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Depois de ter criado algum burburinho à custa da sua mixtape, “Nostalgia, Ultra”, de colaborações com Kanye West, Jay-Z ou Beyoncé e de se destacar ao lado dos Odd Future, Frank Ocean dá o maior passo da sua carreira até agora: “Channel Orange”, o aguardado álbum de estreia. Frank Ocean é, para muito boa gente, mais conhecido como o cantor/rapper que “saiu do armário” e assumiu que teve uma relação gay do que pela sua música. Essa revelação recente, que aparentemente poderia ter sido um tiro no pé, acabou por ter o efeiro oposto e foi bem aceite por muitos músicos, produtores e responsáveis de editoras dentro do meio hip-hop e periferias, territórios que muitos associam - muitas vezes, com razão - a mentalidades machistas. Embora a história de “Channel Orange” esteja muito ligada à confissão de Ocean, vamos centrar-nos apenas na música, até porque é de grande qualidade. Felizmente, parece ter chegado a hora de também ela sair do armário (ou seja, do meio mais circunscrito em que se inseria até aqui). “Channel Orange” é um álbum pouco convencional, que vagueia pela soul e o R&B, repleto de sintetizadores funk, com muitas influências jazz e uma sonoridade pop, sem ter refrãos orelhudos mas com muitas histórias para contar. A nível sonoro, é um disco leve e carregado de melodias. Ainda assim, as histórias que conta podem ser algo negras, numa luta entre o sagrado e o profano a que a soul já nos tem habituado. As baterias são pautadas por um registo midtempo e, algumas vezes, por momentos ainda mais calmos. Quando dizemos que “Channel Orange” é pouco convencional, não queremos sugerir que é de difícil audição, já que as melodias e a voz de Frank Ocean o tornam bastante acessível. É pouco convencional pelos arranjos, pelas camadas de sintetizadores psicadélicos e espaciais que nos fazem viajar entre géneros e influências - Stevie Wonder, Prince, Erykah Badu, D’Angelo ou N.E.R.D. são apenas algumas das que nos ocorrem ao longo do alinhamento. Liricamente, Frank Ocean é um contador de histórias. Fala-nos de amores, drogas, religião e sexo de uma forma invulgarmente empática. Embora algumas das histórias cantadas sejam fictícias, outras são baseadas na vivência do cantor - como “Crack Rock”, que aborda o crack do ponto de vista social, económico e político. Frank inspirou-se na vida do seu avô, que já foi viciado em drogas. Depois de uma primeira audição, há momentos que se impõem logo como destaque inevitável: “Sweet Life”, com um piano jazzy, um baixo funk e voz de Ocean - que varia entre o tenor e o falsete - faz-nos querer regressar ao disco. O já referido “Crack Rock” traz-nos uma bateria funk colada a um baixo soul, com uma certa toada trip-hop. Já “Pyramids” tem a honra de ser o melhor tema do disco. É o mais dinâmico, com o um início similar a “Miss Jackson”, dos Outkast, mas que rapidamente se enche de sintetizadores, de funk e um imenso perfume a Stevie Wonder. Épico, no mínimo, e não só pela duração que ronda os dez minutos. “Channel Orange” é uma grande estreia para Frank Ocean. Um álbum delicioso, carregado de beleza e com momentos brilhantes. Frank Ocean apresenta-se como um excelente contador de histórias, bastante ambicioso mas com uma sensibilidade à altura. O R&B já merecia um álbum assim e, por isso, o seu autor merece toda a atenção que lhe possamos dar. @Edson Vital<
Frank Ocean - "Swim Good" (single de "Nostalgia, Ultra"):
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