Saltaram para o palco principal da edição 2012 do Super Bock Super Rock em formato trio, com um colega a assumir a bateria, às 20h00 em ponto. “Nós somos os Salto e é um prazer estar aqui a abrir o SBSR”, grita, entusiasmado, o vocalista, que, sem mais demoras, dá início a Não Vês Futebol, quarto do tema do disco de estreia homónimo.
Passou há pouco a barreira dos 20, esta dupla do Porto. Nota-se bem. A energia ainda é abundante e dá sinais de vida a cada movimento de Guilherme Tomé Ribeiro e Luis Montenegro, que se debate com o baixo, com determinação. O brilho nos olhos, de quem cumpre, no palco do SBSR, um sonho há muito almejado mas nunca verdadeiramente esperado numa fase tão precoce da carreira, dá um encanto extra à atuação, que prossegue com Poema de Ninguém, Coração Bate Fora e Deixar Cair, com a última, single de avanço de “Salto”, a despertar os mais atacados pela moleza de final de tarde típica de quem fez da praia do Meco a sua residência durante a tarde e da Super Bock a sua companhia inseparável.
O divertimento em palco é óbvio. E o talento também. Temas espontâneos, diretos, onde o pop, a eletrónica e algum experimentalismo mais ousado coabitam pacificamente, sucedem-se, sem erros, hesitações ou receios. Hoje saltam, qualquer dia voam.

Couberam aos também portugueses The Happy Mess as honras de abertura do palco secundário. Em cima dele, são sete a fazer a festa, que vai buscar ao EP de estreia do coletivo, “October Sessions”, canções pop rock, de trato fácil, com ressonâncias dos anos 80 aqui e ali, que insistem em interpretar com uma satisfação sincera e com alguns braços no ar de quando em vez. Like Me inaugurou o alinhamento, que passou ainda, entre outras, por Shape of L, Morning Sun ou I Wonder Why. A certa altura, o vocalista – o jornalista Migel Ribeiro - denuncia, resignado, a constipação que se abateu sobre ele. Ninguém parece fazer caso. Deslocaram-se ao concerto – um dos últimos a ser anunciado – para conhecer mais um exemplar da nova vaga de projetos musicais portugueses e parecem não estar arrependidos de o ter feito.
Assim de repente, viajamos até territórios The XX, Arcade Fire talvez, para logo regressarmos ao domínio mais Rock n’ Roll, com a voz de Miguel Ribeiro a fazer recordar a do seu homónimo Guedes, dos Blind Zero. Um concerto certeiro, este dos The Happy Mess. Verdade seja dita, de Happy têm muito. De Mess, quase nada.

Já era uma assistência razoável a que aguardava a subida ao palco dos Capitão Fausto, a banda que sucedeu aos Salto, de quem se confessam amigos e fãs, no alinhamento do palco principal do festival.
Com cartas já dadas no Vodafone Mexefest, e com singles carnudos a rodar nas rádios nacionais, chegaram seguros de si e damúsica que fazem, cumprindo um concerto eficaz, construído ao redor do seu primeiro disco, explorado com garra e audácia ao longo de quase uma hora. Sobremesa, Raposa e Febre foram temas que, obviamente, não faltaram à festa, feita de refrões apetecíveis, riffs convincentes e interação com o público q.b.

As promessas de um “novo” rock envolto numa aura mais tradicional, enraizada em três géneros chave dos primórdios da história da música norte americana (blues, country e folk), pode muito bem não ter custado muito público aos Capitão Fausto, por essa altura já entrados em modo despedida, mas provou ter sido um bom alento para a custosa caminhada de pés enfiados na areia, entre palcos. Os Alabama Shakes subiram ao Palco EDP na horas das últimas chamadas para jantar, mas ainda assim puderam contar com um número de curiosos considerável a fazer-lhes companhia. Do cardápio por eles apresentado fez parte um naipe de belas canções, imbuídas de espírito sulista, numa mescla adocicada pelo canto forte de Brittany Howard. Hold On, o melhor cartão-de-visita do recém-editado "Boys and Girls", concentrou as atenções de um público que, de punho em riste, se juntou à banda em prece, na convicção do refrão cantado em uníssono. “Estou bem aqui”, confidenciou-nos a vocalista, “mas eu também estou sempre bem!”. Não nos custa mesmo nada acreditar, tão bem quanto ela na presença dos Alabama Shakes, que prosseguem pelo tema homónimo do disco de estreia, que muito boas críticas tem vindo a reunir. Não nos admira!

