Numa altura em que regressos de artistas dos anos 1990 parecem estar na ordem do dia (os da década anterior não poderiam durar para sempre), um novo álbum dos Orbital não chega a ser dos episódios mais inesperados. Afinal, se o duo se tinha separado em 2004, quando nos deixou o seu sétimo disco, "Blue Album", voltou a juntar-se em 2009 para uma digressão que assinalou os seus vinte anos, editou uma compilação, "20" (também centrada no aniversário), e revelou dois inéditos, "Don't Stop Me"/"The Gun is Good", que deixaram no ar a hipótese de um próximo álbum.

"Wonky", editado há poucos dias, confirma essa suspeita e mesmo que possa ser, como ocorre com outros artistas, apenas um pretexto para mais uma série de concertos (até aqui muito bem sucedidos, sobretudo em terras de Sua Majestade), pelo menos é um ótimo pretexto.

Convenhamos que a banda não se tinha despedido no pico da sua forma. "The Altogether" (2001) e o já citado "Blue Album" (2004) estavam longe de ser maus discos mas também não pareciam (sobretudo o último) alargar muito o mundo dos Orbital, bem mais desafiante em álbuns como "Orbital 2" (1993), "In Sides" (1996) ou "The Middle of Nowhere" (1999), responsáveis pela entrada da dupla no panteão da música de dança da década de 90.

Videoclip de "New France" (com Zola Jesus):

Tal como os conterrâneos (e contemporâneos) Prodigy, Chemical Brothers, Leftfield ou Underworld, Phil e Paul Hartnoll foram protagonistas de uma história que começou nas raves antes de se transferir para os festivais. E se ao vivo a música dos Orbital pode funcionar tanto em pequena como em larga escala, a experiência caseira não é menos recompensadora. "Wonky" mostra-se um belo exemplo disso mesmo - não gera a surpresa de alguns dos primeiros discos da dupla, é certo, mas é um dos seus conjuntos de canções mais coesos.

Na faixa inicial, "One Big Moment", que arranca com samples vocais e sintetizadores atmosféricos antes de se atirar a ritmos mais frenéticos, percebemos logo que estamos num disco dos Orbital. Felizmente, essa sensação de reconhecimento, que marcava "Blue Album" quase do princípio ao fim, surge ao lado de um design sonoro que mostra um duo atento ao presente, integrando-o sem comprometer marcas de uma identidade já bem consolidada.

O tema seguinte, "Straight Sun", será talvez o melhor resultado desse equilíbrio, conjugando eletrónica contemplativa e dançável num mergulho techno cheio de camadas e viragens, mesmo mantendo uma estrutura circular. Entra diretamente para a lista de melhores temas dos Orbital e a sensação épica, "larger than life" (reforçada pelo videoclip), antevê um acesso de euforia generalizada ao vivo. Era para canções como esta que o rótulo new rave, tão enganador há um par de anos, deveria ter sido criado.

A rave, agora a antiga, volta a ser sugerida em "Stringly Acid", incursão acid house que não destoaria num clube londrino algures em inícios dos anos 1990. Quase acabou por passar por lá na altura, aliás, mas ficou guardada nas cassetes dos Hartnoll durante duas décadas até surgir, com texturas redesenhadas, entre os momentos mais hedonistas de "Wonky".

Também instrumentais, embora com samples de vozes femininas manipuladas, "Never" e "Distractions" marcam pontos em territórios mais oníricos e etéreos: o primeiro com uma pulsão dançável irresistível, o segundo com um contraste entre serenidade e tensão que caberia, por exemplo, em "There Is Love In You", do também britânico Four Tet (elogio).

Videoclip de "Straight Sun":

O contato dos Orbital com referências mais recentes dá-se também na pontual apropriação do dubstep, subgénero que agora parece estar um pouco por todo o lado, seja mais underground ou mainstream. Mas se em alguns casos poderá soar a oportunismo (alô Madonna?), faz sentido encontrá-lo em "Beelzedub" - por um lado porque não anda assim tão longe de domínios que a dupla já percorreu, por outro porque a amálgama de dubstep com ingredientes industriais e drum n' bass convence e dá-nos um dos momentos mais pujantes de "Wonky".

A faixa homónima do disco, e também uma das poucas cantadas, faz ainda mais estragos quando entrega o microfone a Lady Leshurr, espécie de resposta britânica a Nicki Minaj e protagonista de uma bizarria grime que, esta sim, não esperaríamos encontrar num álbum dos Orbital. Primeiro estranha-se, depois entranha-se, embora continue a deixar-nos a sensação de que faria mais sentido como single isolado do que no alinhamento de "Wonky".

No único outro tema cantado do disco, "New France", os Orbital convidam a norte-americana Zola Jesus, que de tanto repetir as mesmas frases aproxima a canção mais de uma remistura do que de um original - de uma remistura intensa e envolvente, ainda assim, tornando este no single que poderá apresentar o duo a novos públicos, começando pelos seguidores da norte-americana gótica. A obra passada de Phil e Paul Hartnoll bem merece e, coisa rara em muitos regressos, o novo capítulo de "Wonky" também.

@Gonçalo Sá