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Um piano, um candelabro e uma marcha fúnebre tocada pela “senhora Bondosa”, a dona de vários lares de idosos em Lisboa – apenas o de Campo de Ourique está legalizado -, serve de cenário para que uma das mulheres confesse como explora as famílias dos idosos e como vive à custa das mensalidades pagas para cuidar deles.
“A história passa-se em torno de uma denuncia sobre proxenetismo. Proxenetismo sexual, por um lado, nas suas duas vertentes, de luxo e de rua, e o proxenetismo que é feito a partir do aproveitamento da terceira idade”, explica à agência Lusa Jorge Castro Guedes, autor e encenador da peça "Três Mulheres em Torno de um Piano", e atual diretor da companhia de teatro do Porto Seiva Trupe.
“Três Mulheres em Torno de um Piano”, que se estreia no próximo domingo, às 19h00 na Sala Estúdio Perpétuo (antigo Cinema Estúdio), na Rua Costa Cabral, no Porto, é uma história “completamente surreal no comportamento”, descreve Jorge Castro Guedes, lembrando que o texto original foi escrito há cerca de 10 anos, mas que, neste domingo, o que se vai escutar em palco já vai “talvez na 10.ª versão”.
“Um comportamento bizarro, um comportamento inesperado e até às vezes desconexo. Parece que nem existe uma linha de raciocínio de três mulheres que se encontram numa casa na Avenida Duque d’Ávila, em Lisboa, durante a madrugada de 23 de novembro de 1993, e onde há uma senhora caridosa e que é dona de uma série de lares de terceira idade, que recolheu duas meninas, uma que estava na rua a apanhar chuva e a trouxe para casa, e uma outra que vai lá ter, porque entretanto a luz foi abaixo, no prédio ao lado, porque está uma noite de tempestade (…)”.
No meio de muito riso e muita “bizarria” - em que ora se vê uma mulher a urinar numa sanita, ora as três mulheres a dançarem kalinka (dança russa), enquanto bebem champanhe Moêt et Chandon, e misturam conversas sobre totoloto e o 25 de Abril de 1974 e os chaimites que o fizeram, com religião judaica, incluindo sefarditas, sunitas e xiitas -, o texto tenta pôr o espectador a ver-se ao espelho, num 'realismo surreal'.
“No meio desta bizarria toda, é como se nos estivéssemos a ver ao espelho, mesmo no ponto de vista comportamental. Não se trata de um texto de indicar a culpa específica de um setor social, ou de determinada organização ou dos terceiros ou do público em geral, mas de todos nos envolvermos nisto para podermos refletir sobre o nosso próprio comportamento", afirma Castro Guedes.
O encenador estima que, no fim de muito riso, talvez o espectador, ao chegar a casa e depois de refletir sinta que levou um “sopapo”.
“No fim de muito riso, talvez ao chegar a casa, se olharmos bem para o olho da consciência, ele levou um sopapo e está todo arroxeado, e daí que eu lhe chame uma 'comédia roxa'”.
A peça tem a duração de cerca de hora e meia, é para maiores de 14 anos de idade, fica em cena na Sala Estúdio Perpétuo até dia 11 de abril, e pode ser vista às segundas e quintas-feiras, às 21h30, e, às sextas-feiras, sábados e domingos, às 19h00.
Para Jorge Castro Guedes, esta versão do texto da peça "Três Mulheres em Torno de um Piano" está mais próxima da “crazy comedy”, tendo um “lado de comicidade mais constante”, para que “o sopapo seja ainda maior depois do riso”.
Trata-se de uma “dupla estreia” para a Seiva Trupe, pois, além da estreia da peça, a companhia, que esteve nove anos sem espaço próprio para trabalhar, ganhou agora uma sala de espetáculo, a Sala Estúdio Perpétuo.
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