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Quando o vimos em palco, neste verão, esperávamos que o álbum trouxesse algum calor ao outono-inverno das edições nacionais. Mas não: em "Focused", Richie Campbell propõe-nos um disco que nos deixa longe, muito longe, do sol jamaicano que o inspirou. Ao pensarmos em reggae, antes sequer de ouvir, pensamos em Bob Marley, calor, praia e palmeiras. Em sol, cannabis e ideais convictos, responsabilidades cívicas, paz e luta. E é isso que temos em "Focused", mas apenas em parte. "That’s How We Roll", o single de avanço, é, sem dúvida, uma aposta ganha e a melhor canção do álbum – soa a uma espécie de hino, e dos bons. Fala-nos de expressarmos a nossa voz mesmo que ninguém a ouça, de não esperar muito das coisas ou das pessoas, de ter aquela vontade incomodativa de querer sempre fazer mais e melhor e marcar a diferença. Em suma, tem o espírito certo acompanhado de todo o calor e movimento que tão bem caracterizam este género musical. Já "Love Is An Addiction", a colaboração do português com Ikaya, resultou bem melhor em palco. Em agosto deste ano, Richie apresentou a jamaicana aos portugueses levando-a consigo até ao Sudoeste TMN para apresentar o single – algo que resultou maravilhosamente. Demonstraram transpirar química em palco, sorriram e conquistaram, destronando até o dueto da simpática brasileira Vanessa da Mata e de um Ben Harper irreconhecivelmente apagado. Se aquilo era um teste, passaram com distinção. No entanto, quem ouviu a voz de Ikaya, quente e presente, e a voz doce e tímida de Richie cruzarem-se naquele palco, em planícies alentejanas, não consegue ter sequer um gosto do momento no álbum. O single de estúdio parece triste, parado e sem magia. Não faz justiça a nenhum dos dois simpáticos e dotados músicos. "Get With You" é uma canção mais vaga e romântica. Num tom sussurrante, mais jazz e soul, fala-nos de amor numa perspetiva de que nada importa se não tivermos alguém ao nosso lado. A par de "Going Out", "What a Day" e, claro, "That’s How We Roll", são os melhores temas de "Focused". "More Than Air", outra a ter em conta, destaca-se como a canção mais pop do ponto de vista temático: Richie canta-nos sobre precisar de alguém mais do que de ar. "Chill" é um momento de uma leveza extraordinária – e o nome assenta-lhe como uma luva. O episódio mais chill out do álbum recorda-nos Gentleman, numa canção fácil de ouvir e com o toque certo. Mas o alemão não é o único a vir-nos à memória. Conseguimos, facilmente, recordar a lendária "Bad Boys", de Inner Circle, nas vogais redondas e graves de "Going Out" ou a velocidade e cadência de Dub Inc em "Don’t Panic". Das três colaborações que o álbum nos traz, "It Takes a Revolution" é aquela que mais surpreende. Na interpretação com Anthony B, com quem Richie diz ter sido fantástico trabalhar, podemos perceber que são dois músicos que se relacionam com simplicidade e harmonia – que parecem transmitir o gosto que têm em trabalhar juntos.<
"Focused" é um disco que vale a pena perdermos tempo a ouvir mas que decerto não durará até ao verão. Falta-lhe uma espinal medula – algo que ligue música atrás de música –, uma centelha e uma magia que sempre acreditámos que Richie Campbell trouxesse ao de cima com este álbum. Falta-lhe algo que nos permitisse acabar a crítica de modo triunfal, afirmando ser o disco que chegou para aquecer o inverno, por muito clichê que seja uma expressão assim. Ainda não é desta. Não passamos frio mas raramente encontramos o verão por aqui...
Recorde a passagem de Richie Campell pelo Sudoeste TMN 2012:
@Raquel Cordeiro
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