguma que se destacasse pela positiva ou negativa?
Pedro Pernas -
Em geral, todas se destacaram pela positiva, mostrando uma grande preocupação pela herança histórica presente em cada uma, com um cuidadoso trabalho de preservação.

tvPRIME - Como não se conheciam, o vosso convívio foi sempre fácil, ou surgiram algumas dificuldades pelo caminho?
Pedro Pernas -
Em qualquer relação humana, seja ela de que natureza for, por vezes surgem atritos, seja por mal-entendidos, seja por feitios, seja por qualquer outra razão, mas nada que não se ultrapasse rápida e facilmente conversando sobre o assunto. E foi o que se passou; das muito poucas vezes que alguma coisa se passou, facilmente se ultrapassou a questão. Faz parte do crescimento da relação em questão, da cumplicidade com o outro. E a nossa relação não foi diferente.

tvPRIME - Com a crise que se tem vivido na Europa de forma geral, acha que este projeto vem de alguma forma aproximar dois povos que podem ter mais semelhanças do que aquilo que pensamos?
Pedro Pernas -
Espero que sim. Portugal e Espanha sempre tiveram um percurso histórico muito semelhante, muito paralelo, até já dividiram o mundo a meio entre os dois. E apesar de, por vezes terem estado realmente de costas viradas, e de por vezes se terem sentido diferenças no desenvolvimento de ambos, denoto que, atualmente estão a olhar de frente um para o outro, respeitando e constatando o facto de se encontrarem numa situação de instabilidade similar e que a união poderá fazer a força. Daí sentir-se que a parceria comercial entre ambos é cada vez mais volumosa, importantíssima para a economia dos dois países. Por isso, juntando o exemplo de parceria social e de entreajuda dos povos raianos, mais facilmente se consegue alcançar um patamar superior ao que já existe. Isto porque realmente as semelhanças são bastantes, até no efeito que a crise geral europeia tem na economia e na estabilidade de ambos. Com uma mais forte aproximação dos dois países, com um trabalho comum de desenvolvimento, de apoio social, de apoio comercial e de prioridade de parcerias entre ambos, creio que a Europa iria olhar com outros olhos e com outro respeito para a Península Ibérica.

tvPRIME - De todas as experiências que passaram nestes 3000 quilómetros de estrada, qual foi para vocês a mais enriquecedora?
Pedro Pernas -
A viagem em si foi a coisa mais enriquecedora. Foi tudo uma grande e única experiência. Não quero destacar ou ocultar nenhuma experiência em particular. Todos os momentos passados deram o seu contributo. Espero que os espectadores desfrutem da série tal como nós desfrutamos.

tvPRIME - A seguir a esta série, têm algum projeto já em mente?
Pedro Pernas -
Em sequência direta deste, obviamente que já surgiram ideias, tanto ao Miguel Ángel, como a mim e aos responsáveis do Canal História. Mas ainda são só ideias. Relativamente a outros projetos pessoais, estarei em cena no musical Zorro, no Teatro Rivoli, no Porto, até dia 1 de Junho e o resto do ano de 2013 será pelo teatro que irei continuar a trabalhar. Mas sempre disponível para embarcar em mais aventuras televisivas, seja em ficção, seja em que registo for.


Miguel Ángel Tobías, o apresentador espanhol:

tvPRIME - Quais foram os principais desafios no desenvolvimento deste projeto?
Miguel Ángel Tobías -
Foram vários: Um deles foi juntar vários géneros no mesmo formato, por exemplo "A Raia" é uma série de viagens, é uma série histórica, é um programa de entrevistas e além disso é um docshow e tudo é contado de forma real e sequencialmente tal como foi acontecendo na viajem, e durante 21 dias seguidos. Se a isto juntarmos o meu caso que, como realizador da série, tive que estar permanentemente atrás e à frente da câmara, já se pode imaginar a intensidade do que implicou a realização deste maravilhoso projeto.

tvPRIME - A escolha deste projecto deveu-se a alguma razão em particular?
Miguel Ángel Tobías -
Eu sempre fui um apaixonado pelas; pelas caraterísticas tão especiais que possuem para os habitantes de um e outro lado e pelo meu trabalho como realizador e produtor de documentários, já passei por muito. Por outro lado, o História também contou muitas vezes coisas relacionadas com as fronteiras. Desta forma, numa conversa com a Diretora Geral do História, Carolina Godayol, surgiu o tema, apresentou-me o desafio de criar um projeto sobre a fronteira entre Espanha e Portugal e assim nasceu "A Raia", um documentário com caraterísticas únicas, incluindo uma mistura de géneros, o facto inovador de cada protagonista, Pedro Pernas e eu, falarmos, inclusivamente entre nós, cada um na sua própria língua.

