Quando ascenderam à ribalta no, musicalmente falando, longínquo ano de 2007, os norte-americanos do Colorado foram rotulados como one hit wonders. Sete anos depois, pisaram o MEO Arena, com mais dois álbuns na bagagem e um público que estava longe de caber no primeiro espaço que os recebeu na capital: o Santiago Alquimista.

OneRepublic no MEO Arena

A primeira parte do espetáculo ficou a cabo dos sul-africanos Kongos. O que nos surpreende, logo de início, é que a primeira canção do alinhamento é interpretada, exclusivamente, pelo baterista. «Ah, então ele é que é o vocalista?», ouvimos perguntar. A verdade é que todos tocam, todos compõem e todos cantam.  A banda de quatro elementos, três dos quatro irmãos, descendentes do famoso músico dos anos '60 John Kongos, afirmou por diversas vezes ter problemas em arranjar editoras por estas não saberem como direcionar as suas músicas no mercado. Na curta atuação percebemos porquê. O quarteto passou de rock a folk, a rap e reggae, passeou-se pela pop e não nos deixou dúvidas: também não vamos ser nós a conseguir rotulá-los. Desconhecidos, divertidos, de pés descalços, acordeão ao pescoço ou a fazer headbangings que pareciam nunca terminar, puseram a audiência entre saltos e suspiros e ainda conseguiram que esta dividisse consigo o refrão de “I Want To Know”.

De novo, o palco fica vazio, um pano branco desce e cobre-o. Sabemos o que aí vem. Porém, é apenas depois de uma curta intro que surgem os primeiros acordes de “Light It Up”, ainda por trás da enorme tela. As luzes deixam-nos vislumbrar apenas as silhuetas dos músicos que tomam os seus lugares na engrenagem e Tedder que dança como se estivesse sozinho. Ao chegar mais perto do refrão, o pano cai e toda a gente acompanha o tema de “Native”. «Boa noite, Lisboa». Tedder desaparece e Brent prepara o seu violoncelo, negro, para “Secrets”.

Depois do hit, cantado a plenos pulmões, a música cessa, a banda sai do palco, o público acalma. Nos ecrãs gigantes, surge um vídeo de crianças, um coro, que se prepara para gravar. Quem conhece o reportório da banda sabe, mesmo antes de estas abrirem a boca, que aí vem “All The Right Moves”. E veio mesmo. A balada, extraída do segundo álbum “Waking Up”, com a intensidade que a caracteriza, entre violinos, pareceu cair sobre o público que fez questão de cantar ainda mais alto. «Lisboa, foram cinco ou seis anos sem vos visitar. Vamos tentar compensar isso nas próximas duas horas. A última vez que cá estivemos a sala tinha o quê? 200 pessoas? Talvez fossem muitas. 100? Eu tenho quase a certeza que era o aniversário de alguém e que tocámos para ele e para os amigos. E ele não tinha muitos», brincou, em alusão ao concerto do Santiago Alquimista, em junho de 2008. Nessa altura, prometera-se um regresso em setembro que nunca viria a acontecer e, ainda, pelo caminho, ficaria um concerto cancelado no Coliseu de Lisboa, em janeiro de 2009. «Passou-se demasiado tempo». “What You Wanted” surgiu, quando Tedder voltou para junto da banda, com várias imagens iluminando os ecrãs. Nova viagem no tempo. Voltamos ao primeiro álbum, para ouvir “Stop And Stare”.

«Hoje temos um coro de 60 pessoas, mais nós os seis, aqui no palco, e todos vocês. Queremos gravar-vos a cantar esta música – a versão que temos foi cantada por um grupo de bêbados – mas, garanto-vos, que se sobrepusermos vai soar bem. Por isso, dêem tudo o que puderem. Quando eu disser (di-lo em português agora) UM, DOIS, TRÊS, QUATRO (continua em inglês) vocês começam».

Claro que, sem esperar pela contagem, todos cantaram ainda mais alto o quarto single do último álbum de originais. Para ajudar, Ryan tirou a máquina de filmar a um dos operadores de câmara e filmou-se e ao público dizendo, indiretamente, que eles eram o que ele precisava, “Something I Need”. Um piano é colocado no palco mais pequeno, assim como um par de outros instrumentos. Tedder toma o lugar nas teclas e Brent segue-o para reclamar o seu lugar nas cordas. “Apologize”, é tocada sem a percussão e o baixo que Timbaland lhe juntou – quando a versão demo era, exclusivamente, acústica – e arrebata a audiência. Luzes levantam-se por todo o lado e assim se mantém.

