Tinha um sorriso irresistível: Mary Tyler Moore, que ajudou a lançar uma nova era para as mulheres na televisão e na sociedade, morreu esta quarta-feira.
"Hoje, o ícone amado Mary Tyler Moore faleceu aos 80 anos na companhia de amigos e do seu amado marido de mais de 33 anos, o Dr. S. Robert Levine ", disse a sua longa agente em comunicado.
"Uma atriz inovadora, produtora e apaixonada ativista da Fundação de Pesquisa sobre Diabetes Juvenil, a Mary será lembrada como uma visionária destemida que influenciou o mundo com o seu sorriso", concluía a declaração.
Nascida em Brooklyn in 1936, Mary Tyler Moore tornou-se uma estrela como Laura Petrie na série “The Dick Van Dyke Show”, produzida entre 1961 e 1966 e criada por Carl Reiner, que a recordou agora numa declaração à Variety como "a personificação da bondade; nunca podia fazer nada errado".
O papel valeu-lhe o primeiro dos seis Emmys que recebeu durante a sua carreira e foi um passo em frente na representação das mulheres em televisão: embora tivessem camas separadas, o casal mantinha um matrimónio ativo e a personagem de Dick Van Dyke não se sentia ameaçado pela evidente inteligência ou talentos da esposa.
A seguir, com a ajuda do segundo marido, o produtor Grant Tinker, e de talentos como James L. Brooks (o futuro realizador de "Laços de Ternura") e Allan Burns, moldou outra série, “The Mary Tyler Moore Show”, que estreou em 1970.
Ainda com Ed Asner, Valerie Harper, Cloris Leachman, Ted Knight e Betty White, durou sete temporadas e foi revolucionária, abordando temas como a igualdades salarial entre géneros, divórcio, indidelidade, sexo antes do casamento ou homossexualidade.
Ela interpretava Mary Richards, a produtora no departamento de notícias numa estação televisiva de Minneapolis: solteira, independente na vida e na carreira, a personagem tornou-se um dos símbolos da mulher moderna americana dessa década. Uma das pessoas que influenciou foi a muita jovem Michelle Obama, como esta admitiu numa entrevista à Vanity Fair o ano passado.
Consagrada como um ícone da comédia em televisão, Mary Tyler Moore foi contra essa imagem com a transformação dramática para o filme "Gente Vulgar", de 1980: ela era Beth, a gélida mãe incapaz de demonstrar afeto e que se esforçava por manter a normalidade na família após um acidente matar um dos filhos e o outro (Timothy Hutton) se sentir culpado pela tragédia.
Foi um papel chocante para todos os que a viam como a "querida da América".
Robert Redford, que fazia a estreia como realizador, recordou agora em comunicado que "a energia, o espírito e o talento de Mary criaram uma nova marca brilhante na paisagem televisiva e ela fará muita falta. A coragem que ela demonstrou ao assumir um papel [no filme], mais complexo do que qualquer coisa que já tinha feito, foi valente e extremamente poderosa".
Ironicamente, foi uma coragem que também necessitou na vida real: a 24 de outubro de 1980, um mês após a estreia de "Gente Vulgar", o seu único filho morreu aos 24 anos, vítima de um disparo acidental ao manejar uma pistola.
Nomeada para o Óscar de Melhor Atriz, perdeu para Sissy Spacek em "A Filha do Mineiro" , mas "Gente Vulgar" ganhou Melhor Filme, Realização, Ator Secundário (Hutton) e Argumento Adaptado, e foi o seu grande papel no cinema, pois só encontrou papéis à altura do seu talento em "Só Entre Amigas" (1986, Allan Burns) e "Flirting with Disaster" (1996, David O. Russell).
Em televisão, onde já era um ícone, tentou recuperar a magia dos seus triunfos com "The Mary Tyler Moore Hour" (1979), "Mary" (1985) e "New York News" (1995), mas sem o mesmo impacto.
Teve ainda algum sucesso num regresso aos palcos da Broadway com "De Quem é a Vida, Afinal", recebendo um Tony especial pela sua interpretação.
Uma faceta menos conhecida da sua carreira foi a de produtora independente: a MTM Enterprises, que criou em 1969 com Grant Tinker para produzir "The Mary Tyler Moore Show", esteve na origem de alguns dos sucessos que definiram a televisão americana dos anos 70 e 80.
O símbolo da produtora era Mimsie, a sua gata, e embora a atriz não acompanhasse intensamente o dia-a-dia da empresa, muitos dos programas partilhavam as sensibilidades e temas das séries que protagonizou, nomeadamente "The Bob Newhart Show" (1972-1978), "Rhoda" (1974-1978), "Lou Grant" (1977-1982), "WKRP in Cincinnati" (1978-1982), "A Balada de Hill Street" (1981-1987), "Remington Steele" (1982-1987), "St. Elsewhere" (1982-1988) e "Newhart" (1982-1990).
Já este século, com a saúde a agravar-se por causa de diabetes, diagnosticada aos 33 anos e que quase a deixou sem visão nos últimos anos, passeou o estatuto como atriz convidada em alguns telefilmes, mas cada vez mais retirada da vida pública. A simbólica despedida aconteceu com um episódio de 2013 na série "Póquer de Rainhas" que a juntou às amigas e colegas Betty White, Valerie Harper (foto) e Cloris Leachman.
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