Esta semana, o Ministério da Cultura anunciou que iria apostar num festival de música. O TV Fest arrancaria esta quinta-feira, 8 de abril, às 22h00, e concertos seriam transmitidos na RTP Play e no canal 444 (disponível em todos os operadores de televisão por cabo).
Depois das críticas nas redes sociais e de uma petição online com mais 16 mil assinaturas, a iniciativa foi suspensa e será repensada.
"Como o setor reagiu tão rapidamente, com críticas, dúvidas e questões, nós vamos suspender [o TV Fest], ia estrear hoje, será suspenso hoje. Vamos repensar e perceber exatamente como manter este nosso objetivo de apoiar o setor da música e os técnicos e, ao mesmo tempo, dar a possibilidade de as pessoas receberem em sua casa música portuguesa”, afirmou hoje a ministra da Cultura, Graça Fonseca, em declarações à Lusa.
Este projeto, criado pelo Governo no quadro de apoio, no âmbito da crise causada pela pandemia COVID-19, e destinado “exclusivamente” ao setor da música, tinha estreia marcada para hoje à noite, no canal 444, nos quatro operadores de televisão por subscrição em Portugal, e na RTP Play.
Contactada pelo SAPO Mag, a RTP frisou que a iniciativa é da responsabilidade do Ministério da Cultura e que o canal apenas ajudaria na transmissão, nomeadamente no envio do sinal para as várias operadores.
Em cada programa atuariam quatro músicos. Os primeiros quatro, escolhidos pelo apresentador de televisão Júlio Isidro, foram Marisa Liz, Fernando Tordo, Rita Guerra e Ricardo Ribeiro. Estes quatro músicos convidariam outros quatro, e daí em diante.
De acordo com a ministra, seriam abrangidos “160 músicos”, “de todos os estilos musicais”, a quem era pedido que “envolvessem sempre equipas técnicas”, o que significaria o envolvimento de “cerca de 700 técnicos”, ao longo dos vários programas.
Graça Fonseca explicou que estavam já gravados quatro programas e que “suspender o projeto para repensar não significa não retribuir aos 12 músicos que já trabalharam”.
Depois de anunciada, a iniciativa foi criticada por vários músicos, sendo lançada uma petição online - em menos de 24 horas, mais de 16 mil pessoas subscreveram a petição. "A realização do TV Fest, no presente estado de emergência, constitui uma ameaça ao ecossistema cultural português que elimina curadores, diretores artísticos, músicos, técnicos e os demais, operando através de um jogo em corrente exclusivo, e de círculo fechado, aos seus participantes artísticos, que desclassifica a participação, representatividade e diversidade de um sector, constituindo uma medida antidemocrática e não inclusiva", frisa a nota que acompanha a petição "Pelo cancelamento imediato do festival TV Fest".
Ricardo Ribeiro, Fernando Tordo, Mariza Liz e Rita Guerra eram os primeiros artistas a atuar no TV Fest. O festival deveria decorrer durante um mês e a programação seria escolhida pelos artistas que passarem pela iniciativa. "O objetivo é criar uma corrente entre os músicos, entre os artistas. Portanto, a Rita Guerra escolhe o próximo, o próximo escolhe o próximo... vamos criar uma cadeira entre os próprios artistas para fazer este festival na TV", explicou a ministra da Cultura.
Petição que exige cancelamento do TV Fest surgiu como coro de vozes indignadas
A petição 'online' que pedia o cancelamento imediato do festival TV Fest, com mais de 18 mil assinaturas, foi iniciada por um grupo de amigos que quis juntar “num coro” as várias vozes contra aquela iniciativa do Governo.
Na terça-feira à noite, a ministra da Cultura Graça Fonseca anunciava na RTP o TV Fest, um festival de música em parceria com a estação pública, com concertos diários, que arranca hoje à noite e que conta com um orçamento de um milhão de euros, saídos dos cofres do Estado.
Ainda nessa noite, um grupo de amigos, composto maioritariamente por “pessoas ligadas ao setor Cultural, de vários pontos do país e sem ligações partidárias”, partilhava entre si a “perplexidade” perante a iniciativa, contou à Lusa um dos elementos desse grupo, o programador e produtor cultural Gui Garrido.
