Em 1922, o arqueólogo Howard Carter operou no deserto egípcio uma das mais célebres descobertas da história da disciplina - a da múmia do faraó Tutankhamon. Imediatamente famosa, particularmente pelo excelente estado de conservação, o achado continuou ao longo das décadas a gerar intensos estudos disciplinares - e, com isto, cada vez mais conhecimento não apenas sobre ele como sobre o período fascinante da Antiguidade pré-Clássica.

Dividido em três partes, “Tutankhamon” conta a história das escavações egípcias até 1922, seguindo pelos extensos estudos nos anos seguintes e concluindo com uma análise do legado - onde Grier propõe algumas questões a propósito do questão colonial que circunda a expansão arqueológica europeia/norte-americana.

O faraó apagado

Uma das principais ironias a envolver a celebridade ganha por Tutankhamon é que este faraó vinha de uma linhagem tão mal vista pelos seus contemporâneos que houve esforços variados no sentido de fazê-lo desaparecer, tal como a sua linhagem, da escrita da História.

Em causa estava o facto do seu pai, Akhenaton, ter cometido a suprema “heresia” de tentar impor o monoteísmo à uma sociedade largamente à vontade com um variado culto de deuses. Pouco interessado em política, Akhenaton construiu uma fortaleza no deserto e uma inquieta elite teve que esperar o seu desaparecimento 17 anos depois para restabelecer as tradições. E nelas não havia lugar para o seu sucessor Tutankhamon.

“De facto”, diz Grier, “há uma ironia nisto". "Mas ele é famoso pelos seus tesouros. Se não tivesse havido essa tentativa de apagá-lo, hoje saberíamos muito mais a respeito deles. Por exemplo, o templo mortuário foi desmantelado e os blocos reutilizados. Se tivéssemos aquelas paredes poderíamos ler sobre a sua história - a data em que ele entrou em guerra, por exemplo. Como Carter comentou, mesmo com os tesouros ele nos escapa“, observa.

O colonialismo para além do bem e do mal

Tutankhamon: no centenário da descoberta, livro traz novidades sobre a mais famosa das múmias

Mais de 200 anos depois Bob Grier pode lamentar que o arranque brilhante da arqueologia tenha se dado de mãos dadas com diferentes períodos de invasões europeias pelo território africano. Mas a História é indiferente às morais do século XXI e o facto é que os primeiros estudiosos chegaram ao Egito com Napoleão.

E, se no plano político a terra dos faraós será palco de longas disputas geopolíticas entre ingleses e franceses (com o acréscimo dos americanos mais tarde) que só terminarão com Nasser já a meio do século XX, no que concerne à preservação, à paixão e aos estudos metódicos do espólio egípcio os europeus fizeram um trabalho de resgate inestimável.

No seu livro o autor narra o incidente de Saqqara, quando um grupo de turistas franceses bêbados tentaram invadir uma tumba sem os bilhetes de entrada. Howard Carter posicionou-se a favor da guarda local e, mesmo o facto lhe custando sérios problemas com as autoridades coloniais, recusou-se a pedir desculpas.

Num outro momento, no entanto, convida as esposas dos oficiais ingleses para as escavações da tumba de Tutankhamon, mas deixou de fora as mulheres dos egípcios. “Carter é muito mais complexo do que muitas vezes é descrito. Às vezes as pessoas fazem coisas contraditórias”, explica o autor.

Escrito de forma fluída e bastante acessível, o livro de Grier segue na sua longa sehunda parte apresentando uma série de novidades que acompanharam os estudiosos a partir das descobertas das tumbas.

“Obrigado pelas palavras sobre a minha escrita”, diz o autor. “Não me vejo como um académico, mas como um professor. Tento escrever da mesma forma que ensino os meus alunos nas aulas da universidade.Todos os factos normalmente podem ser associados à uma história e, se a contar bem, os estudantes vão lembrá-los - espero que para os exames", remata.

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