"Uma máquina é um conjunto de parafusos, de porcas, de coisas, de fusíveis, mas não é vida. Estamos muito mais irmanados com uma formiga do que com um computador", recordou durante a sua quinta visita ao território, desta vez a convite do Festival Literário de Macau.
Perante meia centena de alunos entre os 10 e 11 anos, o maestro lembrou que apenas seres com vida podem fazer das palavras poesia e dos sons música, uma distinção que considera essencial de transmitir às novas gerações, muito habituadas a conviver com dispositivos eletrónicos.
"Se eles não encararem a música como uma coisa que tem lá dentro certos resquícios de vida, passa a ser apenas o resultado do barulho de uma máquina e não tem esse aspeto de vida. É fundamental que liguem tudo o que têm à sua volta, as palavras, os sons, a esse sentimento superior que é a vida", afirmou, defendendo que "uma coisa que está a envenenar, de certo modo, a sociedade atual é as pessoas transformarem isto [aponta para o gravador] em deus".
Sentado ao lado de um órgão, numa sala repleta de instrumentos musicais, Victorino d'Almeida disse ficar "preocupado" por ver pessoas "falar com máquinas, respeitar máquinas", sublinhando que maior feito seria conseguir "comunicar com uma formiga" que, por ter em si vida, se sobrepõe à máquina.
"As máquinas não sentem nada, servem para as utilizarmos. Um bicho, por mais pequeno que seja, tem vida", sublinhou, lembrando que qualquer ser vivo goza da condição de ser o centro do universo.
"Tu és o centro do universo, tudo está à tua volta. Mas não ficas vaidoso porque ele também é o centro do universo", disse, apontando para dois alunos na fila da frente.
O teclado do órgão serviu para exemplificar: tocou dois acordes e perguntou qual deles era o mais alegre, ao que todos responderam, em coro, que era o primeiro. Mas porquê? Ninguém sabe, disse o maestro, mas ainda assim uma das respostas da audiência mereceu elogios. "Porque o segundo começa a descer aos bocadinhos", arriscou uma aluna. "Sim, o que vai para a frente é o mais alegre, o mais triste é o que desce", confirmou o maestro.
No final, as questões não foram muitas, mas assim que a sessão se deu por encerrada, todos levantaram papelinhos brancos e perguntaram "Pode dar-me um autógrafo?".
@Lusa
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