tvPRIME - Das diversas localidades por onde passaram, em Portugal ou Espanha, houve alguma que se destaca-se pela positiva ou negativa?
Miguel Ángel Tobías -
Isso é como pedir a um pai que escolha entre os seus filhos. É muito difícil, a verdade é que gostamos dos lugares onde estamos em função das recordações emocionais que nos levaram a eles e neste caso foi maravilhoso constatar que nos sentimos em casa em cada localidade e cidade por onde passámos independentemente do lado da Raia em que nos encontrávamos. Esta situação é mérito das maravilhosas pessoas que vivem de ambos os lados.

tvPRIME - Como não se conheciam, o vosso convívio foi sempre fácil, ou surgiram algumas dificuldades pelo caminho?
Miguel Ángel Tobías -
Imagine que tivesse sido má, nunca o iria admitirr... Não, a sério, realmente essa era uma das minhas preocupações, não apenas como coprotagonista da série, mas como realizador, já que tinha a noção do que poderia significar para o resultado final, mas a verdade é que tive muita sorte que fosse Pedro Pernas o meu companheiro de viagem, já que é uma pessoa estupenda tanto profissional como pessoalmente e fez com que a convivência fosse muito fácil, tendo em conta que passámos juntos 16 horas por dia. Espero que ele pense o mesmo de mim. Além disso, como ele é cantor profissional e eu gosto de cantar aproveitei para ele me ensinar e passamos muitos bocados no carro onde cantámos canções espanholas e portuguesas. Acho que na série se veem algumas destas cenas.

tvPRIME - Com a crise que se tem vivido na Europa de forma geral, acha que este projeto vem de alguma forma aproximar dois povos que podem ter mais semelhanças do que aquilo que pensamos?
Miguel Ángel Tobías -
Sem dúvida! Muitas vezes me perguntaram, depois de percorrer o mundo a filmar documentários sociais, qual a minha conclusão e sempre respondi o mesmo: é que há muito mais coisas que unem os seres humanos do que as que os separam. Independentemente de crenças, nível sociocultural, económico, ideologia. Todas as coisas importantes são iguais para todos os seres humanos: as alegrias, as tristezas, os sonhos. E é verdade que eu o posso garantir, depois de ter estado em zonas de conflito ou de desastres naturais como no Haiti, que os seres humanos se unem muito mais na adversidade, e sem dúvida agora esta crise é uma oportunidade para que todos os povos e no caso Espanha e Portugal se unam mais e compreendamos de uma vez por todas que somos um só povo, uma só nação, uma só raça; a raça humana. E que as fronteiras só deveriam ser utilizadas para o que fizemos neste documentário para sabermos mais e desfrutar da diversidade cultural, histórica e gastronómica e para criar pontes emocionais entre uns e outros.

tvPRIME - De todas as experiências que passaram nestes 3000 quilómetros de estrada, qual foi para vocês a mais enriquecedora?
Miguel Ángel Tobías -
Acho que respondi a isso há pouco em cada resposta, mas deixe-me expressar o momento mais emocionante vivido e que por respeito não vou revelar a sua identidade, já que aparece na série. Uma família muito pobre (em termos económicos, já que são milionários em bondade e coração), não permitiram que nos fôssemos embora depois de ter terminado uma gravação sem nos darem comida para o caminho. Não tenho palavras para expressar o que sentimos eu e o resto da equipa, que são 11 pessoas.

tvPRIME - A seguir a esta série, têm algum projeto já em mente?
Miguel Ángel Tobías -
Sem dúvida, o mais importante agora, é que os espectadores, tanto portugueses como espanhóis desfrutem da série, tanto como nós desfrutamos ao fazê-la e sejam capazes de viver e de sentir o que nós sentimos. À margem disto, estou a acabar de montar um documentário sobre a violação dos Direitos Humanos no Sahara, que vai estrear nos próximos meses. E também deixe-me dizer-lhe que estou a trabalhar num projeto internacional para produzir e dirigir um documentário sobre a fome no mundo.
E ainda, um sonho, continuar a produzir para o História, que é sem dúvida um dos canais de televisão mais importantes e prestigiados do mundo. Beijos e abraços para todas e todos os espetadores do História em Portugal.