Depois do anúncio, nas redes sociais “várias pessoas [entre músicos, atores e outras figuras ligadas ao setor Cultural] mostraram a sua indignação”, e o grupo de amigos começou a tentar criar “um documento que servisse de porta-voz, para quem quisesse assinar”.
A petição pública “Pelo cancelamento imediato do festival TV Fest” foi colocada 'online' pelas 18:00 de quarta-feira e, menos de 24 horas depois, pelas 16:00 de hoje, já reunia mais de 18.600 mil assinaturas, tornando-se assim “num coro” a uma só voz.
Gui Garrido confessa que o grupo “não estava à espera” de um número tão grande de assinaturas “com a velocidade que foi”.
O festival, criado no quadro de apoio ao setor da música, no âmbito da crise da pandemia covid-19, prevê a realização de concertos disponibilizados, todas as noites, no canal 444 e na RTP Play, ao longo de um mês.
Em cada programa atuam quatro músicos. Os primeiros quatro, escolhidos pelo apresentador de televisão Júlio Isidro, são Marisa Liz, Fernando Tordo, Rita Guerra e Ricardo Ribeiro. Estes quatro músicos convidam outros quatro e daí em diante.
A petição pede o cancelamento do TV Fest, mas serve para todas as “atitudes e medidas não inclusivas”. “O caminho a seguir tem que ser o mais justo e abrangente possível, dentro de todo o país e dentro da visibilidade e invisibilidade dos profissionais”, referiu Gui Garrido, salientando também que “o setor das Artes e de Cultura é mais do que a Música”.
Embora a petição exija o cancelamento do festival, Gui Garrido salienta que a indignação “nunca foi contra os artistas” envolvidos, “nem contra quem gravita à volta deles”.
“Temos que ser solidários e este momento exige um esforço ainda maior para que haja igualdade num mundo tão profundo de desigualdades. Não foi tentada a melhor maneira com esta iniciativa”, afirmou.
Para os signatários da petição a realização do TV Fest, no presente estado de emergência, é "uma medida antidemocrática e não inclusiva".
De acordo com o texto que sustenta a petição, a iniciativa do Ministério da Cultura "constitui uma ameaça ao ecossistema cultural português que elimina curadores, diretores artísticos, músicos, técnicos e os demais, operando através de um jogo em corrente, exclusivo, e de círculo fechado, aos seus participantes artísticos, que desclassifica a participação, representatividade e diversidade de um setor".
A crise provocada pelo novo coronavírus levou a um cancelamento de todas as atividades artísticas, e ao encerramento das instituições públicas e privadas de cultura, deixando sem trabalho milhares de artistas das várias áreas.
"O Ministério da Cultura não pode, em qualquer instância, criar um festival de música portuguesa, para apoiar músicos e técnicos. Não cabe ao estado criar eventos de cultura. Para isso, contamos com os agentes culturais, promotores, curadores e diretores artísticos ativos em todo o país, que atualmente viram toda a sua atividade cancelada, muitos dos quais não encontram qualquer cabimento em nenhuma linha de apoio a artistas, trabalhadores independentes e entidades", sustentam ainda os signatários.
No entender dos peticionários, o que esperam da tutela é que "crie condições estratégicas e financeiras para que os projetos aconteçam e sejam promovidos e apoiados, em diálogo concertado com os mais variados agentes culturais, e tendo em conta as suas especificidades artísticas e técnicas, bem como pela sua geografia de ação no país".
Apelam ainda "à proteção das comunidades artísticas e culturais, à especificidade intrínseca do seu labor, à incapacidade de tal medida responder no presente a uma multiplicidade geral de casos".
Na petição, os signatários dirigem-se ao Presidente da Assembleia da República. Mas, para que a petição pudesse chegar ao Parlamento seria necessário que as assinaturas estivessem acompanhadas do número do cartão do cidadão ou bilhete de identidade dos signatários, algo de que Guio Garrido e os amigos só tomaram conhecimento já depois de terem colocado o texto online.
“O anúncio foi feito na terça-feira à noite e o programa começa hoje. Para a petição surtir efeito tinha que ser imediata”, explicou Gui Garrido, referindo que a mesma acabou por tornar-se num “ato simbólico de criação de um coro” de indignação.
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