Como será de prever, a adesão massiva traduziu-se num caos redobrado, de extensas filas para WC, na restauração, e nos stands de passatempos. O tempo de espera para auferir das atividades extra no recinto, de que são exemplo a montanha russa, a roda gigante e o slide, também se viu consideravelmente aumentado.
Uma Máquina do Tempo chamada Palco Mundo
Os Limp Bizkit fazem parte, à semelhança dos colegas do Palco Mundo programados para esta noite (com exceção dos Smashing Pumpkins), de um leque de bandas que atingiram um boom de popularidade no início do ano 2000, sob o signo do nu metal, dos bonés de pala grande e das calças largueironas e descaídas. Uma década de música mais à frente as modas são outras, mas os adolescentes nem por isso deixaram de ser adolescentes, daí que seja compreensível a franca sedução exercida pelo imaginário queixoso proclamado por Fred Durst. Quanto aos ouvintes de outrora, torna-se difícil resistir aos apelos do passado, daí que a assistência de ontem tivesse sido composta por fãs renovados e muitos saudosistas.
“If only we could fly, Lisboa!”, assim se deu a entrada em palco dos Limp Bizkit, com My Generation, enquanto gerações distintas, de miúdos e graúdos, se fundiram de braços erguidos, letras na ponta da língua e um indiscutível apreço pelo momento. Um ambiente que se promulgou atuação fora, entre os constantes piropos lançados ao coração das meninas e ao orgulho nacional, passeatas pelo corredor frente ao palco e até refrões dos Offspring e dos Linkin Park cantados com o público. My Way e Take a Look Around protagonizaram os momentos mais fortes, cedendo a Rollin honras de fecho daquele que, segundo o vocalista, terá sido o melhor dia que os Limp Bizkit terão tido, enquanto banda, nos últimos tempos.
Da solarenga California para o calor imenso vivido pelos para lá de muitos apinhados frente ao palco, num céu ainda azul onde os aviões pareciam passar demasiado rentes às nossas cabeças, chegaram os senhores que se seguiram mais o postal que nos trouxeram, daqueles Estados Unidos da América criticáveis e satirizados em “Americana”. E claro que corresponderam a este disco, responsável pela ascensão dos Offspring, os temas mais cantados e aplaudidos por todos (com especial destaque para Get a Job e Pretty Fly For a White Guy), num entusiasmo que não se deixou esmorecer com a apresentação de uma “novidade”, que apesar de já ser tocada ao vivo desde 2010, será apenas lançada para o mês que vem, no álbum com o mesmo nome, “Days Go By”.
Obrigatória, à semelhança dos Limp Bizkit, não poderia ter faltado a baladinha. E se com Behind Blue Eyes Fred Durst pôs de lado, por uns instantes, a pose de durão a quem todos devem e ninguém paga, foi com Kristy que o ainda oxigenado Dexter Holland deixou aflorar a vertente mais sensível dos Offspring. Após os elogios de Kevin “Noodles” Wasserman dirigidos à “sexyness” da audiência, foi com Self Esteem que os Offspring se despediram, a provarem que os hinos dos adolescentes dos anos 90 continuam avivados na memória dos mesmos e recomendam-se.
Teria tido alguma graça que este dia tivesse obedecido a uma ordem cronológica, e a verdade é que em temos de público e de lógica a coisa nem teria corrido mal. Compreende-se que por uma questão de estatuto, e mesmo de reverência geral, embora esta noite, com um cartaz mais centrado numa vertente mais específica e mais datada do rock, não tenha sido exemplo, os Smashing Pumpkins estivessem no topo do alinhamento. Seria mesmo impensável, convenhamos, remetê-los a uma posição mais ingrata, como a de abertura. Porém, neste contexto específico, teria sido uma jogada mais esperta ter cedido o protagonismo aos Linkin Park, cujo fim da atuação motivou os primeiros abandonos ao Parque da Bela Vista.
A fórmula do sucesso foi a mesma repetida ao longo do dia, o já referido modo “best of”, em que as bandas foram suficientemente inteligentes, dado o formato do festival, para se passearem pelos temas que as celebrizaram, relegando as novidades para um plano inferior. E sem surpresas, a Numb, Crawling e In The End, corresponderam os momentos mais avassaladores, berrados em uníssono por um público que aproveitou todas as oportunidades para demonstrar devoção.
Música aparte, a prestação dos Linkin Park ficou ainda marcada pelos breves momentos em que Chester Bennington, ingenuamente, exibiu um cachecol do Futebol Clube do Porto, que um fã lhe passou, o que resultou num misto entre aplausos e apupos.
