A HISTÓRIA: O músico de metal Ruben começa a perder a audição. Quando um médico lhe diz que o seu estado vai piorar, ele pensa que a sua carreira e vida acabaram. A sua namorada Lou leva o ex-viciado a uma clínica de reabilitação para surdos na esperança de evitar uma recaída e ajudá-lo a adaptar-se à nova vida. Depois de ser acolhido e aceite como é, Ruben terá de escolher entre o seu novo normal e a vida que um dia conheceu.

"Som do Metal": disponível no Prime Video a partir de 4 de dezembro.


Crítica: Daniel Antero

O novo filme de Darius Marder é sobre a perda da audição, abrupta e sem retorno, de um músico que tinha encontrado na bateria uma âncora e o escape à toxicodependência.

De um momento para o outro, no meio de uma tour intensa com a sua namorada Lou (Olivia Cooke), Ruben (bruto e vulnerável Riz Ahmed) vê-se afastado da sua vida cacofónica, onde se movia “metronomicamente”, para ter de se estabelecer num processo de adaptação a algo completamente desconhecido: um mundo fluído de silêncio.

Com a audição a deteriorar-se a uma gravidade galopante, Ruben entra numa comunidade de apoio a pessoas com deficiências auditivas e dependentes em recuperação, onde toda uma estrutura de ensinamentos, hábitos e ações, colocam em causa o seu estado psíquico, propenso a resvalar ao vício que o assombrou até à quatro anos. Mas mais do que lutar contra as drogas, Ruben tem de enfrentar o vício da vida que está prestes a deixar.

Filme sensorial onde se assimila um estado físico e espiritual que contém forças e fraquezas distintas, "Som do Metal" não sensacionaliza ou extrapola para o melodrama. Mantendo-se num registo empático, de transcendência, faz-nos acompanhar o crescimento de Ruben, abrindo-nos as portas ao entendimento da surdez como identidade.

Para tal, para além de condenar aqueles que percecionam a surdez como algo corrigível através da aplicação de implantes cocleares (algo que traz um novo significado ao título original do filme), sugere que a salvação de Ruben reside na aprendizagem e processo, na conexão e na aceitação do silêncio e numa nova forma de comunicação.

Darius Marder, apoiado por uma poderosa interpretação de Riz Ahmed e pelo talento do designer de som Nicolas Becker, coloca este sentido de conexão e empatia noutro patamar: a banda sonora do filme projeta-nos regularmente para o ponto de escuta subjetivo de Ruben, partilhando connosco os sons abafados e as conversas ininteligíveis que ele experiencia, fechando-nos com ele.

Desde o portento sónico da sua banda, dos seus exercícios de pedal duplo e "blast-beats", até aos "glitches", silvos, drones, distorções e crepitações sonoras que os seus implantes cocleares produzem, alienamos-nos do mundo como o conhecemos e damos por nós também a sentir o desconforto, o poder do nosso próprio ser e consequentemente, a aprender a viver com a quietude.

Com o poder de uma câmara anecóica, que nos faz ouvir o interior, "Som do Metal" é um filme sobre uma alma inquieta forçada a encontrar paz. E é sobre apreciar o que damos como garantido. Como um ruído a que nos acostumamos e nos faz falta quando desaparece, ao terminar, "Som do Metal" não deixará silêncio. Deixará vazio.