A Disney despediu o realizador James Gunn da saga "Guardiões da Galáxia" na sexta-feira, poucas horas após terem recebido grande destaque público mensagens antigas controversas que publicou no Twitter sobre temas como a violação e pedofilia, mas também sobre o 11 de setembro, a Sida e o Holocausto.

O realizador, conhecido pela sinceridade da sua atividade nas redes sociais, acabou responsabilizado por anos de mensagens provocadoras e ultrajantes publicadas entre 2008 e 2011 que o próprio descreveu num primeiro pedido de desculpas no Twitter como "piadas chocantes".

"Os comportamentos ofensivos e declarações descobertos no feed do Twitter do James são imperdoáveis e inconsistentes com os valores do nosso estúdio, e rompemos a nossa relação profissional com ele", revelou em comunicado Alan Horn, presidente do conselho de administração da Walt Disney Studios.

James Gunn reagiu, sem ser nas redes sociais, à decisão do estúdio.

"As minhas palavras de há quase uma década foram, na altura, esforços totalmente fracassados e infelizes para serem provocadores. Arrependi-me deles desde há muitos anos - não apenas porque eram estúpidos, nada engraçados, descontroladamente insensíveis, e certamente não provocadores como esperava, mas também porque não refletem a pessoa que sou hoje ou que tenho sido há algum tempo", salienta em comunicado.

"Independentemente do tempo que passou, compreendo e aceito as decisões empresarias tomadas hoje [sexta-feira]. Mesmo muitos anos mais tarde, assumo a responsabilidade total pela forma como me comportei na altura. Agora, tudo o que posso fazer, além de apresentar o meu arrependimento sincero e sentido, é ser o melhor ser humano que posso ser: tolerante, compreensivo, empenhado na igualdade e muito mais ponderado sobre as minhas declarações públicas e as minhas obrigações para com o nosso debate público. A todos dentro da minha indústria e para além dela, apresento novamente as minhas mais profundas desculpas. Amor para todos.", conclui.

Piadas ultrajantes e uma carreira interrompida pela política

James Gunn era visto há muitos anos como um provocador de sentido de humor retorcido que acabou por o tornar a escolha ideal para o primeiro "Guardiões da Galáxia" em 2014.

A sequela foi lançada em maio de 2017 e ele tinha entregue há poucas semanas o argumento para o terceiro filme, cuja rodagem estava prevista para o ano que vem e a estreia no verão de 2020.

Além disso, em abril ele tinha também revelado que iria trabalhar com a Marvel (detida pela Disney) para ajudar definir as histórias dos filmes da quarta fase do universo cinematográfico, posteriores a "Avengers 4", que estreia em abril de 2019 e concluirá não só "Vingadores: Guerra do Infinito" mas também a história que começou com "Homem de Ferro" (2008).

A implosão da carreira ocorreu em poucas horas a partir de quinta-feira ao fim da tarde, véspera da sua presença prevista (e cancelada) na enorme convenção anual Comic-Con, em San Diego, com um projeto secreto de um filme que havia mencionado nas redes sociais.

Gunn tem sido um aberto crítico do presidente Donald Trump e atraiu a ira dos conservadores, que foram à sua página. Dois deles, Jack Posobiec do Daily Caller, e o comentador de direita Mike Cernovich, estão entre os que recuperaram as mensagens, descrevendo-as como tendo "conteúdo pedófilo".

Mais de 10 mil, foi também notado, terão sido apagadas num curto espaço de tempo quando começou a polémica.

Segundo este declarado opositor, o realizador também desativou o seu "site" pessoal, www.jamesgunn.com, onde estavam conteúdos semelhantes.

O filme "Os Mercenários" ser tão viril que o tinham levado a fazer sexo com um miúdo que era seu vizinho ou qual dos concorrentes do concurso "American Idol" estava a liderar a votação para ser violado por ele são alguns dos textos de James Gunn publicados entre 2008 e 2011 e "preservados" pelos seus críticos.

Mike Cernovic também colocara pressão sobre a Disney.

Numa série de mensagens publicadas ao fim da noite, madrugada de sexta-feira em Portugal, o realizador pediu desculpa pelo teor dos seus textos.

"Muitas pessoas que têm seguido a minha carreira sabem que, quando comecei, me via a mim próprio como um provocador, a fazer filmes e a dizer piadas que eram ultrajantes e tabu. Como comentei publicamente muitas vezes, tal como evoluí como pessoa, também aconteceu o mesmo com o meu trabalho e humor."

"Não quer dizer que estou melhor, mas sou muito, muito diferente do que era há alguns anos; hoje tento enraizar o meu trabalho em amor e afetividade e menos em raiva. Acabaram os meus dias a dizer algo só porque é chocante e tentar conseguir uma reação."

"No passado pedi desculpa por humor que fiz que magoou as pessoas. Estava verdadeiramente arrependido e a ser sincero."

"Para que conste, quando fiz essas piadas chocantes não as estava a viver. Sei que é estranho fazer esta afirmação, e parece óbvio, mas, ainda assim, aqui estou eu, a dizê-la. "

"De qualquer forma, esta é a verdade completamente honesta: costumava fazer muitas piadas ofensivas. Já não as faço. Não culpo o meu passado por isso, mas hoje gosto mais de mim mesmo e sinto-me como um ser humano e criador mais completo. Adoro-vos a todos."