A caminho dos
Óscares 2025
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"Emília Pérez", o narcomusical em castelhano sobre a transição de género de um traficante de drogas mexicano, foi o grande vencedor da 50.ª cerimónia dos prémios César, entregues na sexta-feira à noite em Paris.
Nas últimas semanas, a pergunta era qual seria o impacto sobre os 4.951 eleitores dos "Óscares Franceses" da polémica no México sobre a forma como o filme de Jacques Audiard representa a violência ligada ao tráfico de drogas, agravada por mensagens antigas controversas nas redes sociais sobre vários temas políticos e sociais da atriz principal, Karla Sofía Gascón.
A resposta foram sete Césars em 12 nomeações: Melhor Filme, Realização, Argumento Adaptado, Fotografia, Som, Banda Sonora e Efeitos Visuais.
Montagem, Guarda-Roupa e Direção Artística foram as categorias que perdeu, além de Melhor Atriz, onde estavam nomeadas tanto Karla Sofía Gascón como Zoe Saldaña, que estiveram na cerimónia e não posaram juntas, ganho pela atriz e realizadora francesa-tunisiana Hafsia Herzi, por “Borgo”, de Stéphane Demoustier, pelo papel de uma guarda prisional acusada de cumplicidade num duplo homicídio na Córsega.
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Este é o terceiro filme de Audiard, de 72 anos, a conquistar o troféu máximo do cinema francês, após "De Tanto Bater o Meu Coração Parou" (2005) e "Um Profeta" (2009).
Enquanto realizador, conquistou o troféu também por esses filmes e ainda "Os Irmãos Sisters" (2018) e agora "Emília Pérez", ficando a um de igualar Roman Polanski, o recordista na categoria.
No domingo à noite decorre a 97.ª cerimónia dos Óscares, onde o filme conta com um número recorde de 13 nomeações, entre elas para Karla Sofía Gascón, que fez história ao ser a primeira atriz transgénero nomeada numa categoria de interpretação.
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A gala apresentada pelo 'rapper', realizador e ator Jean-Pascal Zadi, conhecido pelos seus papéis cómicos, aconteceu na noite de sexta-feira na L'Olympia, a mais antiga sala de espetáculos musicais de Paris, foi presidida pela atriz francesa Catherine Deneuve, que tem evitado a cerimónia nos últimos anos, mas concordou em participar neste aniversário especial dos 50 anos dos Césars.
“Declaro aberta a 50ª cerimónia do César e dedico-a à Ucrânia“, disse em palco a lenda do cinema, Catherine Deneuve, que tinha no peito um crachá com a bandeira ucraniana, num momento de especial tensão nas negociações de paz para o país invadido desde há três anos pela Rússia.
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O musical mexicano ofuscou os dois favoritos da noite, “O Conde de Monte Cristo”, de Matthieu Delaporte e Alexandre De La Patellière (14 nomeações, dois prémios em categorias técnicas), e “Corações Partidos”, de Gilles Lellouche (13 nomeações, um prémio), que acumularam mais de 14 milhões de espectadores e simbolizavam um ambicioso cinema francês que conseguiu atrair mais uma vez jovens e frequentadores ocasionais.
Karim Leklou venceu Melhor Ator com “O Romance de Jim”, de Arnaud e Jean-Marie Larrieu, pelo papel de um homem gentil que exerce o papel paternal junto do filho da companheira, que conheceu quando estava grávida de seis meses. Os três formam uma família cuja felicidade é perturbada pela chegada do pai biológico anos mais tarde.
O veterano Alain Chabat foi eleito como Melhor Ator Secundário pela papel do compreensivo pai da jovem no centro da intensa história de amor de “Corações Partidos”.
Para Melhor Atriz Estreante, foi escolhida Maïwène Barthélémy em “Vingt Dieux”, de Louise Courvoisier, que por sua vez também foi eleito Melhor Primeiro Filme: a história de um adolescente cuja vida despreocupada sofre uma reviravolta quando precisa sustentar a irmã de sete anos e decide focar-se na produção do melhor queijo da região para ganhar o prémio de 30 mil euros de um concurso.
