Aos 23 anos, e depois de ter passado pelos Estados Unidos da América, onde se profissionalizou, Luísa Sobral criou o seu próprio universo artístico com o seu primeiro álbum, “The Chery On My Cake”.

De uma tranquilidade e serenidade contagiantes, Luísa Sobral parece viver num mundo de maravilhas. Após o sucesso arrebatador do single Not There Yet, recebeu o galardão de Disco de Ouro, e no início do mês de novembro viu o seu álbum de estreia reeditado.

Para breve, um novo desafio: tocar no Festival Vodafone MexeFest.

Palco Principal - O teu álbum de estreia foi um dosregistos portugueses mais aclamados do ano. As críticas foram mais do que positivas e, recentemente, alcançou o estatuto de Disco de Ouro. Achas queos portugueses estavam a «ressacar» umdisco que abordasse as sonoridades apresentadas em "The Cherry On My Cake"?

Luísa Sobral – Acho que sonoridades e abordagens diferentes, com a nossa língua e também com as influências de outros países, são sempre bem-vindas. É positivo habituar o público a coisas diferentes.

P.P. - Na tua opinião, qual o motivo para as sonoridades jazzísticas não serem, comummente, abordadas no nosso país? Por que existirão tão poucos projetos a apostar no jazz?

L.S. – Ainda há alguns projetos a abordar o jazz como sonoridade dominante, e até projetos bastante bons. Mas as pessoas não os conhecem, essa é a verdade. Algumas pessoas comentam que fui uma das vozes pioneiras do jazz em Portugal, mas eu não fui nada pioneira! Há muito bom jazz feito em Portugal há muito tempo. O que o difere do jazz que eu faço é que eu misturo-o com outras sonoridades, como o pop e o folk, e isso torna-o mais acessível.

P.P. – Pode falar-se de falta de divulgação do jazz por parte dos meios de comunicação? Ou será o jazz um estilo musical que atrai apenas um determinado tipo de público?

L.S. – Trata-se de um estilo de música do qual é preciso aprender a gostar. Temos que o ir ouvindo e percebendo. Não se trata de um estilo nosso, logo é necessária uma aprendizagem. Quando o jazz tem vocal, torna-se mais fácil haver uma identificação por parte das pessoas. Já o jazz instrumental é mais difícil. Vejo isso com a minha própriafamília: a minha mãe, por exemplo,não consegue ouvir jazz instrumental. Eu própria, quando comecei a ouvir jazz, fi-lo de uma forma progressiva, foi um processo lento.

P.P. - Not There Yet continua a tocar em força nas rádios nacionais, apesar de já ter sido lançada há quase um ano. Qual o segredo desta «durabilidade»?

L.S. – Quando eu mostrei a canção na editora, a diretora disse-me que todas as mulheres, ao escutarem o tema, iriam abrir a janela do carro e, na parte dos violinos, ficariam com um ar muito feliz e com os cabelos ao vento (risos). Na verdade, eu nunca vi ninguém a fazer isso, mas achei imensa piada! Talvez o segredo esteja no facto de ser a música mais pop do disco e no seu arranjo musical que, mesmo não sendo meu, é muito bom. E tudo isto, em conjunto com o quarteto de cordas, funciona muito bem na canção. É uma canção bastante simples, que faz as pessoas sentirem-se bem.

P.P. - Chegou às lojas no passado dia 7 de novembro a reedição de "The Cherry on My Cake", que traz um tema inédito, I Woke Up One Day, e um DVD, gravado no Cool Jazz Fest, no dia em queatuou comJammie Cullum. Como foi pisar o mesmopalcoque esta referência?

