“Sou particularmente sensível a esse tema, é um tema relevante e não acompanho a ideia, que acho totalmente errada, de que não há produção musical portuguesa suficiente para cumprir as quotas determinadas pela lei. Agora é o momento de fazer uma reflexão ponderada e informada sobre qual deve ser a quota adequada em cada momento”, afirmou Pedro Adão e Silva aos jornalistas, em Lisboa, à margem da apresentação da primeira Bienal Cultura e Educação.
A quota mínima obrigatória de música portuguesa nas rádios entrou em vigor em 2009. Nessa altura foi estabelecida que seria de 25%. Entretanto, a 14 de janeiro de 2021, a então ministra da Cultura, Graça Fonseca, anunciou o aumento da quota para 30%, no âmbito das medidas de resposta à pandemia da COVID-19, com o objetivo de “incrementar a divulgação de música portuguesa” e “a sua valorização em benefício dos autores, artistas e produtores”. Este valor entrou em vigor em março de 2021.
Entretanto, em março de 2022 a quota mínima regressou aos 25%. A 9 de março, em resposta à agência Lusa, o Ministério da Cultura recordou que “a alteração do limiar mínimo de quotas de 25% para 30% ocorreu num contexto muito específico de pandemia”.
“Ultrapassado esse período, está em vigor a quota mínima de 25% de música portuguesa nas rádios nacionais, uma medida que se tem mostrado muito importante desde a sua criação, tanto assim que hoje, na generalidade das rádios, a utilização de música portuguesa tende a superar, por opção editorial, o valor da quota”, acrescentou.
Na quinta-feira, o ministro da Cultura revelou que, “para ter informação que permita tomar uma decisão”, sobre a manutenção ou alteração da quota mínima de música portuguesa nas rádios, solicitou “um conjunto de informação a várias entidades que são relevantes para esta matéria”.
“Primeiro às associações de rádios, sobre efetivamente qual foi o comportamento da receita publicitária e também das audiências durante o período em que vigorou a quota de 30%. [Mas também,] ao conjunto de entidades que gerem os direitos de autores e os direitos conexos, para saber de que forma é que os artistas portugueses foram remunerados no período em que a quota esteve nos 30%, porque esta discussão é uma discussão que interessa em particular porque tem efeitos também na remuneração dos artistas portugueses”, disse Pedro Adão e Silva.
Além disso, o ministro pediu ainda informações à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), “porque tem um papel fundamental”.
“Julgo que continuamos a falar neste assunto com informação anacrónica e com critérios anacrónicos. Há um conjunto de programas de rádio que estão isentos do cumprimento das quotas, porque são programas temáticos com géneros musicais onde alegadamente no passado não havia produção musical portuguesa suficiente para cumprir as respetivas quotas. Falo, por exemplo, do ‘hip-hop’ e do rap ou da música urbana, clássica e jazz. O que era verdade em 2006/2007 já não é verdade hoje. Há um nível de produção musical em vários géneros que não existia há cerca de 20 anos, e é preciso reavaliar se algumas rádios estão isentas de cumprimento da quota devem permanecer, e isso é responsabilidade da ERC”, disse.
Entretanto, mais de 3.500 pessoas assinaram uma petição online a pedir o aumento da quota mínima obrigatória de música portuguesa nas rádios para 30%. Lançada no início do mês por Rogério Charraz e José Fialho Gouveia, a petição contava, às 19h00 de quinta-feira, com 3.556 assinaturas, entre as quais se contam vários nomes de relevo no panorama da música nacional.
Fernando Tordo, Luísa Sobral, Rui Veloso, Dino D'Santiago, Teresa Salgueiro, Júlio Resende, Manuel Paulo, Cristina Branco, Luís Represas, Marco Rodrigues, Luís Trigacheiro, Selma Uamusse e Ricardo Ribeiro são alguns dos subscritores, que recordam o ministro de que o setor musical esteve praticamente parado em 2020 e 2021 e que, “pese embora 2022 tenha sido um ano de retoma da normalidade, de forma alguma conseguiu repor os rendimentos perdidos nesses dois anos”.
“Salientamos que a rádio tem uma grande importância na obtenção de receitas dos músicos, não só pelo facto de cada passagem gerar direitos de autor, mas também pela ligação direta que existe entre a exposição de um artista na rádio e a sua agenda de concertos ao vivo”, afirmam.
Para os artistas é “incompreensível e inaceitável” o momento escolhido para dar este sinal de desencorajamento da promoção da música portuguesa na rádio, e é ainda “mais estranho” de entender, quando o próprio ministério continua sem cumprir os prazos de pagamento do programa Garantir Cultura, “que visava precisamente mitigar os efeitos da pandemia num setor que se viu completamente congelado”.
A 14 de março, o Bloco de Esquerda apresentou uma proposta de alteração à lei para aumentar para 30% a quota mínima obrigatória de música portuguesa nas rádios, criticando o Governo por entender que se deve regressar a este limite mínimo.
“É ultrajante que o presidente da Associação Portuguesa de Radiodifusão venha dizer que não há música portuguesa boa o suficiente e é por isso que se justifica a diminuição da quota mínima de música portuguesa nas rádios portuguesas. O BE apresenta hoje um projeto de lei para que essa diminuição não seja possível por lei”, adiantou aos jornalistas a deputada bloquista Joana Mortágua em declarações no parlamento.
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