O realizador Kléber Mendonça Filho mostrou-se preocupado com o desaparecimento da criação artística brasileira, face ao atual panorama político, mas também com o reforçar da imagem do artista como um “inimigo do povo” naquele país.
Questionado pela Lusa em Vila do Conde, onde esteve no festival Curtas, sobre se seria concebível que os cortes na Cultura no Brasil pelo governo de Jair Bolsonaro tenham como consequência uma quebra na criação artística do futuro, o realizador de “Bacurau” disse ter preocupações a dois níveis: por um lado, em relação ao “desaparecimento do produto artístico brasileiro” e, por outro, sobre a imagem do artista.
“Tenho duas preocupações nesse sentido: o desaparecimento do produto artístico brasileiro, que é extremamente grave porque o audiovisual é uma indústria como qualquer outra. Milhares de pessoas que trabalham. No ‘Bacurau’ trabalharam 800 pessoas, direta e indiretamente. Mas o que mais me preocupa é o fortalecimento de algo que já existe, que é a imagem nefasta do artista numa sociedade como o Brasil e isso está pegando”, afirmou o cineasta.
Para o realizador, premiado em Cannes e mais recentemente em Munique pelo seu mais recente filme, “já existe uma transformação do artista num inimigo da sociedade, num inimigo do povo, num vagabundo, num aproveitador, num embuste, num canalha”, e “isso é muito grave”.
“Claro que, mais uma vez voltando para o passado, isso a gente identifica, por exemplo, na Alemanha dos anos 1930. E isso me impressiona bastante. Porque podia ser, sei lá, ‘corta todo o dinheiro para a cultura’, mas o artista continua sendo importante. Não. É ‘corta o dinheiro, porque os artistas são praticamente criminosos’ e isso é muito estranho. E essas pessoas não lembram que elas chegam em casa e vão ver Netflix, ou seja, tudo feito por artistas”, declarou Kléber Mendonça Filho.
O realizador de obras como “O Som ao Redor” e “Aquarius” reconheceu que gostaria “de ver um cinema mais reativo, uma arte mais reativa” no Brasil.
Kléber Mendonça Filho acomapanhou, no Curtas Vila do Conde - Festival Internacional de Cinema, a exibição de “Bacurau”, o seu mais recente filme, correalizado com Juliano Dornelles, Prémio do Júri no Festival de Cannes, no passado mês de maio.
Comentários