L.S. – De todos os artistasque passaram pelofestival, o Jamie Cullum é o que mais admiro, embora também goste muito de todos os outros. A ideia de atuar no mesmo dia do que ele surgiu logo após ter lançado o álbum, mas, na altura, ainda nem me queria acreditar nisso. Normalmente, prefiro pensar que não vai acontecer, porque, se acredito à partida, e depois as coisas não acontecem, fico realmente triste. Mas isso acabou por se concretizar e fiquei muito feliz, apesar de não ter atuado com ele. O seu concerto foi espetacular, foi um enorme prazer fazer a primeira parte. No final da atuação, fui conversar com ele. Ele fez-me imensas perguntas, foi muito simpático.

P.P. - Entretanto, também atuaste noutros festivais de grande dimensão, como o Sudoeste tmn ou o MED. Foram experiências positivas? Ou preferes atuações mais intimistas?

L.S. – Antes de tocar em festivais, sempre pensei que não iria gostar. Tinha a ideia que as minhas músicas soavam melhor em ambientes mais intimistas. Mas as experiências acabaram por se revelarbastante positivas.O Sudoeste foi ótimo - foio local onde eu tive mais pessoas a cantar as minhas músicas! Nunca pensei que isso fosse acontecer nesse festival em específico. Foi um dos meus concertos preferidos - não musicalmente, porque o som não estava a 100%, mas sim pela reação do público. Quanto ao MED, adorava voltar a atuar lá, porque, para além de ser um festival muito bonito,o público aderiu bastante.

P.P. - Além de I Woke Up One Day, há outras novas canções na calha?

L.S. – Estou sempre a trabalhar em novas canções, o que se torna um problema, pois gosto de colocar no alinhamento todas as músicas novas que escrevo, embora o meu manager não me deixe fazer isso (risos). Eu gosto muito de compor e faço-o constantemente. Com tanta música, quase que dá para fazer um novo disco, mas ainda não o vou fazer para já. Vou esperar mais tempo, até porque, atualmente, estou a lançar este álbum no estrangeiro e não faz sentido estar a lançar cá um novo disco, se o outro ainda não navegou por outros países.

P.P. - A internacionalização é, portanto, um objetivo...

L.S. – Sim, faz todo o sentido. Eu gosto muito de tocar em Portugal - não me sinto tão nervosa, sinto-me mais confiante. Contudo, tocar num país onde ninguém nos conhece e as pessoas reagem e sentem a música é incrível. Depois de Espanha, quero continuar a mostrar a minha música noutros locais.

P.P. - Até agora, qual foi para ti o maior desafio enquanto artista?

L.S. – Talvez os primeiros concertos em Espanha, para além do concerto de lançamento do álbum, claro. Gravar o disco também foi um enorme desafio, mas apresentá-lo noutro país foi mesmo desafiante. Os festivais onde toquei são eventos que têm no cartaz os músicos de jazz que mais admiro, músicos que já oiço há bastante tempo e que adoro. Portanto, terem-me convidado para fazer parte de um festival deste género, no ano em que lancei o disco, foi assustador, mas, ao mesmo tempo, incrível. Foi este o momento mais alto até agora.

P.P. – Aconteceu tudo demasiado depressa, na tua carreira?

L.S. – O convite para tocar em Espanha surgiu demasiado depressa. Num dia, fui a uma rádio em Madrid; no dia seguinte, o meu disco já era o número 7 do top de vendas do iTunes espanhol. Fiquei bastante surpreendida, foi muito bom, fiquei muito feliz. Fez-me acreditar que nos outros países as pessoas irão aceitar e gostar do meu trabalho também.

P.P. - No início de dezembro, vais passar pelo Vodafone Mexefest, sendo que o teu concerto vai decorrer no interior de uma igreja. O que podemos esperar da tua atuação?

L.S. – Ainda não sei bem.. Na verdade, estou muito curiosa para saber como será o resultado final. Os cenários que habitualmente apresento nos meus concertos não deverão ser possíveis apresentar nesta formato. Ainda estou a tentar perceber a logística da igreja, mas será um concerto bastante especial, com certeza. A acústica das igrejas é sempre espetacular. Estou muito ansiosa!

Ana Cláudia Silva