Na Croisette, porém, os profissionais não temem as eventuais consequências do escândalo que sacudiu o mundo do cinema nos últimos meses.
"Sem dúvida, o Festival de Cannes nunca mais será o mesmo", disse Thierry Frémaux, o seu delegado-geral, ao apresentar, em abril, a seleção oficial, em alusão ao caso Weinstein, acusado de assédio sexual, abusos e estupros por uma centena de mulheres.
A atriz francesa Léa Seydoux, uma das acusadoras, fará parte do júri deste ano, majoritariamente feminino, com cinco mulheres entre nove membros. O júri será presidido pela atriz australiana Cate Blanchett, comprometida com a luta contra o assédio sexual no cinema através da fundação Time's Up.
Em outubro, quando o escândalo foi revelado, o festival afirmou que as agressões sexuais de que Weinstein é acusado "denotam um comportamento imperdoável".
Os organizadores da prestigiosa mostra, que será realizada de 8 a 19 de maio, querem que o princípio do "comportamento correto exigido" reine entre os presentes. Serão distribuídos folhetos recordando as penas para o assédio sexual e incluindo um número de telefone para qualquer vítima ou testemunha.
Estas medidas somam-se a vários debates em torno do papel das mulheres na Sétima Arte.
Para a gala de inauguração, no entanto, não foi anunciado nenhum tipo de ação específica como aconteceu, por exemplo, nos Globos de Ouro, onde a maioria de estrelas se vestiu de preto.
O caso DSK
Embora o caso Weinstein tenha sacudido o mundo do cinema, para os profissionais do turismo de Cannes trata-se de uma mera "história de jornalistas", afirma Bruno Draillard, que dirige uma empresa com oito agências imobiliárias: "Isto não tem nenhum impacto. As pessoas vêm para fazer negócios. Talvez sejam um pouco mais discretos".
No Mercado do Filme, que é realizado paralelamente ao Festival, também se considera que a ausência do produtor não terá muitas consequências: "É verdade que a Weinstein Company costumava trazer filmes de qualidade (...) Há outras grandes empresas que também são competentes", assegura o seu responsável, Jérôme Paillard.
"O festival de cinema é acima de tudo negócio", insiste Christine Welter, vice-presidente do sindicato de hoteleiros de Cannes. Para ela, se houve um impacto, foi "sobretudo depois do caso DSK".
O escândalo em torno de Dominique Strauss-Kahn, ex-diretor-geral do FMI, acusado de violação por uma funcionária do Sofitel de Manhattan, em 2011, levou inclusivamente a uma mudança nos procedimentos dos hotéis.
O comportamento de Weinstein era conhecido em Cannes? "Ficámos a saber pela imprensa", assegura Alain Lahouti, presidente da União regional de Ofícios de Hotelaria, como todos os interlocutores entrevistados pela AFP.
No Cap Eden Roc, onde o produtor terá levado a cabo alguns dos atos de que é acusado, "não desejam falar sobre este tema". Foi neste hotel de luxo que em 9 de maio de 1997 Weinstein terá violado a atriz italiana Asia Argento, então com 21 anos. Argento foi uma das primeiras a romper o silêncio.
"Os problemas acontecem sobretudo no verão em alguns hotéis ou propriedades privadas", com um "cliente que prefere uma massagem em vez de uma prova", afirma Aline Buffet, à frente de uma equipa de cerca de 20 costureiras.
Buffet lembra-se de apenas um incidente durante o Festival, há "quatro ou cinco anos": "Havia duas estrelas num quarto e eu tinha enviado as costureiras muito cedo. Tinha havido uma grande orgia no quarto e (...) pediram-lhes que tirassem a roupa. Fui falar com a produção e o assunto resolveu-se muito rapidamente".
No caso Weinstein, "houve sem dúvida excessos", indica Nathalie Di Sotto, funcionária de um restaurante em Cannes: "Acontecia a mesma coisa na época de Marilyn Monroe ou de Brigitte Bardot. Sempre houve este domínio dos homens sobre as mulheres. Mas hoje isso tornou-se um tema maior".
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