Obcecado com o digital e os efeitos especiais, James Cameron é uma lenda que revolucionou várias vezes o cinema, com “Exterminador Implacável”, “Titanic” ou “Avatar”. A tecnologia ocupa um lugar central na sua obra, mas não é tudo, garante, em entrevista à France-Presse.

Agora que todas as produções podem ter acesso aos efeitos especiais, e que centenas de milhões de dólares podem ser investidos num 'blockbuster', esse “talento artístico” é o que marca a diferença, acredita o rei das bilheteiras.

“Qualquer um pode comprar um pincel. Mas não é qualquer um que pode pintar uma obra de arte”, diz o cineasta, entrevistado em Paris por ocasião da estreia de “Avatar: O Caminho da Água”, que entra em cartaz em Portugal a 15 de dezembro.

A produção desta longa-metragem, que chega 13 anos depois da antecessora, exigiu enormes recursos técnicos, como longas filmagens debaixo d’água, em apneia.

“Sou uma espécie de filtro central de tudo, mas tenho vários artistas que trabalham para mim, desenham as personagens, a arquitetura, o mundo, as plantas, o vestuário…”, resume.

“Gosto de pensar que é como uma grande comunidade hippie com uma quantidade gigantesca de grandes artistas”, acrescenta. “A tecnologia não cria arte. Artistas criam arte”.

Manter o foco

Um filme como os da franquia “Avatar”, gravado com um fundo azul para depois serem adicionados cenários, texturas e acessórios por computador, deve muito à interpretação dos atores, considera Cameron, embora seja difícil reconhecê-los após o processo digital.

“O coração, a emoção, a criatividade… Tudo isso vem primeiro”, durante a gravação das cenas “reais”, a primeira etapa de construção do filme, antes mesmo da definição dos ângulos de câmara e planos.

“Só depois começa o trabalho técnico”, explica.

Quanto à “inteligência artificial”, utilizada para tratar as imagens, Cameron assegura que não a utiliza para “substituir os atores, mas sim para ser ainda mais fiel às suas interpretações”.

O homem dos recordes, com os filmes mais caros e também mais rentáveis do mundo, de “Titanic” ao primeiro “Avatar”, reconhece que carrega “uma grande responsabilidade”.

“Não posso ser caprichoso ou impulsivo, preciso manter-me focado para criar algo que agrade a mim, ao público e que seja comercial o suficiente para fazer dinheiro”, explica.

“Não pode ser intelectual demais, mas posso fazer algo satisfatório para mim, colocando uma segunda ou terceira camada de significado, que as pessoas podem ou não captar”, continua.

Indignação pela natureza

Como um Cousteau moderno, fascinado pelo mar e as suas profundezas - a ponto de ser um dos poucos seres humanos a visitar, num submarino, a Fossa das Marianas, o ponto mais profundo do planeta -, Cameron volta no seu novo filme a insistir na mensagem ecológica que contribuiu para o sucesso de “Avatar”.

“Não acho que o objetivo destes filmes seja dizer o que tem que ser feito”, observa o cineasta. “Acho que qualquer um que estude as questões ambientais pode dizer. Sabe que tem que reduzir a sua pegada de carbono, não votar em idiotas, comprar um carro elétrico, consumir menos carne e laticínios…”

“Mas é possível influenciar os sentimentos das pessoas”, acrescenta. “O filme chama-te a sentir algo pela natureza, não só que chore no final ou que se emocione com as personagens. Trata-se de sentir indignação (...), de que as pessoas fiquem zangadas” a favor do meio ambiente.

“Isto desperta em nós essa ligação com a natureza. Ainda que, durante alguns minutos depois de terminar o filme, você veja o mundo de outra maneira”, concluiu.

TRAILER.