O encenador suíço, considerado pela imprensa como um dos nomes mais controversos da atualidade no teatro, leva ao Porto uma colaboração com a companhia Theater Hora, composta por atores portadores de trissomia 21, num trabalho a partir do romance do Marquês de Sade, escrito no século XVIII, e vagamente inspirado no filme “Salò ou os 120 dias de Sodoma”, de Pier Paolo Pasolini.
A estética do realizador italiano é transportada para o teatro pela produção suíça, com a história de decadência moral e física, de natureza ritualística e sexual, trazida para os dias que correm por Rau, que olha para o poder, o sexo e a violência neste espetáculo.
A polémica parece seguir Milo Rau desde os primeiros espetáculos, com “The Last Hours of Elena and Nicolae Ceausescu” a valer-lhe um processo judicial, tendo sido impedido de entrar na Rússia em 2013, quando encenou uma peça em torno das Pussy Riot em “The Moscow Trials”.
“The Congo Tribunal” (2015), sobre o genocídio na República Democrática do Congo, levou a demissões naquele estado africano, e “Five Easy Pieces”, que aborda a história do pedófilo Marc Dutroux e conta com um elenco de crianças, esteve no Porto e em Lisboa em 2017.
O teste do que é “representável e suportável” no teatro, reflete a apresentação do espetáculo, pelo Teatro Municipal do Porto, tem agora continuidade em “Os 120 Dias de Sodoma”, em que o encenador nascido em Berna, em 1977, partiu da dramaturgia de Gwendolyne Melchinger.
Ao olhar também para o preconceito, não só através do elenco com que colabora, temas como a dignidade da vida humana numa sociedade pós-moderna e questões como o desejo, a vergonha, o medo e a normalidade são interligados.
Na apresentação da programação dos primeiros meses de 2019 estava já destacada esta “viagem histórica pela mão de Milo Rau, através de Sade e Pasolini, naquela que é uma crítica constante aos poderes instalados e aos seus abusos”.
Com um elenco vasto da companhia Theater Hora e ao longo de duas horas, a peça falada em alemão e legendada em português propõe perguntas em vez de dar respostas: “qual é o significado do poder? O que é voyeurismo? Como proteger a dignidade da vida? O que é o normal, o que é o anormal?”.
Antigo sociólogo e jornalista, o encenador desta versão de “Sodoma”, estreada em Zurique em 2017, tem dividido o tempo entre a cena, por que tem sido premiado e um dos mais requisitados autores, e a academia, em que tem proferido palestras ou escrito artigos sobre teoria cultural e teatro.
Fundou a companhia de teatro e cinema International Institute of Political Murder em 2007, em que produziu as primeiras peças que lhe deram projeção internacional, tornando-se diretor artístico do teatro NT Gent, na Bélgica, em 2018.
O New York Times destacou o cariz polémico do seu trabalho e o alemão Der Freitag chamou-o “o mais controverso encenador da sua geração”, tendo sido premiado várias vezes ao longo da carreira, incluindo com o Prémio de Teatro da Suíça, em 2014.
“Os 120 Dias de Sodoma” sobem ao grande auditório do Teatro Municipal Rivoli, no Porto, pelas 21:00 de dia 07 e 08 de março, sendo que Ana Dora Borges organiza uma oficina em torno do espetáculo, no sábado, pelas 15:00, refletindo sobre a escolha do elenco.
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