Ainda ao piano, Tedder toca “Stay With Me”. A música de Sam Smith emociona o público. «Se souberem a letra, é favor acompanharem-me». É assim que o vocalista lança “Budapest”, a animada música de George Ezra. E se o público se emocionou com as duas canções ao piano, chegou a vez de ser Ryan a soltar as primeiras lágrimas – que se apressou a limpar com a t-shirt, virado de costas para o público. «Esta é uma música que compus, ainda antes de sermos banda. Tenho um carinho muito grande por ela e é por isso que continuamos a interpretá-la». A música, responsável por emocionar o cantautor, foi a que este compôs para um amigo soldado quando este servia no exterior, “Come Home”.

Num tom mais animado, e prontos para abandonar o palco mais pequeno, chegou-nos uma bem humorada – e acústica – “Good Life”,  durante a qual Ryan substituiu, na letra, algumas cidades por Lisboa e se viu enquadrado com as imagens da capital e da bandeira portuguesa que passeavam pelos ecrãs. Tempo para Zach Filkins ficar sozinho em palco. Com um medley de música espanhola, o músico, que viveu parte da sua infância em Barcelona – e até sabe falar castelhano –, levou-nos até à terra de nuestros hermanos. Algo que agradou a alguns e desagradou a outros. Os desagradados, porém, esqueceram a quezília rapidamente, até porque Ryan regressou ao palco, de novo tapado pelo pano, já aos saltos - como passou a maioria do concerto –  trauteando "Counting Stars". Uma “Can’t Stop” emocionada seguida de uma “Au Revoir”, deixaram-nos não muito longe de antever o final do concerto. Talvez isso tenha sido o motivo que levou Tedder a aproximar-se do público. «Não vamos demorar a voltar. Estaremos aqui da próxima vez. Andamos a compor um pouco por todo o lado. Estamos a trabalhar no novo álbum. Fizemo-lo em Dublin, fizemo-lo na Lituânia e, estamos a fazê-lo aqui, em Lisboa», histeria completa para os muitos que não esquecem as referências que “Native” faz às cidades que viram as suas músicas tomar forma: cidades como Paris, Grécia, Londres, Nova Iorque ou Vancouver.

«Há sítios aos quais voltamos quando estamos de férias. Devem ser o quê? Uns três? Portugal é um deles. É um sítio fantástico. Mas vocês sabem. Não viveriam aqui se não fosse». “Feel Again” foi mais uma explosão de animação e saltos e correrias. Sempre interativos e dançando, os músicos faziam a festa. Antes de terminar, chamaram um elemento da crew ao palco. Depois de vários anos a dividir a estrada com ele, este era o seu último concerto: oferecera-se para viajar até Marte. Brindaram com champanhe. Tedder, doente, despejou o copo sobre o “sétimo elemento da banda” e despediu-se com um sorriso. “I Lived” chegou-nos com pompa e circunstância, ouvimos um «amamos-vos» dito, num português irrepreensível, por Ryan (que foi sempre tentando aventurar-se no idioma de Camões). E também um «xau». Abandonam o palco.

Para o encore, ficou-nos reservado o folk de “Love Runs Out”, com todo o rufar de tambores a que temos direito. Um sentido «já estamos prontos para voltar», uma cover de “What a Wonderful World”, de Louis Armstrong, que Ryan pediu que todos cantassem e, para terminar em grande, sob uma chuva de papelinhos, uma “If I Lose Myself”. Mas não a primeira versão no álbum. A versão “festiva”, remisturada por um DJ familiar ao público português: Alesso. De novo, despede-se: «Xau».

Têm luzes, ecrãs e um pano, mas a receita seguida no café-teatro de Lisboa manteve-se: não há nenhuma estrela, nenhuma ambição desmesurada. A sua sonoridade mudou em todos os álbuns, mas continuam a banda de "Dreaming Out Loud", álbum batizado pelo sonho do grupo de viver a partir da música. Mais bonito ainda é que além de não ser uma estrela encadeada pela fama, Ryan Tedder é humilde e visionário. Desenha o concerto sem recorrer a bailarinos, a insufláveis, a robots, a palcos que sobem e descem, a coros, mas fá-lo de modo a que tudo seja apelativo e constrói uma experiência gourmet para qualquer fã de música pop americana, que soe muito mais a pop inglesa. Às vezes, aventura-se um pouco mais do que a sua peculiar voz permite, mas está ali porque quer, porque gosta, porque sonhou com aquilo. E não há melhor maneira de sair do concerto do que com um coração cheio, depois de ouvir a banda dizer que Lisboa foi a melhor forma de terminar a digressão, e saber, no seu âmago, que as sensações de loucura, divertimento e prazer desmesuradas são comungadas com a banda.

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Fotos @Rita Sousa Vieira