A Companhia de Teatro de Sintra estreia, no dia 16, a peça “Teoria King Kong”, um monólogo encenado por Paula Pedregal a partir da obra homónima da escritora francesa Virginie Despentes, com interpretação de Rita Loureiro.

A obra de Virginie Despentes, nascida em Nancy, em 1969, surgiu à Companhia de Teatro de Sintra, em 2022, quando decidiram que as próximas criações iam abordar questões de género, disse na quarta-feira à agência Lusa Paula Pedregal, uma das diretoras da companhia, e responsável pela encenação e adaptação do texto.

O texto de Virginie Despentes “surgiu por acaso”, mas foi “muito bem-vindo” por abordar questões que interessavam à companhia ainda que muita coisa da obra tivesse de ser “sacrificada” para ser posta em cena, acrescentou.

Se as questões de género já eram prementes em 2022, atualmente são-no “cada vez mais” face ao crescimento da onda de violência contra tudo que é diferente, frisou Paula Pedregal à Lusa.

“Para nós, já na altura eram questões prementes e agora ainda mais urgentes são, exatamente porque o texto aborda uma violação coletiva de que a própria autora foi vítima e depois todas as questões relacionadas com vários tipos de violência, como a de género ou sobre as mulheres”, disse.

Questões que “levaram a companhia a ir mais fundo e a interessar-se por perceber onde é que está a razão principal desta violência, de onde é que isso vem, quando é que começou”, ainda que “venha de tempos imemoriais”, observou.

Já Rita Loureiro, que interpreta, afirma que é “uma performer que serve de veículo para as palavras de Virginie [Despentes]”.

“Dou voz às palavras de Virginie” numa peça que “é absolutamente um monólogo" e em que “há uma comunicação direta com o público”, disse à Lusa.

Para Rita Loureiro, a peça é "um manifesto de teor feminista" no qual uma mulher se apresenta em palco “não para fazer o papel de vítima”.

“Gosto muito da postura da Virginie no seu feminismo, e embora não haja um personagem estabelecido, há uma identidade, há uma energia, há uma postura, há uma voz que, às vezes, posso confessar que se mistura muito com a minha”, frisou a atriz.

A prostituição, que Virginie Despentes chegou a praticar, a feminilidade e a masculinidade são outros temas do espetáculo em que a autora afirma: “Não peço desculpa de nada, não me venho lamentar.”

O quanto a feminilidade pode ser “opressora e castrante, tal como a masculinidade”, é também tratado, levando a que Rita Loureiro aceitasse o convite da Companhia de Teatro de Sintra para representar a peça, confessou.

O “posicionamento” da autora sobre aquelas questões “é muito, muito lilvre e muito abrangente”.

“Não é uma coisa de 'ah, nós mulheres é que somos vítimas e que temos razão'. Não, não. Ela posiciona-se também muito do lado masculino, porque é verdade que também há uma opressão masculina hoje em dia”, argumentou a atriz, sublinhando que "a opressão masculina” também tem “tradições milenares”.

Hoje em dia os homens também têm de se comportar de certa forma para serem considerados homens, observou.

A autora “é muito abrangente nessa crítica que faz e isso agrada-me muito”, acrescentou Rita Loureiro, sublinhando que não conhecia o texto quando recebeu o convite para o interpretar.

Foi nessa altura que começou a ler a autora, e aceitou o convite mesmo sem o texto da peça estar fechado, notou.

Ainda que um monólogo “seja uma coisa muito solitária” - a atriz confessa gostar “muito do jogo cénico, da contracena com os outros atores” -, com este texto “faz sentido” fazer um monólogo, acrescentou.

Os temas que aborda são cada vez mais importantes, “sobretudo com uma política de extrema-direita a tomar conta quase do mundo inteiro”, justificou.

“Vamos estar a regredir de uma forma assustadora e grotesca na história das mentalidades”, concluiu Rita Loureiro.

Virginie Despentes, autora e realizadora, membro da Academia Francesa, conhecida por uma obra provocadora, centrada na sociedade urbana das últimas décadas, tem publicados em Portugal “Caro idiota” e dois volumes de “Vernon Subutex”, pela Elsinore, "Apocalypse Baby", pela Sextante, e "Teoria King Kong", pela Orfeu Negro.

Com "Apocalypse Baby" venceu o prémio Renaudot e, com a trilogia "Vernon Subutex", finalista do Booker Internacional, conquistou os prémios Anaïs Nin, Landerneau e La Coupole.

“Teoria King Kong” tem tradução de Luís Leitão, cenografia e figurinos de Luís Santos e desenho de luz de Catarina Côdea.

A peça tem música original e videografia de Abel Arez.

“Teoria King Kong” vai estar em cena na Casa de Teatro de Sintra até 3 de agosto, com récitas de quinta-feira a sábado, às 21h0, e, ao domingo, às 16h00.