Os Bloc Party que chegaram ontem à Herdade do Cabeço da Flauta trouxeram uma vontade muito grande em distanciarem-se dos feitos do passado e vieram a provar-se muito longínquos dos meninos que se impregnaram no espetro sonoro comum, ao primeiro álbum, via operadora telefónica. Inevitável, Banquet terá sido a única canção a chegar-nos nos moldes do antigamente, com a banda no geral a adotar uma atitude muito mais rockeira, assente num jogo de guitarras rasgadas, às quais adaptou a maioria das canções. Contudo, foi mesmo este o tema a despertar maior interesse nos presentes, e a originar as primeiras nuvens de pó, que muito bem justificaram os gangues de faces ocultas e protegidas por bandanas e écharpes, espalhados pelo recinto. Hunting for Witches e One More Chance também souberam cativar, o que se traduziu em cantoria na plateia e numa euforia mais dançável, concordante com a postura de Kele Okereke.
O vocalista, que já havia citado os Monty Python, presenteou-nos ainda com uma versão de We Found Love, de Rihanna, acompanhada numa linguagem corporal condizente. Disse-nos ainda tratar-se de uma canção muito especial, que esperava que conseguissem tocar como deve de ser.
Pelo meio, “Four”, o quarto álbum da banda, prestes a sair, foi sendo, a pouco e pouco, desvendado. Uma missão cumprida com 3x3, Real Talk e Octopus.
Para o final ficou guardada This Modern Love, com dedicatória especial para os enamorados.

As viagens entre os dois palcos principais servem para confirmar o que já de si era muito visível: a afluência, neste primeiro dia de Super Bock Super Rock, foi bastante reduzida. A zona da alimentação, foi-se encontrando praticamente desertificada, apesar da localização estratégica entre as áreas de concertos.
Nesta história de teimosias onde o maior vilão é o pó mal-afamado, o justo vencedor é o público. As condições prometidas em duplicado hão-de servir-lhe na perfeição e o ambiente torna-se mais tranquilo e agradável. Transitar pelo recinto faz-se sem demais confusões e a visibilidade para o palco é mais que apropriada. Um ambiente salutar, que dispensa pressas e que permitiu que todos estivessem a uma distância mais do que suficiente do palco para admirar a beleza e a simpatia de Natasha Khan, mais conhecida por Bat For Lashes. Por entre as canções, a cantora não parou de retribuir os olhares e os acenos de quem se encontrava mais perto, e o sorriso partilhado com que foi finalizando a maioria das canções, em sinal de satisfação, foi de fácil contágio.
“The Haunted Man” sairá para os escaparates apenas em Outubro mas, entretanto, foi-nos sendo apresentado, entremeado com deambulações teatrais e danças de movimentos prolongados, no jeito peculiar de deidade mística de que a cantora faz mote, num imaginário acentuado por cânticos e toques de ancestralidade.
Um contexto encantatório tão bem sintetizado pelos conteúdos de Siren Song, que nos deixa muito a duvidar, já completamente enfeitiçados, que aquela criatura possa conter uma partícula que seja do mal proclamado, exaltado num refrão partilhado a várias bocas, resultante no mais merecido aplauso da noite.
Seguidamente, Khan, convidou-nos a dançar. Daniel, também de “Two Suns”, fechou o concerto imaculado, onde o público se foi deixando permanecer frente ao palco, na esperança de um regresso que, muito infelizmente, não aconteceu.

