Os que existem contam-se "pelos dedos de duas mãos", mas "há uma geração a formar-se aos poucos. É um processo em construção e Portugal está muito bem situado, muito por culpa do trabalho de Pedro Barbosa", que realizou as suas primeiras experiências de literatura cibernética em 1976, disse à agência Lusa Rui Torres.
O Arquivo Digital da Literatura Experimental Portuguesa (PO.EX), apesar de ter deixado de receber financiamento, continua a ser ampliado num "trabalho a meio" entre a Universidade Fernando Pessoa, no Porto, e a Universidade de Coimbra, reunindo mais de 6.000 ficheiros de áudio, vídeo e imagem de poesia experimental, contando com trabalhos de Ana Hatherly, António Aragão e E. M. de Melo e Castro, entre outros.
No entanto, se se procura recuperar o que está para trás, o projeto tem essencialmente "olho aberto para as novas práticas textuais da literatura eletrónica", sublinha Rui Torres, que hoje, às 17:30, apresenta no Salão Brazil, em Coimbra, a terceira e última sessão de "Arquivo vivo é Anarquivo!", uma remistura audiovisual das obras presentes no PO.EX.
"Estes jovens de Coimbra e do Porto que cresceram já com conhecimento de poesia experimental portuguesa fazem literatura eletrónica a partir de novos meios", frisa o poeta e docente da Universidade Fernando Pessoa.
Na literatura eletrónica, o computador é utilizado "como ferramenta criativa", não uma calculadora, onde é aproveitada a "facilidade de interação", o multimédia e a própria programação "no sentido de poesia generativa".
Todavia, os poemas surgem de um trabalho que alia a programação ao "cuidado e sensibilidade poética. Não é fogo-de-artifício de utilizar a tecnologia sem conteúdo", nota.
A escassa presença da poesia digital é explicada pela "incapacidade e desconhecimento dos próprios poetas", que, "ao enfrentarem a máquina, não conseguem desenvolver os mecanismos adequados", refere Rui Torres, sublinhando que já o poeta Herberto Helder imaginava em "A Máquina de Emaranhar Paisagens" o que seria "um computador a combinar fragmentos" de diferentes obras.
O docente recorda como a poesia dialogou com as dimensões dos ‘mass media' nos anos 1960, nomeadamente a publicidade ou a televisão, sendo que hoje "a nova poesia experimental tem de lidar com Facebook e Twitter", com a programação ou com a realidade virtual.
"Há uma dimensão de interação e trabalho modelar que pode e deve ser aproveitada para a própria literatura", sublinha Rui Torres, que encontra nesta poesia um potencial também pedagógico junto das crianças.
De acordo com o especialista, "há uma comunidade a crescer em todo o mundo". Sinal disso mesmo são as submissões de pessoas de 38 países diferentes para a conferência e festival sobre literatura eletrónica que se vai realizar no Porto, em julho.
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