Rita Lee, considerada uma das maiores cantoras e compositoras da história do Brasil, morreu na noite de segunda-feira, 8 de maio, aos 75 anos. Em 2021, a cantora foi diagnosticada com cancro do pulmão.
A notícia foi confirmada na manhã desta terça-feira, através de um comunicado partilhado nas redes sociais oficiais da cantora e do seu marido, Roberto de Carvalho: "Comunicamos o falecimento de Rita Lee, em sua residência, em São Paulo, capital, no final da noite de ontem, cercada de todo o amor de sua família, como sempre desejou".
O velório está marcado para esta quarta-feira (10), das 10h00 às 17h00 (hora local). "De acordo com a vontade de Rita, o seu corpo será cremado. A cerimónia será particular. Nesse momento de profunda tristeza, a família agradece o carinho e o amor de todos", concluiu o comunicado.
Na sua edição online, a Folha de São Paulo recorda um texto da cantora sobre a morte. "Quando morrer, posso imaginar as palavras de carinho de quem me detesta. Algumas rádios tocarão minhas músicas sem cobrar 'jabá'. Fãs, esses sinceros, empunharão os meus discos e entoarão ‘Ovelha Negra’, as TVs já devem ter na manga um resumo da minha trajetória. Nas redes virtuais, alguns dirão: ‘Ué, pensei que a 'véia' já tivesse morrido [risos]", escreveu a artista na sua autobiografia.
Rita Lee, apelidada como a 'rainha do rock brasileiro', é conhecida por temas como "Ovelha Negra", "Mania de Você", "Lança Perfume", "Agora Só Falta Você", "Baila Comigo", "Banho de Espuma", "Desculpe o Auê", "Erva Venenosa", "Amor e Sexo", "Reza", "Menino bonito" , "Flagra" e "Doce vampiro".
Sempre à frente do seu tempo, a artista era considerada uma referência da criatividade e da independência feminina. O título de "rainha do rock brasileiro" chegou quase no início da sua carreira, mas a cantora achava-o "ridículo" - preferia ser tratada como a "padroeira da liberdade".
Rita Lee Jones nasceu em São Paulo, a 31 de dezembro de 1947. O pai, Charles Jones, era dentista e filho de imigrantes dos Estados Unidos. A mãe, a italiana Romilda Padula, era pianista, e foi quem incentivou a filha a aprender música.
Aos 16 anos, a brasileira juntou-se ao trio Teenage Singers, e realizou vários concertos em festas de escolas. Nas pequenas atuações, o cantor e produtor Tony Campello descobriu as cantoras e convidou-as para gravações como backing vocals.
Já em 1964, Rita Lee juntou-se ao grupo Six Sided Rockers que, depois de algumas mudanças na formações, deu origem aos Mutantes. O fim da sua relação com Arnaldo Baptista coincidiu com a saída da artista da banda.
Depois dos Mutantes, a artista juntou-se ao grupo Tutti Frutti, tendo gravado cinco álbuns, com destaque para “Fruto proibido”, de 1975.
Em 1979, a cantora editou o seu primeiro álbum a solo "Build up", ainda antes de abandonar o grupo. Rita Lee também editou "Hoje é o Primeiro Dia do Resto da Sua Vida", em 1972, ainda gravado com a banda.
Ao longo da carreira a solo, a artista editou vários álbuns que se tornaram referências da música brasileira, como "Rita Lee" (1979), "Saúde" (1981) e "Rita e Roberto" (1985), que foi apresentado no palco da primeira edição do Rock in Rio, no Rio de Janeiro.
"Reza", de 2012, foi o último álbum de canções inéditas lançado pela artista. No total, ao longo da carreira, Rita Lee editou 40 álbuns, sendo seis com os Mutantes e 34 na carreira solo.
Em 2001, Rita Lee conquistou o Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa com “3001”. Já em 2022, a artista foi homenageada com o galardão de Excelência Musical.
Em outubro de 2008, a revista Rolling Stone destacou a cantora na Lista dos 100 Maiores Artistas da Música Brasileira.
Em 2016, a cantora publicou uma autobiografia onde abordou os excessos, a relação com a família, os tempos da ditadura e a vida em palco. Em Portugal, obra contou com com prefácio de Rui Reininho.
Editado no Brasil em 2016, o livro acompanha o crescimento e envelhecimento de uma das figuras do rock brasileiro, com referências à censura no Brasil, uma passagem pela prisão, a vida na estrada com os Mutantes - um dos maiores grupos de rock psicadélico nascidos no Brasil -, a carreira a solo e o ativismo em defesa dos animais.
"'Uma autobiografia' é a biografia de um Brasil que conhece transformações rapidíssimas, que vê crescer Brasília e os militares repressores no poder, a cornucópia canavalesca e a censura, o talento inato de um povão para a música, o ritmo no improviso, na composição, na cachaça e na champa, no mito e na capoeira, no futebol e no chop!", exclamou Rui Reininho, dos GNR, no prefácio.
Entre as dezenas de curtos episódios relatados, quase sem referências a datas, Rita Lee recorda uma das primeiras passagens por Portugal, quando os Mutantes deram um concerto no Teatro Villaret, em Lisboa, na primeira parte de uma atuação de Edu Lobo.
"A nossa apresentação até que rolou legal, apesar de o público português pensar que éramos argentinos", recordou Rita Lee, acrescentando que no final do concerto cortaram os cabos de eletricidade, boicotando a atuação de Edu Lobo.
No livro, Rita Lee, sem pudores e de forma direta, relata um episódio de violação na infância, fala abertamente do consumo de drogas e do relacionamento duradouro com o companheiro de vida, Roberto Carvalho.
"Não faço a Madalena arrependida com discursinho antidrogas, não me culpo por ter entrado em muitas, eu me orgulho de ter saído de todas. Reconheço que as minhas melhores músicas foram compostas em estado alterado, as piores também", escreve no livro.
Ao sabor da memória, a artista escreve que "o altar do palco é viciante, o lugar mais seguro para se viver perigosamente", admite ser muito autocrítica em relação ao talento vocal, mas recorda o dia em que João Gilberto lhe disse que a voz dela era "bossanoveira".
No final, a autora até imagina o que vai acontecer quando morrer - "nenhum político se atreverá a comparecer ao meu velório" - e deixa o seu próprio epitáfio: "Ela nunca foi um bom exemplo, mas era gente boa".
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