“O mundo e a minha nação estão a derivar para tornar o que é inaceitável, a norma”, afirmou Wole Soyinka, em Óbidos, no Folio – Festival Literário Internacional de Óbidos, considerando que o seu país natal, a Nigéria, é apenas “parte de uma praga global”.

Aludindo às agressões que dizimaram populações no Quénia ou na Somália, à “agressão truculenta” perpetrada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, sobre a Ucrânia, ou à vaga de violência no Irão desencadeada pela morte de Mahsa Amini, o Prémio Nobel da Literatura (1986) considerou que a Humanidade está a chegar a “um nível de degradação da existência muito difícil de aceitar”.

“O que se passa no Irão não é aceitável”, disse, sustentando que “as mulheres não deviam ter que lutar” pelo direito de não usar véu e criticando os regimes militares que criam divisões entre muçulmanos e, noutras parte do mundo, os populismos que levam ao aumento dos movimentos nacionalistas.

Recusando assumir-se como “pessimista”, o escritor nigeriano admitiu ter sido esta “desintegração” que o levou a voltar ao romance cerca de 50 anos depois de ter escrito o seu primeiro livro deste género, derivando depois para a escrita de peças de teatro, já que mais do que escritor se assume como um dramaturgo.

Orador numa mesa do Folio – Festival Literário Internacional de Óbidos, Wole Soyinka lembrou a infância de onde lhe vem o amor pelos livros, lamentando que “algumas crianças, em muitos lugares do mundo, não tenham direito à inocência, especialmente nos tempos que correm”.

O Nobel que no seu romance “Crónicas dos lugares do Povo mais feliz da terra” faz um retrato implacável do seu país natal, partilhou com o público do Folio recordações dos “27 meses de prisão, 22 dos quais na solitária” a que foi submetido em 1967, durante a Guerra Civil da Nigéria.

Da prisão saiu “azedo” e “revoltado” com o que considerou serem acusações falsas que levaram à sua detenção, mas, lembrou, “depois de o governo ser derrubado, o próprio chefe do governo encetou esforços no sentido de me contactar e pediu desculpa”.

“Agora somos bons amigos, ele explicou o que se tinha passado e enterrei o assunto”, disse.

No que toca a amigos, Wole Soyinka recordou que foi o fado que lhe pôs no caminho outra amiga: a portuguesa Amália Rodrigues.

O escritor, que encontrou numa loja um disco de Amália, escreveu à fadista um poema intitulado “Fado Singer”.

Anos depois, numa conferência em que encontrou Mário Soares, perguntou-lhe se conhecia Amália e acabou por ser o antigo Presidente da República a apresentar a fadista ao Nobel, dizendo “este é o homem que te escreveu um poema”.

A mesa com a participação de Wole Soyinka foi a última da programação de sábado no Folio, festival que termina hoje, depois de 11 dias de eventos protagonizados por cerca de 300 autores de dez países.

Ao longo destes dias, a programação integrou 16 exposições, 36 concertos, 14 mesas de autores, 62 apresentações e lançamentos de livros, 16 oficinas, ao que se juntaram tertúlias, workshops e masterclasses e sessões de cinema, entre muitas outras iniciativas.

O Festival Literário Internacional de Óbidos teve a sua primeira edição em 2015 e desenvolve-se em seis capítulos: Autores, Educa, Ilustra, Mais, BD e Boémia.

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