Cá fora chovia. Não havia estrelas no céu. Mas já diz (mais ou menos) o ditado que dia molhado, concerto abençoado. E assim foi. O Coliseu do Porto encheu-se de emoção para receber um filho da casa que há muito é pai do rock português.

“Não dá para falar muito. ‘Tá tudo ali a ver”, diz Rui Veloso a Berg e Alexandre Manaia que o acompanham nestes concertos acústicos. Os três conversam animadamente. Só se ouvem as vozes e os risos. As cortinas continuam fechadas e as luzes apagadas.

“Vão divertir-se... E podem gravar e fotografar tudo à vontade”, diz Rui Veloso no momento em que se abrem as cortinas e se vê o trio numa sala de estar improvisada, mas sem precisar da intervenção do ‘Querido Mudei a Casa”.

Da sala correm para o centro do palco e logo começam a soar os primeiros acordes de “A gente não lê”. Segue-se “Cavaleiro andante” com gente encharcada a chegar porque, provavelmente, se atrasou a validar o andante do metro.

O Coliseu sabe as letras na ponta da língua. Uns cantam mais, outros emocionam-se e renovam juras de amor. Alguém menos tímido (e com voz a lembrar a Júlia Pinheiro) grita “Berg és lindo” - ganhar o Factor X tem destas coisas. “Já começa?”, pergunta Rui Veloso arrancando risos que vão sendo embalados com os primeiros acordes da “Gargantilha”.

O Coliseu ia aquecendo sem lenha para arder, só com as paixões ardentes em cada par de cadeiras. Mas também se ia vendo a solidão de alguns que se abraçavam aos casacos, como quem abraça uma almofada a pensar na cara metade. A pensar nesses casos e no S.Pedro (que não parava de chorar), o trio cantou “Canção de Alterne” numa versão mais mexida que animou a plateia.

E os grandes êxitos iam desfilando. O público com as vozes afinadas, apesar de algumas constipações fruto da primavera ranhosa. Mas até para isso o pai do rock deixou a solução: “Chá de casca de cebola, faz muito bem à voz, faz faz!”

Sempre bem disposto Rui Veloso ia falando das músicas e arrancando gargalhadas.“Esta é de 1980. Txi. Já nem me lembro. Quer dizer, lembro-me do tema, não me lembro é de o estar a gravar. Tem o título mais cumprido da música portuguesa. Chama-se “Ai quem me dera a mim rolar contigo num palheiro”. 

Os corações dos casais sorriam. E na primeira fila, um casal muito especial, pois é graças a ele que hoje há romances que nascem ao som de “Anel de Rubi” ou “Primeiro Beijo”. O casal são os  pais do Rui Veloso, que é como quem diz os avós do rock português. 

Músicas que passaram na rádio, outras que ficaram só pelos discos iam servindo de banda sonora para beijos, abraços e selfies. Mas rapidamente o público mudou da câmara frontal dos smartphones para a câmara externa. Tudo porque o trio começou a cantar “Porto Côvo” e todos quiserem certamente partilhar aquele momento no instagram digno de hashtags emblemáticas como #amazing #top e #like.

Para muitos são músicas românticas clichés, para outros hinos do amor. A verdade é que todas marcaram presença no Coliseu do Porto. O amor esteve nos acordes e saiu nos corações de todos. Para uns foi o renovar da paixão, para outros a confirmação que Rui Veloso dá “likes” no instagram daqui até à China.

Texto@Tiago Presley | Fotos@Denise Ribeiro