A Mostra de Cinema de Expressão Alemã (Kino) avança para a sua 13ª edição e decorre em Lisboa entre 19 e 24 de janeiro no cinema São Jorge e no Goethe Institut, que é entidade organizadora.
A seguir, será a vez do Porto (26 a 29 no Teatro Tivoli e no cinema Passos Manuel) e Coimbra (01 a 3 de fevereiro no Teatro Académico Gil Vicente).
Com uma seleção fortemente baseada no Festival de Berlim, uma das maiores montras de cinema alternativo do mundo, a Kino oferece ainda cruzamentos com o cinema de género (“uma relação complicada“, como admite) e uma forte aposta no documentário.
Entre os destaques estão “Fukushima mon Amour”, de Doris Dörrie, que abre a Mostra, o filme de encerramento, “Stefan Zweig – Adeus. Europa” [foto em cima], obra de encerramento, “Fado”, rodado inteiramente em Lisboa, o documentário “Homo Sapiens” e o ousado “Wild”
Em foco estão novas produções de Alemanha, Áustria, Suíça e Luxemburgo, cujas embaixadas apoiam a Mostra, e o SAPO Mag conversou com a programadora, Corinna Lawrenz, sobre as novidades do cinema germânico, que salienta que "o que interessa ver numa Mostra de Cinema de Expressão Alemã não é um cinema comercial como qualquer outro, mas filmes que tenham alguma especificidade, seja ela estilística ou temática”.
Uma das bases da programação da Mostra é o Festival de Berlim, que é um dos grandes bastiões da “arthouse” mundial. Isso dá um toque bastante autoral à programação da Kino...
É um dos nossos grandes objetivos fazer da KINO uma plataforma para este tipo de cinema. A Alemanha tem tanto uma história como um presente muito forte no que diz respeito ao cinema de autor. Apesar da presença e do reconhecimento destes filmes no âmbito de festivais, nem sempre conseguem entrar no circuito comercial noutros países. Com a KINO pretendemos não só colmatar esta lacuna mas também colaborar com os distribuidores que têm a coragem de apostar em cinema de língua alemã.
Penso que o que interessa ver numa Mostra de Cinema de Expressão Alemã não é um cinema comercial como qualquer outro, mas filmes que tenham alguma especificidade, seja ela estilística ou temática. Claro que a Berlinale é um bom ponto de partida neste processo de programação, tanto no que diz respeito aos nomes mais conhecidos como em relação a jovens realizadores. Mas depois juntam-se outros e procuramos estabelecer um programa que funcione como um todo.
O que pode adiantar sobre o filme de abertura, “Fukushima mon Amour”? Para além de ser uma história passada no Japão, o filme se relaciona de alguma forma com a obra de Alain Resnais que refere no título, onde referencia “Hiroshima mon Amour”?
De facto, apesar do título alemão não sugerir esta referência de um modo tão óbvio, a escolha dos títulos inglês e português não é de todo um acaso mas uma escolha consciente da própria realizadora. É muito menos uma aproximação formal ou narrativa a “Hiroshima, Meu Amor” [1959] do que, por um lado, uma apreciação de Resnais e, por outro lado, como a própria Doris Dörrie observa, uma referência a como esta sucessão de duas catástrofes nucleares é vista no Japão.
Um dos pontos fortes da obra é que, para além deste local específico, que vemos também através de um ângulo diferente no filme de abertura da secção KINOdoc, “Homo Sapiens”, aborda temas muito universais. E claro que também tem uma cinematografia a preto e branco bastante interessante – não é só por ser o filme de abertura que as suas imagens se tornaram num dos nossos destaques deste ano.
No ano passado, a Mostra refletiu muito o tema dos refugiados, que foi um dos mais marcantes por esta altura em 2016. Existe a predominância de alguns temas na seleção deste ano?
A questão da fuga e do refúgio foi um tema tão marcante que se tornou uma escolha óbvia na edição de 2016. E continua a estar presente nesta edição com “Babai”, que estreia em Coimbra, com o documentário “Havarie”, de Philip Scheffner, mas também com o filme de encerramento. A tendência mais destacada desta edição – mas que já se podia observar em edições anteriores – é o facto do cinema de produção alemã atravessar cada vez mais fronteiras, abordar temas internacionais e trabalhar de forma crescente em coprodução com outros países. Nesse sentido é também um cinema muito atual e que reflete criticamente a nossa atualidade – com pontos de partida, também eles diversos, dentro do espaço de língua alemã, e olhando para o mundo de ontem, hoje e amanhã.
A Alemanha também produz cinema de género. O que pode dizer sobre ele e que títulos da Mostra são exemplos?
Produz, mas é uma relação complicada. O filme de abertura da edição de 2016, “Lügen der Sieger", de Christoph Hochhäusler, é um bom exemplo disso. Pode ser chamado um "thriller" político, mas é, ao mesmo tempo, uma desconstrução do género que nem sempre cumpre as expectativas do público em relação àquilo que se pode chamar um "thriller".
Este ano, se olharmos para ““Stefan Zweig – Adeus. Europa" que, considerando o tema, podia ser um filme histórico ou um “biopic”, temos que dizer que joga com isto mas que também vai muito para além destes géneros. E embora seja talvez o histórico do tipo de filme alemão que mais presença tem nos circuitos internacionais, enquanto festival também pretendemos refletir e questionar esta visão um pouco limitada.
Um pouco fora dos circuitos “arthouse”, para retomar esta expressão, há uma produção e um forte interesse do público no policial. Há toda uma cultura de ver o “Tatort“ no domingo à noite, em família, com amigos ou em bares. E até existe uma ligação dessa cultura ao cinema de autor, com policiais realizados por cineastas conhecidos como Dominik Graf ou Christian Petzold. Mas é algo que não sai tanto do próprio país.
Trailer "Stefan Zweig – Adeus. Europa".
Comentários