Poderia ter sido um ótimo momento, mas o público não esteve para aí virado. Não nos enganemos, aborrecimento, cansaço e algum descontexto à parte, Billy Corgan, apesar de todos os defeitos que lhe conhecemos, ainda sabe o que faz e, apesar de mal apreciado, presenteou o Rock in Rio com uma bela atuação.
Os Smashing Pumkins inauguraram a passagem pela Bela Vista com uma trilogia de peso (Zero, Bullet With Butterfly Wings e Today), que agarrou o público de uma assentada mas que conduziu a um previsível esmorecimento, com uma versão prolongada de Starla e a menos familiar The End is The Begining is The End, composta para banda sonora de “Batman and Robin”. Mas Billy Corgan ainda guardou alguns trunfos debaixo da manga, jogados estrategicamente, correspondentes aos clássicos roubados a “Siamese Dream” e “Mellon Collie and The Infinite Sadness”. Tonight Tonight, introduzida pela versão reescrita (Tonite Rreprise) lançada como lado b, 1979 e Disarm espicaçaram o público, que apesar de permanecer no recinto não fez por esconder ares de cansaço, marcado por longos bocejos e demasiadas conversas paralelas.
Billy Corgan é dado a poucas conversas. “Lisboa”, disse o senhor Smashing Pumpkins ser a única palavra que conhece da língua de Camões o que, contabilizando todos os concertos que a banda já deu em Portugal, se torna um pouco difícil de acreditar. Em resposta, Nicole Fiorentino murmurou um simpático “obrigada”, ripostado por Corgan com uma curiosa concordância de género, “obrigado? O que quer dizer?”. Fica a dúvida se o tom era de gozo ou se, realmente, esta indesculpável ignorância se confirma, numa falta de noção gritante, sendo que a loucura do líder dos Smashing Pumpkins já não é surpresa para ninguém. Felizmente, neste caso, o feitio peculiar é compensado por um génio musical leva a que as mesmas pessoas não se coibiram de o insultar, face à indelicadeza, fossem as primeiras a mostrar excessivo contentamento aos primeiros acordes de Ava Adore.
Com Black Diamond o concerto desta nova versão dos Smashing Pumpkins chegou ao fim, com poucas novidades retiradas ao futuro “Oceania”, o que muito há de ter agradado aos fãs de longa de data, que de surdos pouco têm, mas que souberam fazer-se de cegos e não se deixaram contagiar pelo ar entediado da generalidade do público.
Pôr-do-sol luso-brasileiro
Foi em português com sotaque acalorado que se fizeram as acutações no Palco Sunset, com três colaborações entre Portugal e Brasil.
A convite de Rita Red Shoes, Moreno Veloso subiu ao palco para um curto concerto a que muitos não conseguiram assistir, presos na filas de entrada. Por sua vez, Mafalda Veiga e Marcelo Jeneci protagonizaram um concerto simpático, que se foi desenrolando pelas canções de sempre da cantautora, e que apresentou o trabalho do por cá menos conhecido cantor paulista.
Para o fim ficou guardado um duelo entre dois dos maiores representantes da velha guarda do rock feita em língua portuguesa. Aos Xutos e Pontapés, que regressarão ao Rock in Rio para a semana, juntaram-se os lendários Titãs.
Showcase Claque da Vodafone
Por melhores que sejam as propostas do espaço Vodafone, cujo tempo de antena se situa entre os intervalos das atrações principais, comer e angariar as ofertas dos patrocinadores têm-se mostrado uma alternativa bem mais apelativa para a maioria dos consumidores Rock In Rio. Provavelmente a adivinhar este resultado, frente ao pequeno palco, em uniforme Vodafone, tem comparecido uma pequena claque chamariz. Uma estratégia que, na prática, nos parece um pouco desrespeitosa para com as bandas e para com o pouco público que perde o lugar privilegiado frente ao palco, em detrimento destes jovens pagos, de atitude um pouco gozona.
A resposta merecida foi feita no mesmo tom, e obrigada Glockenwise, pela vossa distinta lata: “A Vodafone gostava de nos agradecer a nós porque sem nós nada disto seria possível. De nada, Vodafone”.
Vindos de Brooklyn, os Oberhofer, por terem sido os últimos a tocar, lá conseguiram escapar à maleita. Em compensação, prolongaram-se pelo início do concerto dos Smashing Pumpkins, o que não há de ter sido muito abonatório.
Ainda frente à claque vermelha atuaram os Larkin, os Murdering Tripping Blues e os Youthless.
Texto: Ariana Ferreira
Fotografias: Filipa Oliveira
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