O álbum reúne interpretações, pelos dois músicos, em piano a quatro mãos, de canções diretamente relacionadas com a revolução, como “Grândola, vila morena”, e movimentos sociopolíticos da época, e resulta de um desafio do musicólogo Ruben de Carvalho, nos 30 anos do 25 de Abril.

A edição discográfica é acompanhada pelo texto da entrevista dada pelos dois pianistas, em maio de 2004, ao Diário de Notícias, na qual salientam o espírito de liberdade com que gravaram, permitindo que todos os temas fossem “rearranjados” pelos músicos.

O álbum foi gravado entre a hora de almoço e as quatro da manhã do dia seguinte, conta Laginha, acrescentando ter sido “como se fosse um disco de jazz à moda antiga”.

“Uma coisa que para nós era fundamental, e que desde o início sempre esteve subentendido, era conseguir pegar nos temas e transportá-los para o nosso universo musical com algum gozo e muita liberdade, muita abertura de espírito”, salientou Sassetti que remata: “Só podia ser assim, porque é precisamente de liberdade que nós estamos a falar, é isso que se celebra”.

O álbum é constituído por dez canções, abrindo com “Venham mais cinco”, de José Afonso, passando por “Canto Moço”, do mesmo compositor, “Los cuatro generales”, tema popular que fez parte da resistência republicana de Madrid na Guerra Civil espanhola de 1936, e a composição oitocentista norte-americana “Life on the Ocean Wave”, de Henry Russell.

Ruben de Carvalho, contam os músicos, deu-lhes dois CD com “vinte e tal” canções de todo o mundo, e “de alguma forma ligadas a revoluções e a movimentos de libertação”. A ideia era “se quisessem fazer umas citações”, mas como os dois não eram “apologistas das citações no meio dos temas”, preferiram, aos seis temas iniciais, acrescentar quatro.

Outra ideia de Ruben de Carvalho que aproveitaram foi a utilização de uma caixa metálica de música, de manivela, que reproduzia a “Internacional” e "até tinha o carimbo do PCP". “Fizemos o ‘take’ à primeira, com a caixinha e depois colocámos apenas uns efeitos de piano por cima”, afirmou Laginha ao jornalista João Miguel Tavares, na entrevista reproduzida agora na nova edição do disco. Para Sassetti, esta faixa era “uma lufada de ar fresco”, num disco que “todo ele é piano”.

Do grupo de canções escolhidas fazem também parte “Era um redondo vocábulo” e “Traz outro amigo também”, ambas de José Afonso, e a “Internacional”, de Pierre de Geyter, “We shall overcome”, de Charles Albert Tindley, que se tornou a canção do movimento dos Direitos Civis dos Negros nos Estados Unidos (1955-1968), e que ficou conhecida sobretudo pela interpretação de Pete Seeger.

Completa a lista “E depois dos adeus”, de José Calvário, que foi o primeiro sinal emitido pela rádio para as tropas saírem dos quartéis e dirigirem-se a Lisboa, para derrubar a ditadura e instaurar a democracia.

Sassetti conta na entrevista que, na ocasião, depois de gravarem, telefonou a José Calvário “a dizer-lhe que lhe tinha destruído a canção”. “Claro que isto é uma graça. Mas, harmonicamente, é de facto diferente”, esclarece o músico, que faleceu em maio de 2012, quase três anos após a morte de Calvário.

Sobre a memória que tinham do dia 25 de Abril de 1974, Sassetti, então com quatro anos, disse ser das poucas recordações que tinha da infância. "Não fazia a ideia do que se estava a passar, mas ver aquilo ao vivo era uma emoção". Laginha comemorava precisamente os seus 14 anos, e lembra-se de ter pensado que a Revolução lhe estragava a festa. "Mas entretanto tive um curso acelerado de política e, no outro dia, já andava pelas ruas, de 'V' em punho".

@Lusa