Por esta altura, ao fim de sete álbuns - oito, se se contar com um disco a meias com Yann Tiersen -, é legítimo esperar que cada novo registo de Shannon Wright seja, no mínimo, coeso. É a isso que a cantora, compositora e multi-instrumentista tem habituado quem a acompanha desde o estreante "Flightsafety", de 1999, e no recente "Secret Blood" não trai essa impressão.

Também ainda não é desta que foge muito ao cânone indie rock no feminino - herdeiro da faceta mais agreste de PJ Harvey ou Kristin Hersh - , com letras entre o poético e o confessional e música que não dispensa a ajuda de guitarras com distorção q.b..
De resto, outra coisa não seria de esperar de uma colaboradora habitual de Steve Albini, parceria que pode ajudar a explicar a aridez destas canções. O produtor de discos dos Nirvana ou Pixies não surge na ficha técnica de "Secret Blood" mas a força da guitarra e bateria, motor dos melhores momentos do álbum, não anda longe dos seus ensinamentos (e é um tentador apelo à prática de air guitar... ou de air drums).

Em temas como "Violent Colors", "Fractured" ou "Commoner's Saint", esse diálogo instrumental e as palavras de Wright, cantadas com uma emoção à flor da pele, conseguem tornar a primeira metade do disco numa experiência visceral.
Na segunda, o domínio de quase-baladas (de cor turva) como "Satellites" ou "Merciful Secret Blood of a Noble Man" quebra o rasgo inicial e, por arrasto, demove a hipótese de um álbum avassalador, embora não coloque em causa a solidez da composição e interpretação.

No final do alinhamento, "Under the Luminaries" mostra como essa introspecção pode funcionar bem com um embalo mais expansivo e "Chair to Room", um dos breves apontamentos instrumentais ao piano, confirma o flirt com a música clássica ocasionalmente ensaiado em discos anteriores.

Se no geral acaba por não ser tão portentoso como no arranque, "Secret Blood" parece daqueles álbuns que é bem capaz de atingir todo o seu potencial num palco. E como a entrega de Shannon Wright ao vivo é uma das suas qualidades mais apregoadas,seria muito bom que alguém a trouxesse cá este ano para tirar as dúvidas.

@Gonçalo Sá

Teaser do disco: