Produtor de cinema que se tornou motorista de ambulância voluntário, Yevhen Titarenko compareceu ao Festival de Berlim ao lado de outros cineastas ucranianos para mostrar a guerra filmada "por dentro" e denunciar a ofensiva russa iniciada há um ano.

"Na linha de frente não há passadeiras vermelhas, apenas um chão encharcado de sangue", disse recentemente o embaixador da Ucrânia na Alemanha, Oleksii Makeyev, ao apresentar o cinema do seu país.

O primeiro grande festival europeu do ano, que termina no próximo sábado, destacou a solidariedade aos produtores, idealizadores e artistas ucranianos com um programação de filmes e discussões sobre o país atingido pelos conflitos.

O próprio presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, fez uma aparição em vídeo na Berlinale na última quinta-feira, ocasião em que pediu ativismo com a arte e o cinema.

O ex-comediante é o protagonista do documentário dirigido pelo ator americano Sean Penn, que apresentou a produção no festival.

Na sexta-feira, 24 de fevereiro, quando se completa um ano da invasão russa, a passadeira vermelha da Berlinale receberá manifestações de apoio à Ucrânia.

"A guerra por dentro"

Yevhen Titarenko em "Eastern Front"

Entre os filmes ucranianos exibidos, "Eastern Front", de Yevhen Titarenko, retrata a vida de um paramédico perto da linha de frente.

Enquanto filmava um documentário no ano passado na região de Donetsk, o realizador de 34 anos tomou a decisão de se candidatar "como voluntário", contou à France-Presse (AFP).

Desde então, fez uma série de filmes "para mostrar às pessoas como é a guerra por dentro".

"Os ucranianos não querem fazer a guerra. Preferem fazer coisas normais, dedicar-se à cultura como em todos os outros países. Mas não temos escolha a não ser lutar", diz ele, cujo filme selecionado para o festival foi produzido com Vitaly Manskiy, documentarista russo que vive no exílio.

Alisa Kovalenko também trocou de papel após o início da ofensiva russa.

A cineasta de 35 anos interrompeu a produção de um documentário iniciado em 2018 sobre cinco adolescentes na região ucraniana do Donbass que faziam planos para o futuro antes da guerra.

Após quatro meses na linha de frente, onde fez parte das multidões de voluntários em Kiev e Kharkiv, a realizadora retomou o projeto e começou a editá-lo.

"Entendemos que precisávamos mudar tudo. É um filme completamente diferente" do previsto inicialmente, contou à AFP.

O documentário "We will not fade away" (2023), rodado entre 2019 e 2022, retrata as frágeis esperanças destas jovens da região de Luhansk, uma área sob controlo ucraniano atualmente sob intensa disputa.

Uma "luz" interior

We will not fade away

"A Rússia pode bombardear as nossas cidades e deixar-nos sem eletricidade (...) Se preservar a esperança e continuar a sonhar, terá sempre uma luz dentro de si. E essa luz, os russos não podem tirar de nós", disse Kovalenko.

Durante as filmagens, dois adolescentes que protagonizavam o filme deixaram a região e outros dois desapareceram, conta a realizadora.

Entre as outras produções ucranianas apresentadas estão "Do you love me?" (2023), uma ficção sobre uma adolescente no fim da União Soviética, e "In Ukraine" (2023), documentário sobre o quotidiano do país em guerra.

Além de "Iron butterflies" (2023), do cineasta Roman Liubyi, que conta a história do voo MH17 da Malaysia Airlines, derrubado em 2014 por separatistas do leste da Ucrânia, e como esse drama foi um prelúdio para o conflito atual.

Além do festival, os ministérios da Cultura da Alemanha, França e Luxemburgo lançaram um fundo europeu de 1,06 milhões de dólares para apoiar o cinema ucraniano em 2023.