É um Brandon Boyd esquelético, de calça justa e casaco de malha preto, cabelo pelos ombros e bigodaça à maneira, que sobe, às 00h30, ao palco principal do certame, para a atuação mais aguardada da noite.
É certo que os californianos Incubus já viveram tempos mais felizes, não atraindo hoje nem um décimo dos melómanos que movimentavam há dez anos atrás, mas Boyd continua em grande forma, com uma dedicação para com o público - rendido, claro está - que muito deixa a desejar a alguns dos mais aclamados frontman da atualidade.
As aproximações à plateia são constantes, com o vocalista a agachar-se, música sim música não, juntos dos fãs, que o veneram, saudosos, em momentos de um intimismo cortante, vividos olhos nos olhos. Os “obrigados”, proferidos num português sem espinhas, são assiduamente gritados, entre deambulações gritantes, exasperadas, que nos fazem recear, a cada segundo, pelo físico de Boyd, que nos parece tão frágil, tão quebrável. Falso alarme – este homem tem o diabo no corpo e «aguenta-se à bronca» com nota máxima.
Os sucessos de outrora, mas de sempre, como Pardon Me, Are You In? Ou Drive, que, simplesmente, não podia falhar no alinhamento, fizeram, expectavelmente, a performance do grupo, que se mostrou coeso ao longo de toda a atuação, e, claramente, as delícias dos fãs que, uma década passada, ainda mantém as respetivas letras na ponta da língua, não se coibindo de exibir os seus dotes para a cantoria com o volume no máximo.
Ao longo de quase duas horas de concerto ainda houve tempo para recordar êxitos menores – mas nem por isso recebidos com menos entusiasmo pelo público – como Circles (2002), Megalomaniac (2003), Smile Lines (2004), Anna Molly e A Kiss to send us off, de 2006. Adolescents e In the company of wolves foram as mais ou menos felizes representantes de “If Not Now, When?”,a mais recente aventura discográfica da banda, editada no ano passado.
Não contentes, e em modo vamos-lá-animar-a-coisa, ainda nos brindaram com inesperadas e inspiradas versões de The Lion Sleeps Tonight, da banda sonora d’ “O Rei Leão”, que Boyd insistia em repescar concerto fora, e do tema da “Pantera Cor de Rosa”, bem caprichada, por sinal.
Um concerto previsível, mas competente, onde não faltou o já habitual strip de Boyd, que acabou o espetáculo em tronco nu e, seguramente, um ou dois kilos (ainda) mais magro.

É sempre bom ter de volta John Stainer (bateria), Ian Williams (teclados e guitarra) e Dave Konopka (guitarra e baixo). Apesar de três, os Battles valem muito mais que muitos, e esta noite puderam contar com as presenças simuladas, em formato projeção, de três convidados de luxo. Kazu Makino, dos Blonde Redhead, é a primeira a surgir na tela, para Sweetie & Shag. Seguiram-se as aparições de Gary Numan, em My Machines, e Matias Aguayo, com Ice-Cream, anunciada por deliciosas imagens de gelados, a três cores, sobrepostas, sequencialmente.

“É a terceira vez que cá vimos e cada vez que o fazemos é sempre melhor que na vez anterior”, contou-nos o teclista irrequieto, finalizada Atlas, invariavelmente acolhida em delírio. O público, perdido em movimentos nas imediações do palco, ou mesmerizado pela prestação dos músicos - vidrado na performance de Williams que, ladeado pelos dois teclados, de tão imparável, em movimentação contínua, mais parecia encontrar-se numa passadeira de corrida – agradeceu o contágio directo de entusiasmo.

A Alexis Taylor e aos seus Hot Chip coube a honra de fecharem a primeira noite de concertos, em cilma de total animação. Os corpos que ainda que reuniram forças, juntaram-se-lhes no baile, tendo os “moves” excêntricos do teclista como melhor exemplo a reter.

Boy From School entrou logo a matar, assim como o caricato vocalista que na sua primeira descida ao público decidiu beijar uma fã na boca. Seguiu-se pouco mais de uma hora de estímulos contínuos à transformação da frente do Palco Super Bock em pista de dança que, enquanto uns não hesitaram em acatar, outros foram recusando, em detrimento do regresso ao acampamento iluminado por gambiarras, penduradas nas árvores.

Apesar de contar já com uma certa idade, Over and Over correspondeu ao momento alto da atuação dos Hot Chip, volvidos ao festival dois anos depois de se terem estreado no Meco.

Texto: Ariana Ferreira e Sara Novais
Fotografias: Filipa Oliveira