A mulher de Vidiadhar Surajprasad Naipaul, Nadira Naipaul, anunciou que o escritor "morreu rodeado por aqueles que amava, depois de ter vivido uma vida recheada de criatividade e propósito".
Naipaul foi agraciado com o Nobel da Literatura em 2001 por ter “uma narrativa percetiva unida e um escrutínio incorruptível em trabalhos que nos obrigam a reparar na presença de histórias reprimidas”.
Com uma carreira que abarcou meio século, o escritor viajou, numa descrição do próprio citada pela Associated Press (AP), como um “colonial descalço” da rural ilha de Trinidad (Trindade e Tobago) para a classe alta inglesa, conquistando os mais cobiçados prémios literários e um título de nobreza (foi ordenado cavaleiro), sendo elogiado como um dos maiores escritores ingleses do século XX.
Entre as suas obras mais aclamadas estão os romances, traduzidos em português, “A Curva do Rio” ou “Uma Casa para Mr. Biswas”, sendo ainda autor de “Uma Vida pela Metade”, “Num Estado Livre”, “A Máscara de África” ou “Para Além da Crença”, entre dezenas de outros.
A sua obra explorava o colonialismo e a descolonização, o exílio e as lutas do homem comum num mundo em desenvolvimento – temas que ecoam as suas origens e a sua trajetória.
Apesar de a sua escrita ser amplamente elogiada pela compaixão em relação aos mais pobres e aos deslocados, Naipaul ofendeu muitas pessoas com o seu comportamento arrogante e piadas sobre antigos súbditos do império britânico.
A AP recorda quando apelidou a Índia de “sociedade de escravos”, gracejou que a África não tem futuro e explicou que as mulheres indianas usam um ponto vermelho na testa para dizer: “a minha cabeça é vazia”.
Em 1989 Naipaul riu-se da 'fatwa' (decreto religioso islâmico) contra Salman Rushdie, também escritor britânico, também de ascendência indiana, dizendo que era “uma forma extrema de crítica literária”.
Outro caribenho laureado com o Nobel da Literatura, Derek Walcott, criticou que a prosa de V. S. Naipaul ficava manchada pela sua “repulsão em relação aos negros”.
O escritor de Trinidad C.L.R. James disse-o de outra forma, escrevendo que os pontos de vista de Naipaul refletiam simplesmente “o que os brancos queriam dizer, mas não se atreviam”.
Vidiadhar Surajprasad Naipaul – Vidia, para os que o conheciam de perto – nasceu a 17 de agosto de 1932, na ilha de Trinidad, descendente de indianos empobrecidos embarcados para as Índias Ocidentais como trabalhadores em regime de semi-escravatura.
O seu pai era um aspirante a romancista autodidata cujas ambições foram destruídas por falta de oportunidades.
O filho estava determinado a deixar a sua terra natal o mais cedo possível, e anos mais tarde referiu-se repetidamente ao lugar onde nasceu como pouco mais do que uma plantação.
Em 1950, Naipaul ganhou uma das poucas bolsas de estudo do Governo para estudar em Inglaterra e deixou para trás a sua família para iniciar estudos de Literatura Inglesa na University College, Oxford.
Foi lá que conheceu a sua primeira mulher, Patricia Hale, com quem casou em 1955.
Depois de se diplomar, Naipaul passou por um período de dificuldades financeiras e apesar da sua educação em Oxford, viu-se rodeado por um ambiente hostil e xenófobo em Londres, tendo escrito numa carta à sua mulher: “esta gente quer quebrar-me o espírito… querem que saiba qual é o meu lugar”.
A estreia literária aconteceu em 1957, com o livro “The Mystic Masseur”, um livro com humor sobre a vida das pessoas pobres de um gueto em Trinidad.
Em 1959 conquistou o Somerset Maugham Award com a coleção de contos “Miguel Street” e em 1961 publicou aquele que a crítica considerou uma obra-prima, “Uma Casa para Mr. Biswas”, e que prestou tributo ao seu pai, contando a história de um homem com uma vida restringida pelos limites de uma sociedade colonial.
Seguiram-se outros prémios, o título de nobreza de Cavaleiro em 1990 e o Prémio Nobel da Literatura em 2001.
A AP recorda que à medida que crescia o seu prestígio literário crescia também a sua reputação de homem difícil com personalidade irascível, sendo descrito como um homem reservado que não tinha muitos amigos.
Um dos poucos, o escritor norte-americano Paul Theroux, e de quem acabaria por se afastar, tendo o americano em 1998 descrito Naipaul numa biografia como “racista, sexista, que fazia birras terríveis e batia em mulheres”.
Apesar de ter ignorado o livro de Theroux, acabaria por autorizar em 2008 uma outra biografia onde admitia alguns dos factos relatados pelo americano e confessava que acreditava que a sua confissão de recorrer a prostitutas tinha contribuído para a morte da sua primeira mulher, que morreu de cancro de mama em 1996.
Dois meses depois da morte de Patricia Hale casou com a sua segunda mulher, Nadira Alvi, depois Nadira Naipaul, uma colunista paquistanesa.
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