“Este disco é, de alguma forma, muito pessoal e ao mesmo tempo há uma crítica social muito grande, uma análise sobre a sociedade atual muito grande, daí o ‘Leve♀Escuro’”, referiu Sofia Marques (MEMA.), em entrevista à agência Lusa.

A artista lembrou que, tal como cada pessoa, no seu interior, tem “momentos mais leves, mais felizes, mais tranquilos, mais descansados” e “um lado mais escuro, mais sombrio, mais depressivo, mais difícil”, também “o espaço exterior, a vivência enquanto sociedade, percurso de cada um dentro da sociedade, acaba por ter essas duas vertentes”.

O título do álbum acaba por ser “quase uma brincadeira sobre o conceito do ‘chiaro/scuro’ [claro/escuro, em português] do Barroco, mais notório na pintura, em que há um enfoque muito grande em determinada parte do quadro, com muita luz, e o resto tudo à volta é escuro”.

“Acaba por ser um bocadinho o reflexo deste disco, essas duas vertentes, em que se calhar brilha mais o mais feliz, no entanto a parte densa também lá está”, referiu.

“Leve♀Escuro” é um álbum “muito feito no feminino”, embora conte com a participação de homens. “Mas a intenção era ser feito principalmente por mulheres, daí também o símbolo do feminino entre o ‘Leve’ e o ‘Escuro’, porque há uma energia feminina muito grande no mesmo”, disse, dando como exemplo o tema “Mulher”.

Essa canção foi escrita numa altura em que o Irão era palco de protestos desencadeados maioritariamente após a morte, em setembro passado, da jovem iraniana curda Mahsa Amini, de 22 anos, sob custódia policial depois de ser detida por alegado uso indevido do ‘hijab’ (véu islâmico).

“Inspirou-me a escrever essa letra, bem como todas as questões à volta de direitos da Mulher, do facto de haver ainda tanta desigualdade, tanta discriminação e tanta opressão, até sobre a liberdade no feminino”, partilhou.

Além de “todas estas vertentes”, em “Leve♀Escuro” MEMA. fala também de solidão, num mundo que é “tão barulhento, no sentido de se estar sempre conectado com toda a gente, através de redes sociais, telefone, internet”.

“Estamos sempre a ser bombardeados com informação. E parece que, apesar de termos tanta gente à nossa volta, sentimo-nos profundamente sós. Achei interessante também abordar todos esses temas neste disco, porque de certa forma também são coisas pelas quais eu passei, ou passo, que sinto na pele, e também observo”, referiu.

Sofia Marques, de 32 anos, descreve MEMA. como um projeto “quase sem barreiras, a nível musical”.

“No entanto, consigo dizer que a música pop e a eletrónica mais alternativa são os principais motores deste projeto. De forma mais regular ou mais consistente, a indie pop e a eletrónica são os géneros mais presentes”, disse.

A ligação de Sofia Marques à música começou “muito cedo”. Aos 5, 6 anos começou a aprender música e o gosto de escrever e criar temas surgiu por volta dos 12 anos, a mesma altura em que trocou o órgão pela guitarra.

Depois de ter feito parte de alguns projetos, decidiu aventurar-se a solo enquanto MEMA., tendo editado um EP, “Cidade de Sal”, em 2020.

Este projeto surgiu “de uma saudade de fazer música” e de se “expressar muito grande”. “Comecei a sentir mesmo necessidade de pôr muita coisa cá para fora e a música acabou por ser quase uma escapatória para esses sentimentos”, partilhou.

“No EP foi tudo feito por mim, quer a produção quer a escrita. No álbum foi importante para mim colaborar. Não foi fácil de fazer, mas tive a sorte de ter amigos com quem trabalhei: Luís Água, Elizabet Oliveira, Mariana Vidal Barros, Francesco Meoli, Hugo Grave, Ruby Smith, Katie Tavini e Rúben Marques”, contou.

MEMA. conheceu Ruby Smith e Kate Taviny “através de um grupo de mulheres e pessoas não binárias, a comunidade 2% cent rising, que tenta equilibrar a balança dentro da indústria musical”.

“Leve♀Escuro” é uma edição de autor e a música não é a única atividade de Sofia Marques. “É muito difícil viver da música, principalmente enquanto artista independente - somos muitos independentes a fazer música, o que é muito positivo, mas as oportunidades que existem em Portugal são poucas para tanta gente”, referiu, explicando que trabalha também como “‘community manager’, numa empresa de ‘software’”, e já trabalhou como ‘freelancer’ na área de Marketing”.

O álbum de estreia de MEMA. é apresentado em 27 de abril no Teatro Aveirense, em Aveiro, e em 05 de maio no Musicbox, em Lisboa.

Em palco, estará acompanhada de Aidan Nóbrega na bateria e Ana Ribeiro (Momma T na guitarra), fazendo com que os temas “ganhem uma vida” que sozinha não lhes conseguiria dar.