Em Melhor Atriz Secundária, venceu Nina Meurisse em “A História de Souleymane”, de Boris Lojkine, que também valeu a Abou Sangaré o prémio de Melhor Ator Estreante.
A história contada no filme, também premiada com o César de Melhor Argumento Original, foi adaptada à sua experiência após ser selecionado por um casting: natural da Guiné, chegou à França em 2017, aos 16 anos, onde trabalhou e estudou. Os seus três primeiros pedidos de regularização da situação no país foram rejeitados, conseguindo finalmente uma autorização de residência de um ano em 8 de janeiro de 2025, já após ser aclamado por esta estreia no cinema e ter ganho Melhor Ator nos prémios da Academia de Cinema Europeu.
Ainda com uma quarta distinção pela montagem, “A História de Souleymane” surpreendeu como o segundo filme com mais prémios: tinha oito nomeações.
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O letão “Flow - À Deriva”, de Gints Zilbalodis, ganhou o prémio de Melhor Filme de animação.
Já na categoria de Melhor Filme Estrangeiro venceu “A Zona de Interesse”, do realizador britânico Jonathan Glazer, que não esteve na gala, mas deixou uma mensagem que estabelece paralelos com a situação em Gaza, à semelhança do seu discurso controverso quando o recebeu o mesmo prémio nos Óscares há um ano.
A Academia Francesa de Cinema prestou ainda uma homenagem emotiva ao ator franco-suíço Alain Delon, falecido em agosto de 2024 aos 88 anos, com excertos de vários dos seus filmes mais famosos.
Antes desta gala, a Academia dos César reforçou as suas regras contra a violência sexual após a avalanche de denúncias nos últimos dois anos e que já em 2024 teve um papel de destaque na cerimónia com um discurso da atriz Judith Godrèche, embaixadora do movimento #MeToo em França.
A "vida de sonho" de Julia Roberts
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“Estou grata a todas as pessoas que tornaram possível viver este sonho, e a minha vida hoje é um sonho!”, disse Julia Roberts ao receber um César honorário pela carreira.
“Qualquer artista sabe que este não é um esforço singular, então estar aqui sozinha é uma fraude”, acrescentou a atriz de 57 anos, recordado as equipas que a rodearam durante a sua carreira.
"Há 35 anos que consigo viver diariamente o meu sonho, portanto estou eternamente grata a todas as pessoas que me permitiram fazer isso”, acrescentou.
A atriz recebeu o seu prémio das mãos de Clive Owen, com quem trabalhou em "Perto Demais" (2004), e que elogiou "uma lenda do cinema".
Impulsionada para o primeiro plano aos 23 anos em “Pretty Woman - Um Sonho de Mulher”, ao lado de Richard Gere (1990), Julia Roberts faz parte da história das comédias românticas, como em "O Casamento do Meu Melhor Amigo" (1997) e "Notting Hill” (1999), mas ganhou o Óscar pelo seu papel como ativista em “Erin Brockovich” (2000).
Com o seu sorriso gigante, continua a ser um dos rostos mais famosos e cativantes do cinema americano, e também é conhecida pelo seu ativismo humanitário e ambiental.
O realizador Costa-Gavras, de 92 anos, também foi galardoado com um César honorário pela sua carreira e quis agradecer à França “acolhedora e humanista”.
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“É uma grande honra, talvez o melhor prémio, que me foi atribuído pelo mundo do cinema que me conhece há tanto tempo”, acrescentou o realizador, nascido na Grécia antes de se exilar em Paris, na sala de imprensa.
"A França e o cinema francês significam muito para mim. É uma razão porque adoro a França desde que me acolheu. Procuro estar à altura desta cultura francesa, sempre que faço um filme", declarou. “Mantenho naturalmente a minha cultura grega, (e) a cultura francesa que me formou completamente.”
Costa-Gavras ganhou o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, como se chamava à época, por "Z - A Orgia do Poder" (1969), uma denúncia da ditadura dos coronéis na Grécia, e a Palma de Ouro do Festival de Cannes por "Missing - Desaparecido" (1982), além de uma estatueta de Hollywood pelo argumento deste filme sobre o golpe de Estado no Chile de 1973.
Em 2002, ganhou dois Césares por "Amen", que condenava o silêncio do Vaticano durante o Holocausto.
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