Ontem, os Primitive Reason subiram ao palco do Cinema São Jorge para celebrar com fãs e amigos os vinte anos que passaram desde a sua formação, em Cascais. Considerados por muitos os predecessores de bandas como Da Weasel, Blasted Mechanism ou Orelha Negra, os cascalenses não desapontaram e trouxeram com eles alguns convidados.

Bandas que durem vinte anos, merecem sempre um aplauso mais forte. Quando são portuguesas e o fazem com inúmeras dificuldades, traçam um caminho no estrangeiro e têm um álbum financiado por crowdfunding, ainda mais. Não sabíamos o que esperar ao certo desta banda de fusão mas rendemo-nos à loucura que se instalou na sala de espetáculos lisboeta.

O Coro Juvenil da Academia de Música de Óbidos foi o primeiro a subir ao palco para uma homenagem ao grupo português. Quando terminaram, sob uma chuva de aplausos, a banda tomou as posições mas houve ainda tempo para uma gargalhada descontraída com o tropeção de Guillermo a chegar ao palco.

Quando pela primeira vez, o vocalista dirigiu a palavra ao público – depois de ter trocado o didgeridoo pelo microfone - já metade da audiência estava de pé enquanto a outra metade se abanava, freneticamente, nas cadeiras. «É um prazer estar aqui hoje, vinte anos depois».

Depois de “Know No Regrets”, os primeiros convidados subiram ao palco: Sérgio, carinhosamente chamado de Serginho, e Dé. O primeiro veio acelerar o concerto com o seu rap e o segundo dar, como se possível, ainda mais ritmo puxando pelo público. Poderia ser comparado a Dub Inc. e do tom mais transe passámos a um reggae acelerado a pedir mais saltos e passos de dança.

Pediram para que se apagassem as luzes do palco para que pudessem ver o público, e tocaram mais uma do novo álbum, “Power to the People”, antes de chamarem Nuno Gomes ao palco. Abel levantava os braços pedindo para que, quem ainda se abanava nas cadeiras, se erguesse e rendesse ao ritmo. Muitos saltos, mãos no ar, agradecimentos e parabéns. “Higher Needs”, So You Say” e Nuno Gomes de volta ao palco, desta vez, para dividir “Object” com os cascalenses.

Entre saltos, passeios pela primeira fila, passos de danças tresloucados, viajámos em diversas sonoridades, olhámos quem sabia as letras de cor e aplaudimos. Headbanging, assobios e uma  participação de Nel em “Beat Down” e “Sage” depois e o cansaço já começava a notar-se. Guillermo suado ouvia gritos de “És mesmo bom!” e Abel eléctrico não parava de dançar e brincar com os outros músicos. A banda saiu e Ana tomou o palco. Numa versão mais soft, e num tom bastante mais indie, as vozes de Ana e Guillermo harmonizaram-se na perfeição em “Weakness”. Seria depois vez de Joana, acompanhada de Sérgio, subir ao palco e nos deslumbrar em “Dust”. Sorrisos no rosto, uma sensação de trabalho bem feito, uma química inexplicável e um à vontade divertido passava do palco para o público dançante.

Entre inglês, castelhano, português, de tudo um pouco e em diversos estilos musicais diferentes, o espetáculo aproximava-se do final.
Mas ainda houve tempo para mais convidados. “E agora gostaria vou chamar a Marta ao palco”, disse Abel. “Eu vou buscar a Marta”, acrescentou Guillermo. Depois de esta interpretar “Seven Fingered Friend”, uma das mais aplaudidas da noite, Guillermo deixou o palco à mercê de James – “ele mostra-vos como se faz centerstage”. Joana acompanhou-o nas teclas. Tempo para um momento mais emocional, no qual Abel agradeceu a oportunidade e admitiu nunca ter sonhado estar ali no palco com os amigos que havia conhecido em Cascais.

Antes de voltarem para o encore, o público divide-se entre cantar os parabéns e gritar “Primitive”. “Vamos partir esta cena toda?”, pergunta James, regressando com a banda,a Guillermo. O vocalista pede a todos que façam um “moche severo” e que invadam o palco – o que, por motivos de segurança, não aconteceu. Mas a intenção estava lá. “Born from Fear”, a mais metaleira do alinhamento, fechou a chave de ouro um espetáculo que, mais do que um concerto, foi uma celebração, uma consagração e um serão com amigos.

Com um estilo particular, a banda levou-nos do reggae ao rapcore, do metal ao punk rock, passando por diversos idiomas e sorrindo, sempre. A verdade é que hoje faz sol mas nós ainda trazíamos o calor do reencontro de ontem.

Fotos: Ana Rita Santos
Texto: Raquel Cordeiro