A HISTÓRIA: O novo filme segue as aventuras contínuas do jornalista de televisão cazaque Borat (Sacha Baron Cohen) quando é enviado à América. Desta vez, ele traz a sua filha e os dois continuam a causar estragos junto de pessoas desprevenidas em todos os sítios a que vão durante a pandemia do coronavírus.

"Borat, o Filme Seguinte: Entrega de Suborno Prodigioso a Regime Americano Para Fazer Benefício à Outrora Gloriosa Nação do Cazaquistão": disponível no Prime Video a partir de 23 de outubro.


Crítica: Daniel Antero

Em 2006, o comediante Sacha Baron Cohen abalou os EUA com a sua audácia e descaramento. Através da personagem Borat - um repórter do Cazaquistão - aplicou um jogo de empatia, onde espelhando os valores da sua pitoresca e tóxica personagem (misoginia, anti-semitismo e racismo) conseguiu provocar e revelar as opiniões fanáticas dos campos mais tradicionalistas e conservadores dos lares americanos.

Embora a sua personagem Ali G já fosse conhecida, o factor surpresa e o disfarce do repórter bigodaças foram determinantes para o sucesso do filme: o choque surpreendeu-nos; as "catchphrases" viralizaram e o arrojado "mankini" verde tornou-se imagem de marca.

Quando surgiu o anúncio da Amazon de que daí a um mês o “Borat, o Filme Seguinte: Entrega de Suborno Prodigioso a Regime Americano Para Fazer Benefício à Outrora Gloriosa Nação do Cazaquistão” iria estrear, foram várias as dúvidas que nos assaltaram.

Como iria este filme funcionar quando Borat ficou mais famoso que o próprio Cohen? Quando a polarização racial e política está tão acidamente vincada, como é que ele iria revelar camadas ocultas que nos pudessem surpreender? Se até Donald Trump as vocifera perante as câmaras e nas redes sociais, os americanos precisam que um repórter do Cazaquistão os leve a fazer o mesmo?

Bem, agora Cohen foi ainda mais audaz e simplesmente deixou que a personagem de Borat (através do uso de disfarces)... existisse num universo de extremos, aprofundando-se na decadência moral da América.

No território ideal de Borat vivem as teorias de conspiração QAnon; os supremacistas brancos; os escândalos de Mike Pence, Rudy Giuliani e Trump; os comícios de extrema direita; as clínicas anti-aborto... e tudo no meio de uma pandemia, onde as "fake news" têm espaço para alastrar!

Furtivo e matreiro no choque e no jogo de palavras, a personagem navega por um núcleo de ideais em que a distorcida passividade dos cidadãos permite que o ódio discorra sem impedimento.

Surpreendentemente, “Borat: O Filme Seguinte” revela também uma humanidade mais profunda, que parecia esquecida.

Através da introdução de uma nova personagem, que vem tomar o lugar de obeso Azamat – agora literalmente um sofá -, as honras do deboche cabem a Tutar (a revelação búlgara Maria Bakalova), a "filha" de 15 anos que Borat não sabia que tinha.

Com a sua presença, a linha narrativa do filme envereda por uma crítica à sociedade patriarcal e valoriza a emancipação feminina, onde Tutar, a cada ação cada vez mais ultrajante, obtém surpreendentemente respostas de carinho, compreensão e educação.

Como o título indica, ela é o “Suborno Prodigioso”, planeado para ser entregue ao Vice-Presidente Mike Pence. Quando a oferenda é “recusada” e Borat e Tutar são convidados a abandonar o local onde Pence discursava, o “alvo” passa a ser Rudy Giuliani, o advogado pessoal de Donald Trump.

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Depois de algumas piadas fáceis, alguns momentos de surpresa e outros que nos deixam boquiabertos e embasbacados, “Borat, O Filme Seguinte” introduz aqui um registo de investigação agressivo, manipulador, que levanta muitas questões éticas e profissionais, tanto do lado de Giuliani como de Cohen e Bakalova.

Numa das cenas mais badaladas, que já fez e ainda fará correr muita tinta, Tutar e Giuliani assediam-se mutuamente, deixando o advogado de Trump numa posição comprometedora. O que é extraordinário do lado dos dois atores é como conseguem manter o sangue frio e continuar o registo "mockumentary" [falso documentário] dentro da linha narrativa de pai e filha, enquanto entram no limite da sua própria segurança pessoal.

A pouco tempo das eleições americanas, Borat já não é um ataque aos costumes e às raízes mais conservadoras abafadas. Tornou-se assumidamente uma arma política.

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