"Este disco foi quase como um mecanismo de defesa ou de sobrevivência por causa da pandemia. Foi um plano que não estava nos meus planos. Quando aparece a pandemia e os concertos foram cancelados e percebi que isto ia mesmo parar, decidi pegar na viola [campaniça], porque tem sido o meu medicamento, e começar a fazer qualquer coisa", afirmou João Morais em entrevista à agência Lusa.
Sem perspetiva de rendimentos, com mais de duas dezenas de concertos cancelados em 2020, o músico conseguiu beneficiar de um dos primeiros apoios, lançados há um ano pelo Ministério da Cultura: a linha de emergência de apoio à criação, por via do Fundo de Fomento Cultural.
João Morais diz que conseguiu um apoio de cerca de 2.200 euros, sem descontos e a repartir por quatro meses, que ajudou a "salvaguardar as despesas mais elementares" e a trabalhar no processo criativo do novo álbum, feito pela primeira vez em trio, com o contrabaixista Carlos Barretto e o percussionista Jorge Salgueiro.
"Consegui uma verba que me deu pelo menos uma segurança: Eu podia trabalhar com estes músicos e ter como lhes pagar, e não ter que fazer isto a meter-me em maus lençóis. [...] Foi uma grande ajuda para mim", disse.
O guitarrista não tinha intenções de lançar já um novo álbum, porque contava promover e divulgar ao vivo a tetralogia temática do EP "As 4 estações", que tinha completado em finais de 2019.
A pandemia trocou-lhe as voltas, obrigando-se a antecipar a composição de novas músicas, cujas melodias de base estavam adormecidas num gravador.
"A viola é a tal medicação sempre certa, de há trinta anos para cá tem-me salvo de tantas situações, esta foi só mais uma", explicou.
"Subterrâneos", terceiro objeto discográfico de O Gajo, depois de "Longe do chão" (2017) e da tetralogia de EP, é um álbum introspetivo: "Este disco é o que encontrei dentro de mim, coisas que não sabia até que tinha, porque saíram músicas que me surpreenderam".
O Gajo explica melhor: "Esta pandemia privou-nos do contacto com os outros e obrigou-nos a um contacto com o nosso eu interior, com o que somos; e se calhar nós não estamos acostumados a lidar com isso, porque estamos constantemente em modo de contacto com as outras pessoas".
João Morais, que se descreve como guitarrista "autodidata e simples", ‘designer’, tatuador, tem 47 anos, é músico desde finais dos anos 1980 e criou o ‘alter ego’ O Gajo em 2016, precisamente para explorar os caminhos criativos da viola campaniça.
Apesar da precariedade do trabalho, o guitarrista diz-se otimista e a planear voltar este ano aos concertos.
"A minha visão é tentar não ir ao fundo, manter-me à tona como quem estivesse náufrago no mar, mas tentar ir respirando e estou convicto que cheguemos ao verão com algum trabalho", disse.
Além do apoio da linha de emergência, "Subterrâneos" teve ainda um apoio da Sociedade Portuguesa de Autores para a gravação.
João Morais fará no dia 15 um concerto de lançamento de "Subterrâneos", apenas 'online', com Carlos Barretto e Jorge Salgueiro, a partir do Convento das Flamengas, em Lisboa.
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