A HISTÓRIA: Um ano após o misterioso desaparecimento da sua irmã Melanie, Clover e os seus amigos dirigem-se ao vale remoto onde ela desapareceu à procura de respostas. Ao explorarem um centro de visitantes abandonado, são perseguidos por um assassino mascarado e horrivelmente assassinados um por um... até acordarem e voltarem ao início da mesma noite. Presos no vale, são forçados a reviver a noite repetidamente, mas com uma ameaça assassina diferente, cada uma mais aterrorizante que a anterior. Cada vez com menos esperança, o grupo percebe que tem um número limitado de mortes e que a única maneira de escaparem é sobreviverem até ao amanhecer.

"Until Dawn": nos cinemas desde 24 de abril.


Crítica: Manuel São Bento
(Aprovado no Rotten Tomatoes. Membro de associações como OFCS, IFSC, OFTA. Veja mais no portfolio).

David F. Sandberg surgiu de rompante no género de terror em 2016 com "Lights Out - Terror na Escuridão", uma obra original que surpreendeu a nível narrativo, mas que impressionou sobretudo do ponto de vista técnico, graças à criatividade soberba do cineasta na construção de sequências de suspense, marcadas por um jogo de luzes imersivo e culminando em 'jumpscares' incrivelmente eficazes. A seguir, demonstrou que a sua estreia não foi um ato isolado de excelente cinema com "Annabelle 2: A Criação do Mal" e, após uma incursão mais inconsistente pelo mundo dos super-heróis, regressa agora ao género onde sempre brilhou com "Until Dawn".

Baseado no popular videojogo homónimo de 2015 da Supermassive Games, o filme chega ao grande ecrã com um argumento assinado por Gary Dauberman ("It") e Blair Butler ("O Convite"), contando com Ella Rubin ("Anora") no papel principal de Clover.

A história segue um grupo de amigos numa visita a um vale remoto em busca de respostas sobre o misterioso desaparecimento da irmã da protagonista. Em pouco tempo, o grupo vê-se apanhado num ciclo mortal, perseguido por forças sobrenaturais, mistérios do passado e monstros interiores que os vão matando um a um… até acordarem e voltarem ao início da mesma noite.

As expectativas não eram propriamente elevadas para "Until Dawn", mas a presença de Sandberg oferecia alguma esperança para um filme cuja premissa narrativa carregava imenso potencial. O resultado final é, acima de tudo, uma obra guiada por entretenimento puro, pensada para um público que procura adrenalina, sustos chocantes e um ambiente claustrofóbico, mais do que uma reflexão profunda sobre os temas introduzidos… o que não teria necessariamente problema, se a visão geral fosse mais consistente.

Começando pelas interpretações, o elenco cumpre os mínimos exigidos para o tipo de obra em causa, com interações básicas e uma química geral aceitável entre as personagens. Dito isto, seria injusto não destacar Rubin, que se encontra claramente num patamar superior aos seus colegas. A jovem atriz demonstra uma expressividade notável, mesmo em sequências onde o guião não lhe oferece o melhor material - bem pelo contrário. A sua prestação aguenta o filme nos momentos menos cativantes, funcionando como uma bóia que impede a obra de se afundar por completo.

A realização de Sandberg é, como esperado, o grande destaque de "Until Dawn". É, em última análise, a razão principal pela qual recomendamos a ida ao cinema a fãs do seu trabalho e do género em questão. É precisamente nas sequências imaginadas pelo cineasta que o filme encontra a sua identidade, através de mortes engenhosas, um ritmo vertiginoso e um uso criativo do espaço disponível e da (falta de) luz. A cinematografia de Maxime Alexandre (Come Play) aplica contrastes luminosos para intensificar a tensão das cenas, contribuindo para uma atmosfera imersiva, ainda que falhe ocasionalmente em perseguições passadas por territórios escuros de difícil perceção.

A última nota técnica vai para Benjamin Wallfisch ("Lobisomem") - tal como Alexandre, um colaborador frequente de Sandberg - que volta a demonstrar por que razão é um dos compositores mais requisitados do género. Sem cair na armadilha de muitas bandas sonoras de terror, Wallfisch contribui para tornar os sustos mais imprevisíveis, apesar de comuns, sendo que o controlo invejável do realizador sobre o tempo e a edição sonora consegue apanhar desprevenido até o fã mais experiente do género.

Todos estes pontos positivos não conseguem esconder o elo mais fraco da obra: o seu argumento. "Until Dawn" encontra-se marcado por diálogos banais, superficiais e repetitivos, para além da ausência de qualquer desenvolvimento palpável dos temas principais. Ainda que a exposição das "regras" do local onde decorre a ação seja decente, tudo o resto no texto revela uma falta de ambição algo preocupante. A mudança temática do jogo para o filme - passando do sentimento de culpa para o luto - tinha tudo para resultar, mas não é explorada com a profundidade necessária para provocar um impacto verdadeiramente memorável.

As personagens têm arcos vagamente delineados, com relações - nomeadamente de teor romântico - que surgem e desaparecem sem qualquer tipo de resolução ou consequência. Os últimos minutos são particularmente frustrantes: abruptos, sem momentos catárticos e com várias pontas soltas que desrespeitam o investimento do espetador ao longo de quase duas horas. Até a grande motivação inicial de "Until Dawn" - o desaparecimento da irmã - acaba por não ter um encerramento satisfatório, quase como se fosse esquecida juntamente com outros pormenores narrativos. À medida que a história se desenrola, Sandberg parece abandonar as ideias mais interessantes que lança para o grande ecrã, como a transformação dos monstros numa manifestação literal da dor e do trauma humano.

Ainda assim, não conseguimos negar que a obra cumpre o seu objetivo primário de entreter o público-alvo. A premissa mantém-se intrigante e a narrativa, ainda que linear, preserva o espírito de descoberta progressiva através de pistas e revelações, mantendo viva a essência do material original. Só é pena que o filme prefira quase sempre sacrificar oportunidades de aprofundamento em prol de mais ação, mas dificilmente deixará de satisfazer a audiência mais casual. Já os espetadores mais exigentes e/ou familiares com o jogo, poderão sentir um certo sabor amargo de potencial desperdiçado…

Em resumo, "Until Dawn" traz o material original para o cinema de forma competente, brilhando especialmente nos campos técnicos, nomeadamente na atmosfera misteriosa, mortes macabras, ritmo frenético e capacidade de manter o espetador envolvido até ao fim. A protagonista Ella Rubin destaca-se num elenco que cumpre os mínimos e David F. Sandberg prova, mais uma vez, ser um cineasta com visão, talento e criatividade para criar sequências de terror visualmente cativantes. No entanto, a fragilidade do argumento, a falta de coesão emocional e um desfecho apressado impedem a obra de atingir um nível de desfrutação mais duradouro. Entretém eficazmente, mas fugazmente.