Em declarações à Lusa, Cristina Nóbrega admitiu que uma perspetiva mais trágica do poeta marcou muito o disco, embora também se verifique "um caráter mais leve" entre as escolhas, com o "Fado às voltas", de que gosta particularmente, "as marchas e o dueto com Omara Portuondo”, acrescentou.

“Queríamos prestar também um tributo ao poeta Luís de Macedo, com um outro ‘Cansaço’, que está um bocado 'pegado' ao tema do Fado Tango ‘Cansaço’”, que Amália Rodrigues gravou.

Luís de Macedo é o pseudónimo literário do diplomata Luís Chaves de Oliveira (1901-1971), que dirigiu a revista literária Távola Redonda e de quem Amália Rodrigues gravou, além de “Cansaço”, os poemas “Vagamundo” e “Asas Fechadas”, entre outros. Mais recentemente, foi Camané quem gravou quatro inéditos do poeta.

A ideia da homenagem a Luís de Macedo foi “pegar nas palavras de ‘Cansaço’ e arranjar outra letra”, explicou Cristina Nóbrega. Intitulado “Outro Cansaço”, o poema também é interpretado na melodia do Fado Tango, de Joaquim Campos.

Este CD é essencialmente de fado tradicional, com dez melodias tradicionais, excetuando duas marchas - “O barquinho de papel” e “Escadinhas da Bica” - ambas com música de Pedro Jóia, que assina a composição de “Las cenizas de mis canciones”, de autoria de Torres da Silva, que a fadsita interpreta com a cubana Omara Portuondo.

À Lusa, Cristina Nóbrega, distinguida em 2009 com o Prémio Amália Rodrigues Revelação, afirmou que era sua intenção “desde há muito fazer um disco de fado tradicional que é a essência do fado”.

Das mais de 200 melodias tradicionais, entre as preferidas da fadista, estão o Fado Menor com versículo, na qual interpreta o tema que dá título ao álbum, “Um fado para Fred Astaire”, os Fados Bailarico e Cravo, ambos de Alfredo Marceneiro, nos quais canta, respetivamente, “Quando o mar nos leva ao fado” e “A vida que há na saudade”, e também o Fado Meia-Noite, de Filipe Pinto, no qual gravou “Por me ver sozinha assim”.

Relativamente à vontade de cantar fados tradicionais, a fadista defendeu que “tinha de ter um crescimento pessoal, para saber como agarrar as músicas” e destacou “a intensidade dos fados tradicionais”, referindo-se ao fado como uma “música estranha, capaz de cantar sentimentos que são de todos, da humanidade”.

Cristina Nóbrega projeta “gravar todos os outros [de que gosta], pois são lindos”, já que considera “o fado tradicional um manancial de pérolas”.

Neste CD, que é editado nesta segunda-feira, Cristina Nóbrega registou os Fados Dois Tons, de Alfredo Costa, Amora, de Joaquim Campos, Zé Grande, de Raul Pereira, Zé Negro, de José Marques, e o Alexandrino, de Armandinho.

A fadista salientou à Lusa o quanto gosta de cantar poemas de Tiago Torres da Silva, que “é capaz de falar dos sentimentos mais íntimos, que são a temática fadista, mas com dignidade e sem ser lamechas”.

Na realidade, o desafio para gravar fados tradicionais partiu de Torres da Silva, mas era uma vontade “de há muito tempo” da fadista, tendo-se juntado, aos dois, o músico Pedro Jóia que, além de ser o diretor musical, produz pela primeira vez um disco de fado.

Quanto à escolha do título, “Um fado para Fred Astaire”, remete para o episódio de Amália Rodrigues que, tendo escolhido Nova Iorque para pôr termo à vida, depois de saber que tinha uma doença grave, “acabou por ganhar forças e tratar-se, pois foi vendo filmes do Fred Astaire num leitor de vídeo, e viveu pelo menos mais 20 anos”, contou. “É desta forma que o Fred Astaire entra na história da saudade”, rematou a intérprete.

Cristina Nóbrega, que se define como “uma amadora”, pois tem outra profissão, garantiu que a opção pelo fado “é para toda a vida”. “Encanta-me esta música antiga, que está ligada aos sentimentos mais profundos de todos nós, e em que estamos sempre a descobrir coisas novas”, disse.

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