"Blur ou Oasis?" é daquelas perguntas de que poucos adolescentes dos anos 1990 se terão livrado. A meio da década, então, a batalha campal entre as duas bandas mais proeminentes da britpop - e duas das mais populares do seu tempo, independentemente dos géneros - estava especialmente acesa. Muito por culpa de alguma imprensa de terras de Sua Majestade, é certo, mas também de músicos que não recusaram entrar no jogo. E Noel Gallagher, que chegou a desejar que Damon Albarn e Alex James, dos Blur, "apanhassem Sida e morressem", numa polémica entrevista ao The Observer, fez mais do que a sua parte.

Assim como foi rápido a disparar o insulto, o guitarrista e até então único compositor dos Oasis apressou-se a pedir desculpas, mas esta foi só uma entre as inúmeras farpas lançadas pelo músico desde que se tornou um ídolo ao lado do irmão mais novo, Liam. E mesmo que nunca mais tenha sido tão politicamente incorreto como aí, ainda hoje não consegue deixar de comentar o estado da pop. "Se abanar o rabo para ganhar a vida é considerado arte, então ela está no topo", disse acerca de Beyoncé, tendo dirigido outros mimos a artistas tão diferentes como Taylor Swift ("boa rapariga, mas sem talento") ou os Alt-J ("Um deles tem bigode e isso é inaceitável").

Opiniões como esta teriam pouco eco, contudo, se Noel Gallagher não fosse uma das peças centrais de uma das discografias mais indissociáveis dos anos 1990, goste-se ou não da música dos Oasis. E se os Blur foram conquistando respeito com um percurso versátil, capaz e se reinventar álbum após álbum, a banda dos irmãos Gallagher raramente se livrou das acusações de repisar e reciclar (sem grandes acréscimos criativos) a tradição pop-rock britânica.

Oasis

Ainda assim, "Wonderwall", "Supersonic" e um punhado de outras canções sobreviveram ao seu tempo e ganharam incontestável estatuto de clássicos. Canções como "Don't Look Back in Anger", a primeira dos Oasis a que Noel deu voz após muita insistência para que o irmão não fosse o único vocalista (apenas um dos motivos dos habituais atritos do seu relacionamento). E também a canção que centenas de britânicos entoaram em uníssono, há poucos dias, como forma de reação comunitária ao atentado em Manchester, cidade natal dos Oasis.

Foi, aliás, com uma banda local que Noel se aproximou de um caminho profissional ligado à música, ao tornar-se roadie dos Inspiral Carpets, que acompanhou na estrada durante dois anos. Essa experiência mostrar-se-ia determinante para remodelar o então grupo do irmão, The Rain, do qual resultaram os Oasis quando o Gallagher mais velho exigiu, em 1991, ter o controlo criativo e ser o único compositor. Só ao quarto álbum, "Standing on the Shoulder of Giants" (2000), é que Liam teria direito a compor uma canção para a banda, e a partir daí outros elementos também foram conseguindo mostrar a sua faceta de compositores. Mas o papel de Noel nunca foi ofuscado.

A festa dos anos 2000

Depois da separação dos Oasis, em 2009, o então guitarrista acumula ainda mais funções no projeto Noel Gallagher's High Flying Birds, a caminho do terceiro disco, sem uma projeção comparável mas com um público fiel e suficientemente expressivo para uma veterania digna. De resto, o jovem arruaceiro de outrora, marcado por uma infância infeliz com episódios de alcoolismo e agressão do pai, parece agora divertir-se mais do que nunca. Casado, com três filhos, garante ter deixado para trás o consumo de drogas, e em especial o de cocaína, depois de uma depressão e vários ataques de pânico em finais dos anos 1990.

Em compensação, promete nunca deixar os cigarros e a cerveja. E ao entrar na casa dos 50, parece continuar a saber fazer uma festa como há duas décadas: a do aniversário mais recente foi inspirada na série "Narcos", da Netflix, teve a cocaína como tema e nomes como Madonna ou Bono na guest list. Enquanto faz questão de continuar a rir-se dos outros, Noel não esconde começar por se rir de si próprio. Tanto que até a disputa com os Blur é mera recordação, tendo em conta que já cantou "Tender" com elementos da banda (num concerto de recolha de fundos para adolescentes com cancro) e participa no novo álbum dos Gorillaz, projeto de Damon Albarn. Próximo passo: fazer de vez as pazes com o irmão? Menos, que o espetáculo tem de continuar, apesar de tudo...